As baterias dos veículos elétricos e os materiais críticos necessários

Por Luís Gil, Membro Conselheiro e Especialista em Energia da Ordem dos Engenheiros

Hoje vou-me debruçar novamente sobre um tema que já aqui abordei algumas vezes, mas agora com base no mais recente relatório da International Renewable Energy Agency (IRENA).

De acordo com as metas estabelecidas, o avanço na transição energética requer que os veículos elétricos (VE) dominem as vendas de veículos de passageiros na próxima década. Em 2023 o número global destes veículos era já de cerca de 44 milhões. O cenário do 1,5ºC requer um número de 359 milhões de veículos em 2030. A produção de baterias terá por isso de crescer cerca de 5 vezes entre 2023 e 2030.

Embora a perspetiva para a capacidade de produção de baterias para estes VE seja positiva, é essencial assegurar um fornecimento adequado, fiável e acessível das matérias-primas necessárias, como por exemplo lítio, grafite, cobalto, cobre, fósforo, manganês e níquel. Só o lítio, no cenário da IRENA, terá de quadruplicar entre 2023 e 2030 e a procura de cobalto, grafite e níquel pode triplicar. No entanto, algumas inovações que permitem a substituição destes materiais, por outros menos críticos, ou a redução da sua utilização, estão já a reduzir a procura, como no caso no cobalto e do níquel.

A disponibilidade dos recursos não parece ser um constrangimento para a descarbonização a longo prazo, mas é necessário aumentar a produção rapidamente no curto e médio prazo. Uma das vias é diversificação das fontes de fornecimento. Estas incertezas têm de ser combatidas com uma constante monitorização e avaliação da dinâmica do respetivo mercado e a modelização de cenários possíveis. A procura terá que ver com o volume de vendas dos VE e das tecnologias de bateria usadas e o fornecimento estará relacionado com preços e disrupções devido a desastres naturais, disputas comerciais e tensões geopolíticas, entre outros.

Por isso a IRENA estudou 3 cenários, um baseado na estagnação da tecnologia, outro baseado nas tendências atuais e ainda outro baseado no aumento da inovação. Saliente-se que nem todos os materiais críticos considerados são utilizados apenas nas baterias dos VE, pois outras indústrias e aplicações também os usam, em maior ou menor grau.

Esta agência verificou que com uma expansão sustentada das cadeias de abastecimento, complementada por uma contínua inovação a nível das baterias, pode ser satisfeita a procura crescente das matérias-primas para as baterias dos VE, mesmo num cenário de uma rápida adoção dos VE em linha com a via da descarbonização no cenário dos 1,5ºC.

O tipo de baterias e a sua dimensão têm, naturalmente um impacto significativo na dinâmica dos mercados dos materiais críticos. Ora isto, diria eu, pode influenciar as decisões estratégicas e políticas neste domínio. Sendo determinado que existe escassez de algum material, pode optar-se por baterias mais pequenas, eventualmente em viaturas híbridas HEV ou PHEV, com motor de combustão eventualmente movido a combustíveis de baixo carbono, mas mantendo ainda a eletrificação ao maior nível possível, pelo menos enquanto a inovação tecnológica não introduzir no mercado baterias que não usem esse tipo de material.

Neste relatório prevê-se que as baterias de ião de sódio, que não necessitam de lítio, apenas terão algum impacto após 2030. Com base nas projeções atuais, parece verificar-se que a grafite natural será insuficiente para a procura em 2030, mas existe a possibilidade de produzir grafite sintética, embora através de um processo intensivo em energia. Quanto ao níquel, já existem novos tipos de bateria em que a sua utilização é diminuída. E quanto ao cobre, fósforo e manganês o mercado das baterias apenas representa uma pequena parte da sua procura global. Verifica-se assim que a inovação já conseguiu diminuir significativamente a procura dos materiais críticos.

Nos últimos anos tem também aumentado a densidade energética das baterias, o que melhora o seu desempenho, baixa os seus custos e ainda reduz a quantidade de material necessário por quantidade de energia armazenada/fornecida e, portanto, a sua procura. Saliente-se também que inovações a nível da mineração podem também aliviar as questões ligadas ao abastecimento.

Um aspeto interessante a considerar será a questão do carregamento. Se houver um crescimento exponencial da infraestrutura de carregamento, isso poderá apoiar a adoção de veículos com baterias mais pequenas e, deste modo, como menos requisitos a nível dos materiais.

É necessária cooperação internacional pois nenhum país possui todos os materiais necessários à transição. E apostar na reciclagem! Quando as baterias atuais forem recicladas potencialmente darão origem a mais materiais reciclados do que os necessários para produzir o mesmo número de baterias no futuro.

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