‘Ordem Moedas’ adotada pela Polícia Municipal de Lisboa, que já usa o crachá da PSP

A Polícia Municipal (PM) de Lisboa alterou recentemente o seu fardamento, passando a ostentar crachás da Polícia de Segurança Pública (PSP), em substituição das insígnias da cidade, uma mudança que faz parte de uma estratégia alargada da autarquia liderada por Carlos Moedas.

O objetivo, segundo o presidente da câmara, é reforçar os poderes da força policial municipal, inclusive a capacidade de realizar detenções, algo que tem suscitado críticas e gerado controvérsia.

A decisão, que entrou em vigor há cerca de três semanas, foi confirmada pela Câmara de Lisboa em resposta a um pedido de esclarecimento do jornal Público. A autarquia justificou a mudança com o regulamento de uniformes da PSP, afirmando que os efetivos da PM de Lisboa são formalmente membros da PSP e, como tal, têm o direito de usar o crachá dessa força. “A utilização do referido crachá no seu uniforme de serviço é um direito que assiste a tais efetivos, como aliás já sucede quando envergam o uniforme de representação”, declarou a câmara, recordando que o mesmo procedimento é seguido pela Polícia Municipal do Porto.

Esta alteração no uso de insígnias tem como pano de fundo uma proposta mais ampla de Carlos Moedas, que, nos últimos tempos, tem defendido uma maior intervenção da Polícia Municipal na segurança pública da cidade, particularmente no que toca ao combate à criminalidade. O autarca quer que os agentes da PM tenham poderes para realizar detenções, uma ideia que defendeu publicamente numa entrevista à SIC a 23 de Setembro, onde revelou ter dado instruções diretas ao comandante da PM, José Figueira, para que os seus agentes detenham suspeitos de crimes em flagrante.

Moedas afirmou que as detenções já estão a ocorrer e que se baseiam no facto de os agentes da PM serem, de origem, membros da PSP. “É uma grande mudança na filosofia de atuação na cidade”, referiu o edil, admitindo que ainda seriam necessários esclarecimentos jurídicos sobre esta matéria. Moedas já solicitou pareceres ao Ministério da Administração Interna (MAI) e à direção nacional da PSP, de forma a garantir que esta nova abordagem se enquadra dentro dos limites legais.

A posição do presidente da Câmara de Lisboa não foi bem recebida por todos. Os partidos da oposição, nomeadamente o PS e o Bloco de Esquerda, manifestaram discordância com a nova directiva, considerando que a mesma extravasa as competências legais da PM, cujo foco deve ser o policiamento de carácter administrativo. O PS exigiu, numa reunião de câmara, conhecer os contornos formais da instrução dada por Moedas ao comandante da polícia, enquanto o Bloco de Esquerda levou o assunto ao Parlamento, pedindo uma audição urgente da ministra da Administração Interna, Margarida Blasco, para clarificar a questão.

Rui Moreira, presidente da Câmara Municipal do Porto, também se manifestou contra a medida. Em declarações ao Diário de Notícias, Moreira classificou a ordem de Moedas como “um disparate e um perigo”, afirmando que a mesma poderia ser inconstitucional. “Há competências que o Estado central não pode delegar. Senão, qualquer dia, estamos no modelo americano dos xerifes”, afirmou.

A mudança de insígnias foi anunciada oficialmente durante a cerimónia do 133.º aniversário da Polícia Municipal de Lisboa, a 17 de Setembro, evento que teve lugar na Praça do Município. Na ocasião, o comandante da PM, José Figueira, declarou que a introdução do crachá da PSP visava “reforçar a autoridade” dos polícias municipais. Figueira também defendeu a necessidade de a Polícia Municipal ter um papel mais activo no combate ao crime, reivindicando que os seus agentes fossem autorizados a realizar detenções. “É percepção das comunidades locais que os polícias municipais estão limitados na sua capacidade de garantir uma detenção, o que nos fragiliza e nos expõe a um risco acrescido”, afirmou o comandante.

Na mesma linha, Figueira questionou a razão para os municípios de Lisboa e do Porto recrutarem agentes da PSP se estes não têm poderes para efectuar detenções em flagrante delito. “A circunstância de as polícias municipais de regime especial se encontrarem limitadas à figura da entrega sob detenção acaba por exigir uma intervenção adicional de outros órgãos de polícia criminal, o que se traduz numa sobreposição de recursos ineficiente”, destacou.

A cerimónia deste ano foi também marcada por uma exibição pública de força, com uma parada de estilo militar, onde os efectivos da corporação desfilaram em passo de marcha e os veículos de serviço foram exibidos. O evento foi transmitido no canal de YouTube da Câmara Municipal de Lisboa, mas as declarações mais polémicas de José Figueira foram removidas do registo de vídeo disponibilizado. No vídeo, intitulado “133.º Aniversário da Polícia Municipal de Lisboa”, o comandante aparece brevemente, agradecendo a presença das entidades oficiais, mas as suas afirmações sobre a capacidade de detenções foram omitidas.

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