Aumento salarial de 14,75% e 15.º mês pago sem impostos: Propostas da CIP são “interessantes” e uma “dádiva aos trabalhadores” mas Governo deve recusar, dizem economistas
A CIP propôs na semana passada ao Governo o designado ‘Pacto Social’ com 30 medidas, entre as quais o pagamento voluntário pelas empresas do 15.º mês aos trabalhadores isento de contribuições e impostos, propostas que hoje estão a ser discutidas com o Executivo.
Economistas ouvidos pela Executive Digest elogiam as propostas, admitindo que mereçam uma análise mais detalhada, mas também admitem que o Governo não deverá acolher as recomendações da CIP.
A confederação patronal propôs ainda, em 2024 e 2025, um incremento salarial de 14,75% nos salários com redução temporária da Taxa Social Única (TSU). Desse valor, o aumento salarial seria de 4,75% e os restantes 10% iriam para um plano individual de reforma.
A CIP defende no Pacto Social a criação de planos de reforma nas empresas com pagamentos isentos de TSU e IRS, provenientes desta medida extraordinária de liquidez para as famílias, de contribuições da entidade patronal, de dividendos pagos aos trabalhadores, de horas extraordinárias ou de horas de descanso adquiridas como descanso compensatório ou de férias anuais que excedam o período mínimo.
Quanto ao pagamento do 15º mês isento de contribuições e impostos, o economista João Duque indica que “é a mesma coisa que baixar a taxa de imposto, é igual” . “O que estão a dizer é assim: vamos aumentar salários, mas não vão taxar a mais aqui. O que quer dizer, que pedem a baixar taxa de IRS sem efetivamente baixar o imposto. O Governo não esta aberto a essa hipótese porque não quer baixar a taxa de imposto a todos. E isso é baixar a taxa de imposto a todos. Acho que essa proposta não vai ser aceite, apesar de ser interessante. O Governo sabe que o numero de pessoas que ganham mais, dos escalões superiores, é pequeno, e portanto não vai buscar votos nenhuns aí… Até a maioria destas pessoas, possivelmente já nem deve votar no PS. Porque isto, a aplicar-se seriam medidas eleitoralistas, não são medidas de natureza orçamental”, explica João Duque à Executive Digest.
Já Sandro Mendonça, professor da ISCTE Business School destaca “que se trata de um nexo de medidas integrado e detalhado e isso revela um esforço organizado e aprofundado por parte da equipa reunida em torno da CIP”. “À medida que se aproxima o momento da apresentação do orçamento é de registar quando temos propostas pensadas e colocadas à vista em cima da mesa. Isso aumenta a exigência de análise e de imaginação para os outros parceiros, nomeadamente o mundo laboral”, começa por indicar o especialista, ainda que defenda que “não é nítido” que as propostas sejam fiscalmente neutras.
“A medida do 15º mês parece uma dádiva aos trabalhadores sem contrapartida. Nesse mês o salário bruto é igual ao líquido, pelo que assim a retribuição equivale a mais de um mês na ótica dos trabalhadores. O Estado não perde, os trabalhadores ganham”, considera o docente universitário, em entrevista à Executive Digest.
Quanto ao aumento salarial de 14,75%, o economista João Duque relembra que “os salários vão aumentar no próximo ano de qualquer forma”, por um lado, quanto por outro”, o ano não está a correr mal às empresas, está a correr pior às famílias do que às empresas”, pelo que “há espaço para acomodar aumentos salariais maiores”.
O especialista sublinha outro aspeto que a proposta manifesta, de forma mais ou menos velada: “È inevitável aumentar os salário, pelo menos das pessoas com competência técnica, porque se não, vão-se embora. E como tem havido crescimento, particularmente em alguns setores, há muita procura de mão-de-obra qualificada, lá fora, para sair de Portugal e a alternativa a não pagar [mais] é que estes trabalhadores saiam do mercado nacional”.
Ainda assim, a proposta é valorizada, na opinião de João Duque. “É uma forma de distribuir, que podia ser feito de outra maneira. Mas as medidas são, neste caso, “apenas uma forma de mostrar ao Governo que há outras alternativas, outros caminhos, com o mesmo resultado. Não se perde se as pessoas trabalharem mais e tributarmos menos taxa, vamos buscar o mesmo”, explica.
Por seu lado, Sandro Mendonça considera que “com diminuição do peso relativo da TSU, pode assim gerar-se circulação de valor da economia, aumentando a procura agregada e induzindo receitas fiscais pelo lado do IVA”.
Ainda, o professor da ISCTE Business School elogia a proposta de IVA a 6% para todos os produtos alimentares, recordando que o IVA zero em vigor tem surtido algum alívio nos orçamentos familiares, mas assinala que “seria mais estranho que produtos como refrigerantes ou chocolates não fossem tratados como qualquer outro bem de consumo”.
“Todas as vontades que venham contrabalançar os desequilíbrios verificados nos últimos tempos têm de ser exploradas”, considera o docente, em declarações à Executive Digest.