Novo pacote para a habitação: Estas são as alterações previstas e o impacto nos juros
Por Tiago Dias, Intermediário de Crédito MaxFinance
O valor do mercado imobiliário tem aumentado exponencialmente nos últimos anos, principalmente fruto da escassez de novas construções, mas também pela elevada procura de estrangeiros para residir no nosso país. No caso do setor da habitação, ambos os fatores de escassez de construção nova e elevada procura provocam uma subida dos preços de venda de imóveis.
Consoante a zona geográfica do país, o valor de venda de imóveis varia bastante, sendo que, além dos 10% essenciais para aquisição de imóvel, considerando que a banca financia apenas até 90% sobre o valor da compra de imóvel, o Imposto Municipal sobre Transmissões Onerosas de Imóveis (IMT) e Imposto de Selo da compra (IS) são dois dos grandes custos de aquisição de imóvel.
Para um jovem entre os 20-35 anos torna-se bastante difícil, ou praticamente impossível, ter esta poupança efetuada, pois a capacidade de aforro é bastante baixa em Portugal devido ao fraco nível de literacia financeira nos jovens. Terão como solução para a compra de imóvel a ajuda de familiares para “financiarem” o valor necessário à compra, facto que nem sempre será possível, obrigando os jovens a ficar na casa dos pais até mais tarde ou mesmo a arranjar soluções de habitação mais precárias ou noutros pontos do país, longe de família ou mesmo de oportunidades de emprego que promovam a carreira profissional.
Em resposta às dificuldades que os jovens em Portugal têm para aquisição de habitação própria, 2024 traz-nos algumas medidas cujo objetivo é promover o acesso à compra de imóveis para habitação. Os jovens até aos 35 anos que comprem a primeira casa poderão contar com a isenção de IMT e IRS, poupando assim várias centenas de euros, sendo que a medida entrará em vigor com efeitos a 1 de agosto. A isenção de IMT e IRS será aplicada na compra da primeira habitação própria e permanente por jovens até aos 35 anos, para imóveis até aos 316.272 euros. Para imóveis acima desse montante e até 633.453 euros, mantém-se a isenção máxima do escalão anterior, não havendo qualquer isenção para imóveis de valor superior.
Além desta medida, está a ser debatida e analisada a possibilidade de o Estado contribuir para os capitais próprios, a denominada “entrada” para a compra de imóveis, através de uma garantia pública no crédito habitação. Ainda há bastantes incertezas como, na prática, esta medida irá funcionar, mas o conceito é que esta garantia seja dada pelo Estado às entidades bancárias para fazer face aos 10% que os jovens compradores têm de ter para a aquisição de habitação própria permanente.
A proposta em análise terá como base o Estado garantir até 15% do valor de aquisição do imóvel, pretendendo criar condições para que os jovens consigam aceder a um empréstimo até 100% do valor da casa. Mas quando estes 15% forem pagos, o Estado deverá sair da equação. O Estado apenas será chamado a ter de pagar alguma quantia, caso se registe incumprimento do pagamento do empréstimo, da mesma forma que o incumprimento junto do banco não isenta o cliente de responsabilidades. Desta forma, o Estado atuará como uma espécie de fiador, gerando uma obrigação entre as partes.
O governador do Banco de Portugal considera que não poderemos descartar o trabalho feito nos últimos anos na melhoria do sistema bancário, mas também não criar riscos de sobre-endividamento das famílias, principalmente pela aplicação das medidas macroprudenciais por parte do Banco de Portugal. Além disso, considera que não se pode “pôr em causa a estabilidade” do setor, numa altura em que “temos níveis de incumprimento muito baixos”, porque, com a garantia, uma família pode conseguir um crédito da casa com financiamento a 100% ao invés de 90%, o limite definido pelo Banco de Portugal. Isto significa que, na prática, poderá ter prestações da casa mais elevadas que pesam mais sobre o seu orçamento, resultando num aumento da taxa de esforço.
Recorde-se que as regras macroprudenciais atualmente em vigor determinam que o crédito não pode ir além de 90% do valor de compra de habitação própria permanente. Além disso, é determinado que um cliente não deve despender mais de 50% do seu rendimento na prestação da casa ao banco (taxa de esforço).
A destacar ainda que os últimos dois anos apresentaram uma inflação elevada e aumento das taxas de juro de referência do Banco Central Europeu, provocando um aumento dos encargos com o crédito habitação em Portugal, considerando que a maior parte dos financiamentos obtidos para compra de imóvel utilizavam, até final de 2023, uma taxa de juro variável. Ambos os fatores provocaram uma redução do poder de compra dos portugueses e um aumento substancial do peso das prestações com a habitação no orçamento familiar.
Na generalidade dos clientes, salvo raras exceções, a capacidade de aforro é bastante reduzida e não possuem capitais próprios para aquisição de imóvel, limitando a compra de habitação própria caso não consigam um “patrocinador familiar” que possa emprestar o capital necessário para a compra. A questão de literacia financeira deveria ser melhorada através de maior investimento neste tema durante a escolaridade obrigatória, capacitando os jovens de um maior conhecimento de áreas práticas da vida financeira e sobre a importância da boa gestão de um orçamento familiar e poupança.
As medidas anunciadas são de louvar, como o esforço do Estado em promover equidade de acesso à habitação para os jovens poderem construir a sua vida familiar, isentando impostos pesados no ato da compra de imóvel e, se for aprovado, colaborar na obtenção dos 10% iniciais para complementar o financiamento bancário. Existe muita expetativa nestas medidas, principalmente pela folga financeira que podem provocar nos compradores no ato da compra, eliminando os impostos IMT/ IS e colaborando com a percentagem necessária para compra de imóvel (10%) que os bancos não podem financiar.
No entanto, estas medidas não resolvem per si a crise na habitação, onde é urgente fomentar a construção de blocos habitacionais nos principais polos urbanos em Portugal pois, sem novas habitações, o preço continuará certamente elevado. Adicionalmente, existe o impacto do aumento da taxa de esforço dos clientes proveniente do eventual financiamento dos 10% obtidos através de garantia pública para aquisição de imóvel, que poderá colocar muitas famílias em situação de sobre-endividamento e incumprimento, no caso de as taxas de juro voltarem a subir no futuro.