Já há dois países no mundo que perderam por completo os seus glaciares. Mais se seguirão, alertam especialistas

A Venezuela ‘reclamou’, em maio, o estatuto do primeiro país nos tempos modernos a perder todos os seus glaciares devido às alterações climáticas – no entanto, de acordo com os investigadores, citados pelo jornal ‘POLITICO’, a Eslovénia pode reclamar esse ‘título solene’ há mais de três décadas. No entanto, a convicção é generalizada: podem ser os primeiros, mas não serão certamente os últimos.

“Os dois remanescentes glaciares não se moveram e não foram observadas fendas glaciares nas últimas décadas – essas são características que definem os glaciares reais”, aponta Miha Pavsek, que lidera as medições de gelo na montanha Triglav e no pico de Skuta, pelo ‘Anton Melik Geographical Institute’.

O derretimento dos glaciares é uma das consequências icónicas das alterações climáticas causadas pelo homem, e mesmo países do Ártico, como a Islândia, já perderam glaciares inteiros. Mas a Eslovénia e a Venezuela parecem ser os primeiros países desde o século XVIII a perder os seus últimos glaciares – recorde-se que o Painel Intergovernamental sobre Alterações Climáticas, das Nações Unidas, alertou que se podem perder entre 18 e 36% da massa glacial global ao longo do século XXI devido, em grande parte, ao aquecimento global.

Na rede social ‘X’, o climatologista Maximiliano Herrera chamou a atenção para o declínio de La Corona – o último glaciar da Venezuela –, citando medições de dezembro da Universidade de Los Andes que mostram uma área restante de 20 metros quadrados.

“O desaparecimento de todos os glaciares na Venezuela é uma tragédia nacional”, salienta Julio César Centeno, professor da Universidade de Los Andes que estudou os glaciares. “É um sinal de alerta sobre a avalanche de efeitos adicionais que estão a chegar ao país no curto prazo como consequência do aquecimento global.”

Mas a Eslovénia e a Venezuela provavelmente perderam os seus últimos glaciares anos antes. Não existe um ponto de morte universalmente aceite para um glaciar e não há uma organização internacional reconhecida como uma autoridade em classificação glaciar. De acordo com Centeno, “o tamanho mínimo de um glaciar é 0,1 quilómetros quadrados [100 metros quadrados]”. O Serviço Geológico dos Estados Unidos também utiliza esse limite e diz que é “a diretriz comummente aceite”.

Na Eslovénia, a área de Skuta é inferior a 0,1 quilómetros quadrados desde pelo menos 1969, e Triglav caiu abaixo do limiar em 1986. Já La Corona, na Venezuela, provavelmente perdeu o seu estatuto glaciar em 2016. Para Centeno, é uma sombra do seu antigo estado glacial. “É um cadáver insepulto em avançado estado de decomposição”, relata.

A perda destes glaciares e dos que se seguirão terá pesadas consequências ambientais. Os glaciares eslovenos derretem no Mar Negro e La Corona desagua nas Caraíbas, contribuindo para o aumento do nível global do mar que deverá causar estragos nas comunidades costeiras.

“É também um aviso claro e sonoro para o resto da América Latina”, alerta Centeno. “As consequências da inevitável perda dos glaciares da Colômbia, Equador, Peru e Bolívia terão um impacto social muito maior do que o da Venezuela, devido à dependência de populações muito maiores das fontes de água destes glaciares.”

Prevê-se que o último glaciar do México, Gran Norte, perca o seu estatuto algures entre 2026 e 2033 e desapareça completamente até 2045.

La Corona foi a última das “Cinco Águias Brancas” – glaciares que cobriam as montanhas acima da cidade venezuelana de Mérida. “Mérida não é mais a ‘Cidade das Neves Eternas’. As Cinco Águias Brancas desapareceram. Nós as destruímos. Estão entre as primeiras vítimas venezuelanas do aquecimento global”, conclui o investigador.

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