Navio avariado com 20 mil toneladas de explosivos faz soar alarmes no Mar do Norte

Um barco com 183 metros, avariado há várias semanas e que transporta 20 mil toneladas de um material altamente explosivo, está a lançar preocupação entre vários países do mar do Norte, onde o cargueiro se encontra. O navio, denominado MV Ruby, encontra-se à deriva desde o último fim de semana, entre a costa sul da Noruega e o norte da Dinamarca, transportando uma perigosa carga de nitrato de amónio, um componente utilizado na produção de fertilizantes.

Caso este material seja inflamado, poderá gerar uma explosão até sete vezes mais potente do que a que devastou o porto de Beirute em 2020, e que resultou na morte de 207 pessoas, para além de deixar centenas de feridos.

A bordo do MV Ruby estão 20.000 toneladas de nitrato de amónio, a mesma substância que causou a explosão de 2.750 toneladas no porto de Beirute. Especialistas citados pelo El Confidencial apontam que, apesar da natureza perigosa deste composto químico, o risco de inflamação é mínimo se as condições de armazenamento a bordo forem estáveis. Contudo, a carga do navio não é a única fonte de preocupação. Analistas sugerem que o navio, que ostenta a bandeira de Malta, pode estar ligado à “frota fantasma” que a Rússia utiliza para contornar sanções internacionais.

O mistério do MV Ruby

O navio partiu do porto russo de Kandalashka, na península de Kola, no dia 22 de agosto, com destino às Ilhas Canárias, especificamente ao porto de Las Palmas. No entanto, poucas horas após a sua partida, o navio enfrentou uma tempestade que o fez encalhar em águas rasas. De acordo com o relatório da tripulação, a embarcação experimentou fortes vibrações no casco, e o incidente foi atribuído à falta de preparação adequada do plano de navegação.

Apesar dos danos registados, o navio não regressou ao porto e continuou a sua rota, solicitando um porto de emergência apenas a 25 de agosto, quando informou as autoridades norueguesas sobre a sua situação. No início de setembro, o MV Ruby foi rebocado para o porto de Tromsø, onde mecânicos locais identificaram danos significativos no casco, leme e hélice, deixando o navio incapaz de se manobrar, o que o torna ainda mais perigoso para navegação.

Uma inspeção da polícia norueguesa revelou a carga potencialmente explosiva de nitrato de amónio, levando as autoridades a ordenar que o navio fosse afastado da costa, estabelecendo um perímetro de segurança de 500 metros. Inicialmente, o plano era que o navio fosse reparado no porto lituano de Klaipėda, mas as autoridades da Lituânia recusaram-se a receber o MV Ruby, tal como fizeram outros países, devido ao risco que representava.

Preocupações com a “frota fantasma” russa

Enquanto o MV Ruby vagava à deriva nas águas movimentadas do mar do Norte, as autoridades marítimas da Dinamarca monitorizavam atentamente os seus movimentos. Relatos da televisão pública dinamarquesa indicaram que o navio estava agora a caminho de Malta, segundo o site de monitorização de tráfego marítimo ShipTraffic.com.

Jacob Kaarsbo, analista do think tank Europe, com sede em Copenhaga, afirmou que a preocupação das autoridades marítimas se justifica devido a dois fatores principais: “primeiro, o navio não está em condições adequadas para navegar, e segundo, a sua carga é extremamente perigosa.” Kaarsbo também levantou questões sobre o comportamento suspeito do MV Ruby, que, sem previsão no plano de navegação, aproximou-se da base da NATO em Tromsø e de instalações petrolíferas em Bergen, ambas na Noruega. “A sua rota de navegação sugere que pode haver algo mais por detrás da carga de componentes químicos do Ruby,” acrescentou o especialista.

O analista também alertou para o aumento das preocupações com a denominada “frota fantasma” russa — embarcações frequentemente mal mantidas e sobrecarregadas, que navegam sob bandeiras de conveniência de países como Libéria ou as Ilhas Cook, mas que transportam mercadorias russas, incluindo petróleo e gás, pelo mar Báltico e o mar do Norte, para evitar sanções internacionais.

Um perigo ambiental e de segurança

O fenómeno da “frota fantasma” não é uma novidade para os países do mar do Norte e do mar Báltico. Acredita-se que estas embarcações representem um perigo ambiental significativo, especialmente em caso de acidente, dado que muitos desses navios navegam sem seguro e os seus proprietários estão ocultos através de complexas redes de empresas. Além disso, as autoridades suecas alertaram para a possibilidade de essas embarcações serem utilizadas para espionagem, uma vez que foram detetados equipamentos incomuns a bordo de alguns desses navios.

O jornalismo de investigação na região sugere que o número de embarcações envolvidas nesse esquema pode chegar a 1.400, segundo o Atlantic Council, das quais cerca de 1.000 seriam petroleiros. Este tráfico pelo mar Báltico desempenha um papel crucial na economia russa, já que mais de metade do petróleo russo exportado passa por esta rota, de acordo com a agência Bloomberg.

A dificuldade em abordar legalmente esta questão reside nos acordos internacionais de livre navegação em águas internacionais, o que impede que muitos estados possam agir de forma mais eficaz. Jakob Kjøgx Bohr, jornalista dinamarquês, apontou que “seria necessário um enorme esforço e recursos para acusar formalmente estas embarcações, já que todos os países assinaram acordos que garantem a livre circulação em águas internacionais.”

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