França: Esquerda bloqueada na escolha de um novo primeiro-ministro

Incapaz de chegar a acordo sobre um candidato a primeiro-ministro, a esquerda francesa esforça-se por ultrapassar as suas divergências, enquanto o atual primeiro-ministro, Gabriel Attal, e o presidente Emmanuel Macron reuniram-se hoje no início de uma semana decisiva.

Numa análise ao atual momento político que se vive em França, a agência noticiosa France-Presse (AFP) lembra que a Nova Frente Popular (NFP), coligação de partidos de esquerda que saiu vencedora da segunda volta das eleições legislativas antecipadas, realizada no passado dia 7 de julho, ainda não chegou a acordo sobre uma equipa governamental.

O nome de Huguette Bello, presidente do Conselho Regional da Reunião, uma ilha francesa no Oceano Índico, proposto pelos comunistas na semana passada, não convenceu o Partido Socialista.

O percurso desta responsável encarada como próxima do partido França Insubmissa (LFI, esquerda radical) foi abandonado durante o fim de semana.

“Estou muito zangada com a postura que estamos a mostrar”, frisou hoje a ecologista Sandrine Rousseau na rede social X.

As maiores tensões são entre a LFI e os socialistas, com os dois principais grupos da NFP a disputarem a liderança da esquerda na nova Assembleia Nacional francesa (a câmara baixa do parlamento).

“Será que o Partido Socialista está a jogar com o tempo para deixar que a Nova Frente Popular se desagregue e desista do programa?”, acusou a LFI, num comunicado citado pela AFP.

Antes, o coordenador do movimento, Manuel Bompard, tinha criticado a “oposição sistemática, os bloqueios e os vetos” dos socialistas “a todas as candidaturas”.

“Nada foi bloqueado”, respondeu Olivier Faure, o candidato oficial dos socialistas ao cargo de chefe do Governo.

Para sair deste impasse político, Olivier Faure propôs, no canal France 2, “alargar” o prisma a “alguém de fora”, “talvez da sociedade civil”, uma via também mencionada por alguns ecologistas.

Mas a LFI rejeitou esta hipótese, alegando que lhe faltariam “garantias” para “a implementação do programa da Nova Frente Popular”.

E o líder da LFI, Jean-Luc Mélenchon, também vincou a sua posição na rede social X: “Exigimos uma candidatura única para a presidência da Assembleia Nacional e não retomaremos qualquer discussão sobre qualquer outro assunto até que isto esteja resolvido”.

Nesse sentido, Mélenchon decidiu suspender as negociações com os outros partidos da NFP para a escolha de um candidato a primeiro-ministro, acusando os socialistas de bloquearem todas as outras propostas para a chefia do Governo, a última das quais a de Huguette Bello.

A decisão da LFI surge depois de a esquerda também não ter conseguido chegar a acordo sobre um candidato único à presidência da Assembleia Nacional.

A esquerda tem um grande interesse nesta eleição: uma parte do campo presidencial tem tentado, há vários dias, construir uma maioria alternativa à NFP para este posto-chave na Assembleia, que o presidente cessante Yaël Braun-Pivet pretende manter.

Um acordo com a direita, por exemplo, poderia permitir ao bloco presidencial ultrapassar a esquerda em termos de votos.

Trata-se da questão da frente republicana contra a União Nacional (Rassemblement National, RN, na sigla francesa) que a esquerda gostaria de manter na Assembleia Nacional, privando a extrema-direita de qualquer cargo de responsabilidade.

Mas vários representantes ‘macronistas’, incluindo Braun-Pivet, opõem-se a isso.

A União Nacional, que ficou em terceiro lugar nas eleições, conquistou 143 deputados.

Esta questão da frente republicana esteve na ordem do dia de uma reunião, hoje realizada, do grupo Renascimento (partido de Macron) oficialmente rebatizado “Juntos para a República” em torno do seu novo presidente, Gabriel Attal.

Enquanto se aguarda a constituição da nova legislatura, o Presidente Emmanuel Macron recebeu, também hoje, os líderes partidários do campo presidencial, entre os quais Stéphane Séjourné (Renascimento) e Marc Fesneau, em representação do presidente do Movimento Democrático, François Bayrou.

Nesta fase, Attal continua a ser primeiro-ministro, enquanto Emmanuel Macron não aceitar a sua demissão, o que deverá acontecer “na terça ou quarta-feira”, segundo o ministro do Interior, Gérald Darmanin.

No entanto, a atual equipa manter-se-á durante algum tempo, nomeadamente durante o período muito sensível dos Jogos Olímpicos (que arrancam em Paris no próximo dia 26), para gerir os “assuntos correntes”.

Uma reunião do Conselho de Ministros marcada para as 11:30 (10:30 em Lisboa) de terça-feira poderá abrir caminho a esta nova configuração.

No meio da incerteza política, uma coisa é certa para a futura equipa governamental: vai ter de lidar com finanças públicas que estão no vermelho.

Num relatório denso, apresentado hoje de manhã, o Tribunal de Contas faz um balanço preocupante.

A necessidade de reduzir a dívida é um “imperativo” que “deve ser partilhado” por todas as forças políticas, advertiu o primeiro presidente da instituição, Pierre Moscovici.

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