Portugal deve imitar os países nórdicos e avisar os cidadãos sobre riscos de uma guerra? “Sem exageros”, mas planos são necessários já, alertam especialistas militares
Os países nórdicos alertaram a população local para a possibilidade de uma guerra com a Rússia: Suécia, Finlândia e a Noruega estão a avisar os respetivos cidadãos para se prepararem, dado o agravamento da situação no conflito entre a Rússia e a Ucrânia.
Os três países nórdicos – dois dos quais (Finlândia e Noruega) têm fronteiras terrestres com a Rússia – começaram a preparar as suas populações com conselhos para “se a crise ou a guerra vier”, depois de, neste fim de semana, a Ucrânia ter recebido dos Estados Unidos da América (EUA) autorização para usar mísseis de longo alcance em território russo, referiu a estação pública britânica.
Milhões de suecos começaram a receber na passada segunda-feira nas caixas de correio uma versão do panfleto “Se a crise ou a guerra vier”, que aconselha a população sobre como se preparar e enfrentar uma guerra. O panfleto já tinha sido distribuído quando a Rússia invadiu a Ucrânia, em fevereiro de 2022, mas tem agora o dobro do tamanho e dos conselhos.
Também a vizinha Finlândia publicou ‘online’ novos conselhos sobre “preparação para incidentes e crises”, enquanto os noruegueses receberam um panfleto instando-os a estarem preparados para sobreviverem sozinhos durante uma semana em “caso de condições meteorológicas extremas, de guerra ou de outras ameaças”.
A lista de preparativos divulgada pela Noruega inclui a sugestão de que sejam comprados e guardados alimentos de longa duração, como latas de feijão, barras energéticas e massas, e também medicamentos, incluindo comprimidos de iodo, em caso de acidente nuclear.
Oslo enviou uma versão anterior da lista em 2018, mas completou-a agora com o argumento de que eventos climáticos mais extremos, como inundações e deslizamentos de terra, trouxeram riscos acrescidos.
E em Portugal, deve o Governo tomar as mesmas medidas?
Segundo Henrique Gouveia e Melo, chefe do Estado-Maior da Armada, o Governo deve “esclarecer” e preparar os portugueses para uma escalada da guerra na Ucrânia, mas “sem exageros”.
“A população deve estar informada. Essa discussão, num regime democrático, deve ser aberta e de forma esclarecida e esclarecedora. Não se deve, de alguma forma, minimizar esse risco. Também não se deve exagerar, criando preocupações exageradas, mas também não se pode minimizar ao ponto de isso não ser sequer uma preocupação”, explicou o responsável militar, que defendeu a autorização americana para Kiev usar mísseis de longo alcance em território russo.
“O que impede? É o medo da reação? Se for, mais vale baixarmos os braços e entregarmos desde já a vitória ao opositor que usa isso de forma psicológica contra nós”, apontou, salientando que a ameaça russa de Putin dificilmente seja concretizada. “Um conflito nuclear traria tantas desvantagens a todos os atores que não me parece que esteja no horizonte de ninguém”, acrescentou.
A mesma opinião tem o tenente-general Marco Serronha. Contactado pela ‘Executive Digest’, o responsável militar salientou que “mais do que avisos é criar um manual de pequenas instruções para a resiliência e sobrevivência das populações em caso de crise, cataclismo ou mesmo de conflito ou guerra” – de forma eletrónica ou outra, o importante é avisar a população sobre os riscos crescentes.
Até porque a relação entre a NATO e a Rússia vive “de zonas cinzentas”, que podem perfeitamente “aliviar ou complicar o filme”. E isso pode ter consequências para todos.
“Na relação NATO-Rússia, há ‘zonas cinzentas’ que pode ser o alívio ou complicação do filme. Todos eles sabem isso, sabem até onde podem ir sem provocar uma resposta legal e legítima. E quem defende também sabe até onde pode ou não fazer de modo a que a sua ação não seja encarada como uma agressão direta à Rússia. É uma zona cinzenta em alguns casos, e é normalmente aqui que acontecem os incidentes, explicou o tenente-general.
“A tentativa de puxar a linha para a frente, seja do lado russo seja da NATO. ‘Vou aqui passar esta linha que é mais ou menos cor de laranja não é vermelha, a ver o que os russos fazem. E os russos fazem o mesmo. Ao fim de duas ou três tentativas dessas, normalmente dá mal resultado”, referiu o especialista militar.
“A grande convicção que tenho, e acredito que seja a da NATO, é que a Rússia está a usar esta retórica para assustar as opiniões públicas do que propriamente pensar em fazer alguma coisa. Mas Putin é um ator racional, agora está a conduzir uma estratégia de comunicação efetiva. Sempre fizeram isso ao longo dos anos, a assustar as opiniões públicas ocidentais, que depois influenciam as decisões políticas. Isso é um caso notório na Alemanha, onde a Rússia já percebeu que tem funcionado até agora. Em outros países, não é tão público, mas sabemos que alguns receios, e esta questão de não dar tudo o que a Ucrânia tem pedido, tem a ver com eventualmente ultrapassar uma linha vermelha e que a Rússia fizesse mal”, assumiu.
Por último, referiu o tenente-general Marco Serronha, a atual tensão está “no domínio das perceções, e é neste domínio que as coisas se decidem muitas vezes. Não se espera que haja uma coisa efetiva, sem sombra de dúvida, estamos na base das perceções que é quando as guerras se têm iniciado. Mas é mais propaganda”, concluiu.
O major-general Arnault Moreira, em exclusivo à ‘Executive Digest’, defendeu a intenção dos países nórdicos de avisar a população. “Da mesma maneira que os sistemas de proteção civil se preparam para catástrofes, com a guerra é a mesma coisa. Temos de ter um planeamento antecipado em caso de ameaças de natureza militar, sobretudo entre os que estão mais próximos dessa ameaça. E é nesse sentido que se enquadram as diretivas e preparativos feitos por esses países. Parece-me absolutamente natural que da mesma forma que nos preparamos para uma catástrofe que pode nunca vir a acontecer, também nos preparemos para uma guerra de natureza militar sem que ela alguma vez venha a acontecer. Os preparativos são uma coisa, outra coisa é a leitura de que os preparativos indiquem que esteja iminente qualquer tipo de ação militar.”
O que fazer caso haja um ataque nuclear? Veja algumas das recomendações do exército português
Em caso de um possível ataque nuclear, seguir as seguintes instruções de proteção pode aumentar as tuas chances de sobrevivência e minimizar os danos:
Encontra Abrigo Adequado: Procura abrigo imediatamente num local seguro, como uma cave, abrigo subterrâneo ou estrutura de betão reforçado. Evita áreas de vidro, janelas e locais expostos.
Mantenha-se Informado: Está atento às instruções das autoridades locais e segue-as prontamente. Mantem um rádio a pilhas para receber atualizações e informações sobre o ataque.
Cria uma Zona de Refúgio: Prepara uma área segura em casa ou local de trabalho, com suprimentos de emergência, alimentos não perecíveis, água potável e kit de primeiros socorros.
Proteção Contra Radiação: Se possível, cobre a pele e protege as vias respiratórias com máscaras ou panos úmidos para reduzir a exposição à radiação.
Fica Dentro de Casa: Permanece dentro de casa após o ataque, a menos que sejas instruído de outra forma pelas autoridades. Evita sair desnecessariamente, pois a exposição à radiação pode ser perigosa.
Limpeza Adequada: Se entrares em contato com material radioativo, remove as roupas contaminadas e toma um banho completo com água e sabão o mais rápido possível.
Evita Alimentos e Água Contaminados: Não consumas alimentos ou água que possam estar contaminados pela radiação. Utiliza apenas fontes seguras de suprimentos.
Desliga a Ventilação e o Ar Condicionado: Se possível, desliga os sistemas de ventilação e ar condicionado para evitar a entrada de ar contaminado nos ambientes fechados.
Mantenha-se Calmo: Mantenha a calma e tenta tranquilizar os outros ao teu redor. O pânico pode piorar a situação e dificultar a tomada de decisões sensatas.
Ajuda os Feridos: Se estiveres em condições de fazê-lo com segurança, presta assistência aos feridos e procura ajuda médica o mais rápido possível.
Estas instruções são apenas diretrizes básicas e podem variar dependendo da situação específica e das orientações das autoridades locais. É importante estar preparado e seguir as instruções fornecidas pelas autoridades competentes em caso de emergência nuclear.