O lado obscuro dos mercados financeiros

Por: Adelino Matos, CEO & founder da Escola Trading

Falar de criptomoedas, Forex, mercados financeiros e/ou investimentos é quase como se ecoasse nas nossas cabeças as palavras “fraude”, “esquema” ou “mentira”, certo? Gostava de dizer que está errado, mas a visão é claramente esta. Atribuir culpas acaba por não bastar e neste caso descarto quase na totalidade a culpa do utilizador. Quem perpetua e normaliza esta visão (os grandes “gurus”) é a fonte de toda esta distorção da realidade. Quem paga é o mercado e a credibilidade do mesmo e eu, como profissional da área, sinto que tenho o dever de alertar as pessoas para este tipo de esquemas.

O problema vai muito além do meio que é utilizado para atingir o fim: o mercado de investimentos. Infelizmente, é um canal propício porque, claro está, envolve dinheiro, esperança e promessas. Quem nunca se deparou com este tipo de cenário, seja ele referente a mercados financeiros ou não?
Existem muitos exemplos de como aliciar as pessoas com os mercados financeiros, mas não vou apresentar uma lista extensiva e específica de esquemas e casos que aconteceram – correria o risco de precisar do dobro dos caracteres. O objectivo é alertar para os possíveis esquemas porque, independentemente de quem os faça, se estivermos alerta e informados, não interessa quão habilidosa é a outra parte.
Vou focar-me em quatro dos mais frequentes esquemas que são utilizados como engodo para as pessoas vítimas deste tipo de fraude. No final, darei o meu ponto de vista sobre como uma pesquisa capaz sobre como aprender a investir pode evitar que seja apanhado nestes esquemas.

O famoso esquema de pirâmide
Não quero colocar as minhas mãos no fogo, mas se o tivesse de fazer, este deverá ser a aproximação mais usual de um esquema no mundo dos mercados financeiros e que espelha na perfeição o porquê de que, pirâmides, só em Gizé.
Em Portugal, a informação partilhada pelos meios de comunicação social é altamente centrada em dois grandes temas: futebol e política. Por vezes, parece até estranho sermos informados de algo que fuja do diariamente difundido. Acaba por ser um ponto tão relevante e de credibilidade quando se foca, por exemplo, num dos grandes casos de fraude nos mercados financeiros.
O caso em questão prometia tudo e mais alguma coisa aos potenciais clientes: liberdade financeira, facilidade de a conquistar e ganhos absurdos mensais. Quem opera nos mercados financeiros sabe que rapidez e resultados são, na esmagadora maioria, uma receita que não funciona e que está condenada ao prometido neste tipo de situações.

O discurso adoptado é facilmente identificável (ainda mais nos tempos modernos e de elevada difusão de informação), mascarava o famoso esquema de pirâmide. O objectivo final (ou poderei dizer engodo) era a promessa de tornar os clientes milionários, dado que se apresentava como um software para investidores em Forex e criptomoedas.
A existência de uma componente automática no software onde, alegadamente, era a equipa da empresa que operava após o investimento inicial do cliente, era provavelmente o maior chamariz.
Para quem necessita de uma fonte de rendimento extra e que procura o caminho mais fácil, não há nada mais tentador que existir a possibilidade de ganhar dinheiro quase em piloto automático.
Qual é a primeira barreira à adesão deste enorme projecto? A clássica jóia de entrada e a mensalidade que, como bom esquema de pirâmide que se preze, passaria a não ser necessária se a pessoa conseguisse angariar mais duas pessoas, segundo as mesmas condições de adesão abordadas anteriormente.

Tudo isto vive suportado por uma fonte inesgotável de novos clientes que alimentam o topo da pirâmide com novos contratos, por assim dizer. A dada altura, bem no início, os primeiros clientes passam a ser completamente irrelevantes, porque já não contribuem para o pão mensal da empresa. Isto é um ciclo infindável com o crescimento exponencial que pode representar.
Uma das características que prendia os recém-chegados eram os vídeos educacionais e os cursos disponibilizados, que davam o parecer de competência aos investidores automáticos, explicando o que supostamente fariam com o dinheiro, diga-se, oferecido. Mais à frente, o passo seguinte: poderíamos passar de meros clientes a angariadores oficiais, podendo convidar até três pessoas mais. Ao fim de 75 pessoas angariadas, era prometido um prémio chorudo aos fiéis colaboradores.
O fim da linha começa quando a fonte de novos clientes começa a ser cada vez mais escassa, porque o trabalho operacional, quer efectivamente a trabalhar nos mercados, quer na venda de material de educação mais avançado, já não engana ou, pelo menos, é cada vez mais desconfiável.Isto, mesmo que ninguém negoceie efectivamente no mercado de capitais, só pelo facto de pertencer à rede e pagar a mensalidade. É aqui que soa o sinal de alerta, por ser comum a esquemas piramidais do passado. A rentabilidade é assegurada pelo crescimento da rede e não pelo sucesso ou insucesso dos produtos comercializados. Noutros esquemas, o problema agrava-se sempre quando deixam de entrar novos membros.

Os alertas das principais autoridades europeias foram aumentando, com Reino Unido, França e Bélgica como principais bombeiros no rápido apagão deste fogo. Portugal foi um pouco mais tímido, mas havia curiosidade por parte de pessoas interessadas em mercados financeiros e com vontade de entrar nesta área de forma séria, em se sentirem informadas sobre esta empresa, dando força a esta causa.
Este interesse em descobrir mais poderia ser feito com a lógica do velho ditado que circula desde sempre nos mercados financeiros: faça a sua própria pesquisa. Isto não se aplica apenas a corretoras, que são muitas vezes o foco deste furacão de burlas. Temos de aprender de alguma forma, com ajuda de alguém ou não, mas, se queremos ter acompanhamento, temos de saber aplicar o filtro.
Ao fim e ao cabo, a base da pirâmide alimenta o topo e, caso não se contribua com a entrada de novos elementos, o dinheiro voa num piscar de olhos.

Inteligência artificial não é absoluta
No ponto anterior referi que muitos dos esquemas nos mercados financeiros são ligados quase automaticamente às corretoras. Sem elas é impossível operar nos mercados, por isso, esta dependência da área para com as corretoras abre alternativas para ser possível criar mais um esquema. Mas, afinal, como geralmente este se manifesta?
Atenção, nem todos os robôs que vai encontrar nos mercados financeiros são criados para o enganar: se fizer uma breve pesquisa consegue encontrar robôs licenciados e que efectivamente o podem ajudar nas suas operações. O que fazem, na verdade, estes intervenientes dos mercados financeiros? Podemos defini-los como um programa de negociação que usa um algoritmo que detecta sinais técnicos para abrir e fechar posições.
Não vamos ser irrealistas e achar que os investidores são todos uns prodígios e que não precisam de auxílio para operar. Toda a ajuda digna é bem-vinda e estes robôs podem efectivamente ser um fantástico braço direito, mas esteja atento a alguns sinais de que deve desconfiar imediatamente.
A primeira grande acção a analisar tem como base o ditado de que os números não enganam. Se alguém lhe tentar aliciar com um robô supereficiente, que promete resultados e que lhe permite alcançar lucros irrealistas como, por exemplo, um retorno superior a 500% ao ano (sim, isto acontece!), desconfie com todas as suas forças.
Como referi, todas as fontes de ajuda que pode e até deve adquirir para o auxiliar nos mercados financeiros não são respostas absolutas a rigorosamente nada, porque estará sempre dependente da sua decisão e conhecimento. Fale com alguém da área com mais experiência caso tenha dúvidas e garanta sempre que opera com sistemas e mecanismos, sejam eles inteligência artificial ou não, certificados e com elevada informação partilhada com os potenciais utilizadores.

Manipulação do preço via corretoras não reguladas
Mais uma vez, é importantíssimo reforçar esta condição: pesquise muito bem sobre a corretora a que pretende recorrer e, acima de tudo, atenção ao spread e ao slip-
page. Como pode verificar estas condições e saber se estará a operar com uma corretora fidedigna? Aqui fica um pouco de contexto.
É muito comum encontrarmos em corretoras dos mercados financeiros, nas suas contas padrão, zero comissões – não há problema nisto, porque a lógica é recorrer ao spread para equilibrar as contas. O spread é um dos principais conceitos do dicionário de um investidor, representando a diferença entre o preço de compra e venda de um determinado activo.
Logicamente, activos que apresentam volumes de negociação enormes têm um spread mais controlado, ao passo que moedas emergentes geralmente têm spreads mais alargados. Esta lógica é perfeitamente identificável, facilitando igualmente quando está a ser quebrada – a manipulação do preço muitas vezes implica que aconteça ao contrário, com grandes activos a apresentarem spreads gigantescos para a realidade.
Usualmente, as corretoras que são confrontadas com este tipo de acontecimento tentam corroborar o nível de spread apresentado com a “parceria” que têm celebrada com o provedor de liquidez que as suporta para operar. Compare estes valores com outras corretoras e verá que a diferença é demasiado grande para ser verdade.

Um outro sinal de manipulação de preço que as corretoras podem manifestar é a questão do slippage que, em bom português, podemos traduzir para uma valente escorregadela. Basicamente, as taxas de compra e venda podem sofrer alterações no momento em que a negociação é aberta e posteriormente executada.
O slippage acaba por ser um risco conhecido que qualquer investidor tem a noção que pode correr e, apesar de não haver grandes acções a fazer para o evitar, é já um acontecimento presente e normal de acontecer. O problema é quando estas escorregadelas acontecem com uma frequência pouco comum, alavancando a vantagem para as corretoras.
Geralmente, o problema mais comum dos chamados brokers é o facto de não serem regulados, ficarem com o dinheiro do cliente e impedirem o levantamento do mesmo. Esta condição, juntando as possibilidades de actuar de forma parcial com Stop Loss e Slippage, acaba sempre por ser uma combinação destruidora.

Plataformas de investimento fraudulentas com falsos traders
Este problema acontece a partir do momento em que uma pessoa demonstra interesse num determinado website de investimentos, mas que é fraudulento, facultando o seu nome/número de telefone, passando a ser regularmente contactada por supostos traders, que dizem ter como função aconselhar sobre os melhores investimentos. Embora a abordagem seja frequentemente feita em inglês, têm sido relatados casos em que o contacto foi feito por alguém que falava português do Brasil. Normalmente, as sedes destas “empresas fantasma” são na Índia, e utilizam o sistema VOIP com o indicativo do Reino Unido para dar mais credibilidade na ligação que fazem às vítimas.
Num primeiro momento, o suposto trader recomenda um investimento pequeno e logo de seguida tenta convencer a vítima a investir mais na plataforma. E depois mais, e mais. Tive conhecimento de casos em que as vítimas esgotaram todas as suas poupanças pessoais e ainda recorreram ao crédito, para investir nestas plataformas.
As plataformas em causa são criminosas e têm como objectivo único defraudar quem as procura. Porém, logo que as vítimas pretendem recuperar o dinheiro investido ou os supostos lucros, tal não é possível: a plataforma deixa de estar disponível e os respectivos traders deixam de atender o telefone e de responder a mensagens, ou utilizam outras técnicas dilatórias da mesma natureza. Há casos em que as vítimas foram informadas de que, para proceder ao levantamento das quantias, tinham que fazer um pagamento antecipado. Neste caso, acabaram por ser defraudadas ainda nestes valores adicionais e acabaram por não ter acesso a qualquer valor.

A pesquisa evita tudo
Repetindo o que disse na abertura deste artigo: como profissional da área há mais de 15 anos, é parte da minha missão informar e alertar o máximo de pessoas para estas e outras burlas que acontecem nos mercados financeiros com elevada regularidade. É uma área altamente desafiante que merece que os potenciais profissionais lhe tomem o gosto, sem acontecimentos indesejáveis ao longo do processo de aprendizagem.
Não é só em grandes empresas que estes esquemas acontecem, porque há “artistas” a solo que o praticam de igual forma pelas redes sociais, difundindo a uma velocidade irreal a promessa de dinheiro fácil suportada em fotos de grandes carros e relógios de luxo. Basta uma pesquisa um pouco mais intensiva, com comparação das ofertas que há, para podermos ter uma visão mais clara sobre onde podemos ou não confiar o nosso dinheiro.
A conclusão a que chego, que acaba por ser aplicável a tudo na vida: é possível ter uma fonte de rendimento segura a partir do seu computador, sendo essa baseada em investimentos? Sem dúvida! A parte fundamental da receita é estar e ser bem informado, comprometer-se com o seu objectivo e aprender com os erros.
Tudo o que vem e aparece de forma tão fácil não é necessariamente de desconfiar de forma automática, mas claramente defendo que, quantas mais armas tivermos para nos prepararmos para um novo desafio, só teremos a ganhar. 

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