Sudão: Rússia veta projeto de cessar-fogo no Conselho de Segurança da ONU

A Rússia vetou hoje, no Conselho de Segurança das Nações Unidas, um projeto preparado em conjunto pelo Reino Unido e a Serra Leoa que apelava à cessação imediata das hostilidades no Sudão e à proteção dos civis.

A proposta de resolução vetada pela Rússia, que recebeu 14 votos a favor e um contra, apelava às partes em conflito que cessassem as hostilidades e que se empenhassem, de boa-fé, no diálogo que permita um cessar-fogo nacional, segundo informou a agência noticiosa France-Presse (AFP).

“Um país impediu o Conselho de falar a uma só voz (…) Um país é inimigo da paz. Este veto russo é uma vergonha, a Rússia está mais uma vez a mostrar ao mundo as suas verdadeiras cores”, denunciou o ministro dos Negócios Estrangeiros britânico, David Lammy, que presidiu à reunião, uma vez que o Reino Unido detém a pasta do Sudão no Conselho de Segurança.

O Reino Unido anunciou também um novo pacote de ajuda no valor de 113 milhões de libras (cerca de 135,2 milhões de euros).

Lammy vai, ainda hoje, apelar “à abertura da passagem de Adré, na fronteira com o Chade, para que as partes [em conflito] deixem de bloquear a entrega de ajuda”.

No âmbito desta necessidade de permissão para a entrada de ajuda humanitária no país, e para a retirada dos paramilitares dos bairros residenciais, o enviado especial dos Estados Unidos para o Sudão, Tom Perriello, chegou hoje a Porto Sudão, onde se reunirá com o presidente do Conselho Soberano, Abdel Fattah al-Burhane, para discutir estes temas.

Perriello negociará também com as autoridades a implementação do Acordo de Jeddah, assinado entre o exército e as paramilitares Forças de Apoio Rápido (RSF, na sigla em inglês), em maio de 2023, na cidade saudita de Jeddah, e que aborda essencialmente esses dois assuntos cruciais, noticiou a EFE.

Esta é a primeira visita de Perriello ao país desde a sua nomeação, em fevereiro passado, embora estivesse previsto que visitasse o Sudão em agosto.

No entanto, essa viagem acabou por não se concretizar porque o Conselho Soberano não aceitou a condição de se reunir no aeroporto de Porto Sudão devido a protocolos de segurança, já que não existe uma Embaixada dos Estados Unidos no Sudão.

O Sudão é devastado desde abril de 2023 por uma guerra que opõe o exército regular do general Abdel Fattah al-Burhane, que chegou ao poder através de um golpe de Estado em 2021, às RSF, do seu antigo adjunto, o general Mohamed Hamdane Daglo.

O conflito já custou dezenas de milhares de vidas e deslocou mais de 11 milhões de pessoas, incluindo 3,1 milhões fora do país, de acordo com a ONU.

Nas últimas semanas, o país assistiu a um novo surto de violência, com ambas as partes aparentemente “convencidas de que podem vencer no campo de batalha”, lamentou há alguns dias a subsecretária-geral da ONU para os Assuntos Políticos, Rosemary DiCarlo.

Os civis estão a pagar um preço elevado, com cerca de 26 milhões de pessoas a enfrentar uma grave insegurança alimentar, a ameaça de fome e acusações de violência sexual generalizada.

O projeto de resolução pedia a ambas as partes que “respeitem os compromissos” assumidos em 2023 para proteger os civis, que se abstenham de utilizar a violência sexual como “tática de guerra” e que permitam o acesso “rápido, seguro e sem obstáculos” à ajuda humanitária.

Todavia, este gesto de Moscovo não foi, do ponto de vista das relações externas, uma surpresa para muitos diplomatas que, segundo a AFP, já contavam com o veto.

Nas anteriores votações do Conselho de Segurança sobre a guerra no Sudão, a Rússia absteve-se.

O Sudão acusa regularmente os Emirados Árabes Unidos de apoiarem as RSF, nomeadamente através do fornecimento de armas, uma acusação rejeitada por Abu Dhabi e pelos paramilitares, posição que reiteraram hoje em Nairobi, no Quénia.

Numa conferência de imprensa horas antes de o Conselho de Segurança da ONU ter votado a resolução, representantes das RSF rejeitaram igualmente as acusações de abusos e violações maciças dos direitos humanos no conflito .

Todavia, um relatório de uma missão de investigação da ONU, publicado em 29 de outubro, sublinhava que as RSF eram “responsáveis por violências sexuais em grande escala nas zonas sob o seu controlo”.

Segundo um membro das RSF, Mohamad Mokhtar, esses atos foram cometidos “por outras partes” e essas acusações são “propaganda”.

Para o conselheiro das RSF, Ezzadden Elsafi, a solução para as atrocidades é “acabar com a guerra” e os paramilitares estão plenamente empenhados em numerosas iniciativas de paz e acusam a outra parte de “minar todos os esforços”.

As RSF acusaram ainda o Egito de “fornecer um apoio substancial ao exército sudanês”, nomeadamente através de ataques aéreos, uma alegação rejeitada pelo Cairo.

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