Escolas sem lugar, professores ‘perdidos’ e “presentes envenenados”. Docentes desesperam com erros e falhas na colocação

A recente colocação de professores através do concurso interno revelou uma série de falhas que têm deixado centenas de docentes em situação de incerteza. Muitos professores que foram informados de que tinham sido colocados em novas escolas descobriram posteriormente que as vagas não existiam, forçando-os a concorrer novamente à mobilidade interna. Este cenário gerou angústia e frustração entre os profissionais da educação, que agora enfrentam a incerteza sobre onde irão lecionar no próximo ano letivo.

Eugénia Pereira, professora de Biologia e Geologia com 62 anos, foi uma das afetadas por este problema. Com 38 anos de serviço, Eugénia vivia em mobilidade por doença no Conservatório de Música do Porto, devido a problemas de saúde que exigiam proximidade da sua residência. Recentemente, participou no concurso interno de colocação de professores com a esperança de garantir uma vaga próxima de casa. No dia 12 de julho, recebeu a notícia de que tinha sido colocada no Agrupamento de Escolas Carolina Michaëllis. Contudo, a alegria foi curta. Menos de uma semana depois, soube que a escola para onde foi colocada não tinha, de fato, uma vaga disponível.

“Fui à escola e informaram-me que tinham uma vaga negativa e que eu e mais três colegas fomos colocados em uma escola que tinha uma vaga negativa. A todos nós disseram que não havia horário e que teríamos de concorrer à mobilidade interna”, contou Eugénia à CNN Portugal. Ela descreve a situação como um “concurso fictício”, lamentando que agora esteja “em quadro de uma escola que não tem lugar para mim”.

A professora está angustiada por não saber onde irá lecionar a partir de setembro e, apesar dos seus problemas de saúde, não pode concorrer à mobilidade por doença devido à sua colocação fictícia. “Estou a ser prejudicada com um presente envenenado. Vou ter de concorrer como se estivesse na situação de uma professora contratada”, acrescenta Eugénia.

Outro caso é o de “Isabel”, uma professora do 1.º ciclo que pediu anonimato. Natural de Sobrado, no concelho de Valongo, e residente em Porto Alto há seis anos, Isabel estava entusiasmada por ter sido colocada perto de casa. No entanto, a sua alegria também foi efémera. Após aceitar a colocação através da plataforma SIGRHE, foi contactada pela escola onde estava anteriormente a informar que a nova colocação não tinha componente letiva disponível e que teria de concorrer à mobilidade interna. Isabel, que até então dava aulas perto da sua residência, agora enfrenta a incerteza de ser colocada em localidades distantes, como a Amadora ou Sintra.

Filinto Lima, presidente da Associação Nacional de Diretores de Agrupamentos e Escolas Públicas (ANDAEP), expressou a sua preocupação com a situação, sublinhando que o Governo não atendeu aos alertas dos diretores sobre o sobredimensionamento das vagas. “Nenhum diretor gosta de enviar os seus professores para a plataforma de indicação de componente letiva por não ter horário disponível”, afirmou Lima. Ele também destacou que muitos dos professores afetados são já de idade avançada e próximos da reforma, o que agrava a situação.

A CNN Portugal procurou esclarecimentos junto do Ministério da Educação, Ciência e Inovação (MECI) sobre o número de professores afetados e as soluções para os casos em questão, mas não obteve resposta. Os sindicatos, como a Federação Nacional da Educação (FNE), têm registado um aumento significativo de queixas e desabafos de docentes que, após serem colocados, foram informados de que não teriam componente letiva. Pedro Barreiros, secretário-geral da FNE, revelou que há “centenas” de professores nesta situação e questionou o MECI sobre a falta de vagas reais, considerando-a incompreensível dado o contexto de falta de professores.

Em resposta, a Fenprof minimiza o problema, acreditando que muitos docentes serão repescados na próxima fase da Indicação de Componente Letiva (ICL2), prevista para agosto. Vítor Godinho, dirigente da Fenprof, explicou que muitas escolas podem ainda ajustar as suas necessidades e chamar os professores afetados.

Enquanto isso, Eugénia e Isabel permanecem na incerteza. Eugénia, com 62 anos, não espera grandes mudanças na ICL2 e expressa o seu desânimo. Isabel, professora do 1.º ciclo, também não tem grandes esperanças de uma colocação que se ajuste às suas necessidades. “Se fosse uma empresa privada, isto seria motivo para uma queixa no Tribunal do Trabalho. É lamentável estar nesta situação depois de 38 anos de serviço”, conclui Eugénia.

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