Nota misteriosa sobre Mexia e Pinho na agenda de Salgado levanta suspeitas sobre fortuna em offshore

Uma nota encontrada na agenda pessoal de Ricardo Salgado, datada de 2010, lança novas dúvidas sobre a origem de seis milhões de dólares que o ex-presidente da EDP, António Mexia, manteve numa sociedade offshore entre 2014 e 2020. A descoberta desta nota misteriosa associando números aos nomes de Mexia e de Manuel Pinho, ex-ministro da Economia, poderá ganhar uma nova relevância na investigação conduzida pelo Ministério Público (MP).

Ricardo Salgado, antigo presidente do BES e do Grupo Espírito Santo (GES), tinha, na sua agenda, referências que agora estão a ser analisadas no âmbito do inquérito que investiga a origem dos fundos detidos por Mexia numa offshore chamada Miamex Ventures. Esta sociedade estava sediada nas Ilhas Virgens Britânicas, um conhecido paraíso fiscal nas Caraíbas, e a conta bancária da offshore era gerida por um financeiro português, que também ocupava o cargo de vice-presidente de uma corretora localizada no mesmo edifício do antigo BES Miami, nos Estados Unidos.

De acordo com as agendas pessoais de Salgado, que cobrem os anos de 2009 a 2012, o nome de António Mexia surge sete vezes, sendo cinco delas relativas a reuniões que ambos mantiveram. o Correio da Manhã acrescenta que o detalhe mais intrigante encontra-se numa entrada da agenda de 2010, onde aparece a seguinte anotação registada no dia 1 de março: “750xxx/671277xxx António Mexia EDP (Pinho)”.

Esta informação tornou-se ainda mais relevante após o MP revelar que, aparentemente, a referência a Mexia e Pinho havia sido apagada dessa nota, sendo recuperada por peritos da Polícia Judiciária durante a investigação ao caso BES/GES. O verdadeiro significado dos números associados a esta entrada, no entanto, permanece por desvendar, mesmo após as investigações do caso EDP.

As agendas de Ricardo Salgado mostram ainda que ele se reuniu com Mexia em duas ocasiões em 2009, outras duas em 2011 e uma vez em 2012. Uma dessas reuniões ocorreu a 9 de junho de 2009, quando Salgado recebeu Mexia às 11h00 e, mais tarde nesse dia, jantou com Manuel Pinho às 20h00. Estes encontros reforçam a tese do MP sobre uma possível relação de proximidade entre Salgado, Mexia e Pinho.

O Ministério Público aponta para a existência de uma ligação entre Salgado e Pinho em datas muito próximas do anúncio público de António Mexia como presidente da EDP. Segundo os registos, Salgado e Pinho reuniram-se a 29 de dezembro de 2005, apenas alguns dias antes de Mexia ser oficialmente nomeado para a liderança da EDP, a 5 de janeiro de 2006. No mesmo dia em que esta nomeação foi anunciada, ficou também conhecida a aquisição, por parte do BES, de uma participação qualificada no capital da EDP.

A origem dos seis milhões de dólares que António Mexia detinha na offshore Miamex será agora alvo de escrutínio por parte do Ministério Público, no âmbito do inquérito sobre a barragem do Baixo Sabor. Este processo inclui também uma investigação sobre alegados pagamentos de subornos por parte da construtora brasileira Odebrecht, no valor de 4,66 milhões de euros, a um personagem identificado como ‘Príncipe’, cuja identidade permanece por confirmar.

Outro elemento-chave nesta investigação é Bernardo d’Orey, vice-presidente da EFG Capital, uma corretora localizada no mesmo edifício do antigo BES Miami. Bernardo d’Orey era o responsável pela gestão da conta bancária da offshore de Mexia. Em 2019, durante a apresentação de uma parte da sua carteira de clientes a uma gestora de fortunas na Suíça, d’Orey identificou António Mexia como o beneficiário da sociedade offshore Miamex Ventures.

Paralelamente à investigação do Ministério Público, a Autoridade Tributária prepara-se para averiguar se António Mexia declarou em Portugal os seis milhões de dólares detidos na offshore. O objetivo é verificar se esta quantia foi sujeita a tributação, tendo em conta as obrigações fiscais a que o ex-presidente da EDP estaria sujeito.

Ao mesmo tempo, aproxima-se o fim do prazo para o Ministério Público deduzir a acusação no processo relacionado com os CMEC (Custos de Manutenção do Equilíbrio Contratual) das rendas da energia no caso EDP. Este prazo termina esta segunda-feira e, neste inquérito, são arguidos António Mexia, João Manso Neto, ambos ex-administradores da EDP, e João Conceição, ex-membro do gabinete ministerial de Manuel Pinho.

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