“Falta coesão no movimento associativo empresarial”, diz António Saraiva

Antes de tudo, António Saraiva é um “animal social” com inquietude cívica. E, isso, é visível não só na forma como conduziu os seus vários mandatos à frente da Confederação Empresarial de Portugal (CIP), como já tinha caracterizado a sua actuação enquanto líder da Associação dos Industriais Metalúrgicos. Naquela que é das últimas entrevistas à frente da CIP – onde foi presidente ao longo de 13 anos -, António Saraiva recebe a Executive Digest no seu gabinete no Parque das Indústrias, em Lisboa, com janela rasgada para o Tejo, com a vontade de partilha que o caracteriza. Fala da economia e das empresas, dos seus projectos passados e desejos futuros, da vida e da morte. Ele, a quem diagnosticaram um cancro de pâncreas em 2012, que passou por três intervenções cirúrgicas e vários internamentos, mas que só agora decidiu começar a “respirar”. Apesar dos últimos anos lhe terem permitido perceber que é «mortal!»

Ao fim de mais de uma década, diz sair de consciência tranquila e com sentido de dever cumprido. Mas com a pena de não ter conseguido, em Portugal, aquilo que existe, por exemplo, na vizinha Espanha: uma «coesão empresarial e de confederações», que permite trabalhar necessidades conjuntas e ser mais forte e coeso nas reivindicações! Aliás, se há crítica que o tecido empresarial português lhe merece é precisamente esse, a falta de união.Assim como não deixa de criticar o actual nível da Política e dos políticos em Portugal, o que fez com que nunca tivesse aceite qualquer dos desafios que lhe lançaram. No que toca a Política, aliás, António Saraiva passou por diferentes Governos, várias coligações e maiorias. Lidou com diferentes ministros e tratou os mais diferentes temas, tendo mesmo contratado à McKinsey o estudo “Imperativo de Crescimento”, em 2011, que agitou águas no panorama empresarial. «Tem todos os caminhos que devem ser feitos, as zonas geográficas que devemos olhar, as metodologias que  temos de alterar», sublinha. De todos os cenários que viveu, elege o primeiro Governo de Passos Coelho como o mais activo na defesa do mundo empresarial. Apesar de pouco ou nada se ter avançado, como lembra.

Na sua última carta à frente da CIP, afirmou que “infelizmente 2022 não foi o momento da viragem necessária”. Porque razões?
Era o momento ideal para transformar o nosso modelo de desenvolvimento, recuperar dinâmicas e gerar crescimento económico, aproveitando os fundos comunitários e um governo suportado numa maioria parlamentar. Em 2022, por um conjunto de casos e situações, não foi ainda o momento de viragem da transformação da nossa economia. Por isso, a minha chamada de atenção para o que foi de alguma maneira um ano perdido. Mas não posso deixar de reconhecer que as nossas exportações apesar de tudo tiveram um incremento significativo no ano passado. Mas há outros indicadores que poderíamos ter atingido e ainda não tivemos o início de um correcto aproveitamento dos fundos comunitários. 

Estando perto do final primeiro trimestre de 2023 há mais razões para estar optimista?
Até agora mantenho uma visão pouco optimista, sem que com isto esteja a dizer que estou pessimista. Mas este primeiro trimestre ainda não foi a inversão daquilo que se podia ter verificado. O Governo está envolvido num conjunto de situações que têm minado a capacidade do que a maioria parlamentar lhe poderia conceder para o início das reformas – a da administração pública, da Justiça e a fiscal. Não se sente esse ímpeto reformista. Depois, como sabemos, o PRR continua com atrasos significativos e é a própria Comissão Nacional de Acompanhamento a constatar o atraso significativo que a máquina administrativa está a ter na apreciação e na aprovação dos dossiês. De facto, este primeiro trimestre não traz sinais de alteração a esta diferente forma de estar e de fazer. 

Na sua opinião, o que falta ao Governo para fazer as tais reformas e as intervenções? Coragem?
Falta-lhe de facto um ímpeto reformista que não se pressente, porque aquilo que temos constatado é que o Governo tem estado mais envolvido em questões, numa lógica interna partidária e menos numa lógica reformista, de uma governação que se pretenderia mais efectiva.  

A Administração Pública é um dos pontos que critica porque tem vindo a ser sucessivamente adiada. Este tema é mais um “elefante branco” na nossa Economia?
No Governo de Pedro Passos Coelho, enquanto existiu, não se produziu nenhum passo nesse sentido. Este Governo, nas duas encarnações que já leva, não deu qualquer sinal dessa reforma. E a reforma da administração pública não é, como às vezes os críticos deste pedido de reforma da administração querem fazer, para despedir funcionários públicos. Não temos avaliação suficiente para saber se temos funcionários públicos a mais ou a menos (em números redondos são cerca de 800 mil). O que dizemos é que hoje estamos num tempo digital, com as três grandes áreas que o PRR definiu: resiliência, transição climática e transição digital. Estando numa era digital porque é que a administração pública não é dotada dessa performance e dessa melhoria que actualmente as ferramentas digitais permitem? A burocracia continua  a ser esmagadora no mau funcionamento das actividades económicas e dos cidadãos. 

Considera que a execução do PRR é decepcionante?
Temos duas visões em relação à eficácia e ao ritmo do PRR. A do Governo, que mostra alguma tranquilidade na execução, dizendo que cumpriremos as metas que estão definidas (o PRR deve terminar em 2026). Já não temos tanto tempo assim, com a interrupção das cadeias de abastecimento, que se produziram com os efeitos da guerra e do Covid, e com o aumento das matérias-primas. Com a imprivisibilidade que os agentes económicos têm actualmente, os investimentos e a vontade de concretização de projectos foram um pouco refreadas. Isto leva a alguma letargia de todo este ecossistema em relação ao cumprimento do PRR. E por isso é que eu digo que temos duas perspectivas: a do Governo que diz que aparentemente vamos cumprir e que está tudo bem, mas depois a própria Comissão Nacional de Acompanhamento vem chamar a atenção para situações críticas de atrasos que se estão a verificar. A percepção empresarial que vos transmito é que de facto estamos com atrasos significativos na aprovação dos projectos e as condicionantes externas já nos condicionam. A somar a este atraso da avaliação da máquina pública aos projectos apresentados, faz-me recear algum efeito perverso no cumprimento destes prazos. 

Porque é que ainda não conseguimos atingir os níveis de competitividade da União Europeia? O que faltou e falta aos empresários nacionais?
Quando se fala de competitividade vem inevitalmente a produtividade, a qualidade da gestão, a postura dos trabalhadores. A competitividade “lato sensu” é resultante de um conjunto de factores externos e internos. Temos uma carga fiscal que nos penaliza quando comparados com outros estados europeus – e hoje a competitividade entre nações é o que determina a localização de investimentos. Por isso, o Estado tem de atender a estes factores: diminuindo a carga fiscal, cumprindo a reforma do IRC, eliminado eventualmente uma das derramas. Depois, o funcionamento da justiça económica, a qualificação e requalificação dos nossos colaboradores. E quando digo dos nossos colaboradores não excluo também a dos nossos empresários, ou seja, a qualidade da Gestão. Temos de ter ganhos significativos da qualidade das competências de todo este núcleo empresarial porque há uma necessidade de adaptação a estas novas realidades. Estamos num tempo de novos materiais, novos modelos, processos automatizados, robótica, transição digital e desafios climáticos que nos obrigam a cumprimentos de regras de sustentabilidade.  Há aqui todo um mundo em que as empresas e a economia têm de desenvolver novas metodologias, responder de uma forma diferente, entregar aos seus stakeholders uma forma adaptada ao que hoje é a realidade dos tempos. A competitividade acaba por ser uma resultante da melhoria de todos estes factores. O que falta é agir sobre eles. Que o Estado faça aquilo que só ao Estado compete. E aos empresários aquilo que é a melhoria das suas empresas, em termos de equipamentos, tecnologias, processos industriais, processos de administração, qualificação e requalificação dos recursos humanos. Há toda uma realidade que tem de ser trabalhada e quanto mais rápido o fizermos mais cedo chegaremos a um nível de competitividade que nos faça comparar melhor com outros Estados.

O que está a dizer é que os empresários portugueses não estão alinhados com o top europeu no que toca à competitividade e ao desempenho?
Não. Estou a dizer que de um modo geral o País tem algum atraso nisso.  Temos empresas excelentes e quando se fala nelas temos que perceber no que estamos a falar. Em Portugal 97% são micro e pequenas empresas. Existem excelentes exemplos e que eu conheço de Norte a Sul do País. Empresas que são líderes no que produzem ou nos serviços que prestam. Já temos algumas perfeitamente robotizadas, automatizadas e com métodos de gestão excelentes que nos orgulham. Algumas delas comparam muito bem com os seus congéneres europeus.

Então o que nos falta para darmos o salto e afirmarmo-nos a nível mundial?
Portugal, feitas as reformas estruturais de que vos falei (Administração Pública, Fiscal e Justiça) tem cumprido três grandes objectivos: dimensão, inovação e internacionalização. Somos compostos por uma maioria de pequenas empresas, temos de promover fusões e concentrações e os nossos empresários têm de se encontrar num caminho de aumento de escala, por metodologias próprias, de parcerias que se constituem, de trocas de capitais e incentivados pelo Estado. Há um conjunto de condições que se devem associar para que a dimensão empresarial tenha maior robustez e tenhamos mais escala para juntamente com o segundo objectivo, o de inovação, ter valor acrescentado e diferenciado nos nossos produtos. Cumpridos estes dois, escala e inovação, mais facilmente atingiremos a internacionalização. Felizmente, Portugal atingiu 50% no rácio PIB/Volume de exportações rapidamente mas temos que chegar a 70%. Só que isso não é com o estalar dos dedos. É com esforço e cumprindo mais eficazmente os dois objectivos anteriores, escala e inovação. 

Sentiu que muitas vezes esteve quase a lutar contra Moínhos de Vento?
Desde que fui eleito, em 2010, instituí que a CIP tinha de antecipar e participar a génese das nossas actividades. E antecipar é promover todos os estudos que já fizemos. Em 2011 fiz com a McKinsey um estudo chamado “O Imperativo do Crescimento”, que apesar de estar datado está perfeitamente válido. E tem todos os caminhos que devem ser feitos, as zonas geográficas que devemos olhar, as metodologias que  temos de alterar. Já nessa altura o “Imperativo do Crescimento” era um objectivo primordial e necessário para Portugal. Em 2023, é fundamental para o País. O futuro do trabalho, as profissões que vão desaparecer e aparecer, a natalidade e os seus efeitos, a conciliação trabalho e família, o Brexit. A CIP tem antecipado através dos seus estudos um conjunto de reflexões e tem participado na concretização dos mesmos no seu papel na concertação social, nas interacções com os vários ministros com que nos relacionamos e no conjunto de propostas que vamos entregando aos sucessivos governos. A CIP é a casa mãe de todas as Associações sectoriais e regionais e, por isso, através dos nossos associados chegamos às 180 mil empresas que representamos por esta via. Antecipar problemas, detectar soluções e contribuir com as propostas que temos apresentado e iniciativas que temos desenvolvido. A CIP antecipa e participa.

Esteve em funções no período da troika, da falência de vários bancos, da governação com a geringonça, da pandemia da Covid-19 e da guerra na Ucrânia. Qual foi o período mais difícil durante ao longo destes 12 anos?
Cada uma das crises em que estive envolvido enquanto Presidente da CIP teve obviamente dimensões diferentes e efeitos diversos. A primeira, das dívidas soberanas, do resgate e da entrada da troika, com tudo aquilo que envolveu.
Depois, caímos na Covid 19 e dos três períodos (junto a guerra), a pandemia foi aquela que mais apreensão me provocou. Foi imprivisivel, completamente disruptiva e era desconhecido o tempo que podia demorar. Já a guerra traz os efeitos brutais dos aumentos dos custos, a pressão dos juros, a inflacção daí decorrente. Mas as empresas levaram às suas margens muito do amortecimento destes efeitos.

Como analisa o mercado de trabalho em Portugal, atendendo à taxa de desemprego, falta de mão de obra, saída de quadros para outros países e a não retenção dos jovens em Portugal?
A falta de mão-de-obra reside no nosso problema de natalidade e os seus efeitos que se começam a sentir. Portugal está a tornar-se mais envelhecido, com poucos nascimentos e, perante as estatísticas que nos apresentam, caminhamos para os oito milhões. Temos perto de cinco milhões de pessoas no mercado de trabalho, três milhões e 300 mil de reformados e pensionistas e uma pirâmide da Segurança Social que tem de ser devidamente apreciada. O problema da natalidade tem de ser enfrentado e resolvido, mas mesmo que a população portuguesa começasse a gerar crianças, os efeitos para o mercado de trabalho só se sentiriam daqui a duas décadas no mínimo. Como é que isso se minora? com políticas de captação de imigração económica bem definidas, atractividade, condições dignas de inserção no mercado de trabalho e na sociedade portuguesa. Um dos aspectos que os empresários referem como dificuldade para o desenvolvimento das suas actividades é a falta de mão-de-obra quer qualificada ou indiferenciada. 

A acrescer os nossos recém-licenciados não querem ficar, como óbvio…
Temos de desenvolver metodologias para que os nossos jovens licenciados encontrem soluções, modo de vida, em resultado daquilo que foi a sua formação académica no País. Mas nós estamos no espaço europeu de livre circulação de pessoas e bens, e também estamos a captar talentos de outros países. As nossas Universidades estão num ranking bem posicionado a nível mundial. Precisamos é de tornar o nosso País mais competitivo e atractivo. E não se culpem as empresas, porque isso está associado a salários e ao poder de compra. Os jovens de hoje querem desafios, novas experiências e estarão na empresa durante um tempo finito. Querem estas experiências em Portugal, Europa ou no mundo. Há um ecossistema que tem de ser transformado para que os nossos jovens encontrem soluções no nosso País. 

Após 13 anos à frente da CIP, que legado quer deixar? E o que tem pena de não ter conseguido fazer?
Tenho pena de não ter conseguido uma maior coesão do movimento associativo empresarial. O movimento associativo, quer o empresarial quer o sindical, tem que ser melhorado. A proposta de valor que estamos a entregar aos nossos associados tem que ser adaptada ao tempo actual e temos muitas falhas. O movimento associativo tem que olhar para si próprio e perceber as fragilidades e ameaças de hoje, até porque as próprias empresas têm necessidades diversas das que tinham há 13 anos. Por isso, as organizações, associações, confederações empresariais, têm que entregar uma proposta de valor adaptada a essas novas necessidades. O que fiz ao longo destes 13 anos foi ir adaptando tanto quanto possível a proposta de valor da CIP a essas permanentes necessidades. Hoje, tenho a noção de dever cumprido. Lamentavelmente nunca consegui fazer aquilo por que sempre lutei e que está em todos os meus programas de candidatura, que é a coesão do movimento associativo. Temos um excesso de associações empresariais, sectoriais e regionais. Devíamos ter um menor número. A fusão e concentração que defendo que se tem que fazer empresarialmente, também defendo que se deve fazer no movimento associativo.
Temos que ter menos associações e confederações, mas mais fortes, mais robustas!

Consegui juntar o Conselho Nacional das Confederações Patronais, que foi o primeiro passo nestes entendimentos comuns para propostas que são comuns. Mas Espanha, aqui ao lado, tem uma confederação – a COE – forte, coesa, que representa todos os sectores de actividade e não há governo espanhol que não receie a força da COE. Em Portugal, dignas desse nome temos cinco.
Deixo este cargo com pena de não ter conseguido que os meus colegas percebessem esta necessidade e colaborassem nesse objectivo. Fica por fazer a fusão, a concentração, do movimento associativo empresarial. Aliás, pelo contrário, assisto ao aparecimento de novas realidades, de nova proliferação desse mesmo movimento associativo, tal como está a acontecer no movimento sindical.
Parto com a paixão que tenho a esta causa do movimento associativo, onde estou desde os meus 20 anos. Comecei no serviço militar para onde entrei em Abril de 1974 – três dias antes do 25 de Abril…

… continuou na Lisnave!
Continuei na Lisnave, estive à frente da Associação dos Industriais Metalúrgicos e fui vice-presidente da CIP nessa condição. Porque esta inquietude cívica que me caracteriza tem-me impelido para estas missões.
Parto por iniciativa própria, até porque defendo que devemos sair quando os outros querem que fiquemos. Já não quis fazer este mandato que agora termino, mas fi-lo com a mesma paixão dos anteriores.
Desde que a CIP nasceu, em 74, sempre teve o homem certo no momento certo. Assim foi nos meus antecessores, no meu tempo, e assim será com o meu sucessor.
É tempo de voltar a estar mais concentrado nas minhas actividades profissionais, na minha família!

Essa inquietude cívica que diz ter vai levá-lo a fazer o quê?
Vou retomar as minhas actividades empresariais. Sou chairman do TagusPark e da SPAL, pelo que continuarei mais dedicado.
Já hoje participo em associações da sociedade civil para think tanks de reflexão de propostas de cidadania, por esta inquietude e cidadania participativa que defendo.
Gosto muito da expressão que diz que os lugares mais quentes do Inferno estão reservados para aqueles que se mantêm neutros em momentos decisivos. Eu não quero esses lugares.

Teve medo da morte, quando lhe diagnosticaram o cancro?
Tive. Amo a vida, amo pessoas, sou um animal social, gosto muito de conhecer novas formas de pensar até porque cada um de nós é um mundo de experiências e, por isso, não posso deixar de ter medo da morte. Em 2012, tive um episódio que quase me tirou a vida. Hoje, não tenho o receio de que posso morrer amanhã, mas ganhei a noção de que sou mortal. Eu era imortal e esse episódio de saúde deu-me a consciência de que sou mortal, o que fez toda a diferença. 

Mas não refreou!
Não refreei. Só inicialmente. 

Esta tarde [dia em que decorreu a entrevista] vai reunir com o Primeiro-Ministro, António Costa. Vai sentir falta deste tipo de encontros e trabalho?
Não consigo antecipar se vou ter saudades deste frenesim, mas estou um pouco cansado do mesmo, de ter perdido a minha intimidade, de estar permanentemente debaixo de holofotes. Já registo algum cansaço dessa exposição mediática. 

… e ambições políticas?
Modéstia à parte, penso que tenho condições para ser um bom político. Mas sou um espírito muito livre para me obrigar a regras de um ambiente político generalizado onde tenho percepcionado muita falta de qualidade. A degradação da qualidade politica nos últimos 20 anos, o Princípio de Peter que está instalado, aliado ao espírito livre que quero ver se não perco, leva-me a sentir que quero ser como sou.

Já foi desafiado!
Sim, nas últimas eleições autárquicas, para três câmaras.
Sou uma pessoa de Centro. Acredito que se não tivesse existido, na mesma altura, duas personalidades fortes como Sá Carneiro e Mário Soares, teríamos hoje um partido único nessa ala política. 

É um liberal?
Com uma carga social muito grande. Sou um liberal com uma responsabilidade social muito forte.

O que o levou a não aceitar esses desafios políticos?
Estava presidente da CIP e queria honrar o compromisso com os meus associados. Além disso, um presidente de Câmara não deixa de ser um cargo político, com balizas.
A política nacional – que não contesto – tem vindo a degradar. Defendo que devíamos reformular a Lei Eleitoral, mas ninguém quer. Há vacas sagradas em Portugal e a revisão da Constituição é uma delas.
Os partidos políticos não se têm adaptado à realidade dos tempos e deixaram de saber representar a necessidade das populações. Isto tem que ser revisto.
Ando nisto há 49 anos, lidando com vários interlocutores, várias maiorias… o que me deu um grande conhecimento destas máquinas políticas!

Qual foi o Governo que, a seu ver, teve o melhor plano para o desenvolvimento do tecido empresarial português?
O primeiro Governo de Pedro Passos Coelho. Teve condições difíceis, mas foi talvez o que deu um maior impulso. A Troika quis fazer uma enorme asneira com a TSU – reduzir a das empresas e aumentar a dos trabalhadores -, que conseguimos travar, mas em termos reformistas foi o tempo em que se sentiu maior dinâmica.   
Adoro a Política, mas com a idade que tenho e perspectiva de vida útil… sou muito pragmático e quando fecho um compartimento, fecho! Este, fica fechado. 

Quando tomou a decisão, de ficar por aqui na CIP? Porque já não era suposto ter-se candidatado a este mandato, mas fê-lo…
Entre 2012 e 2015 passei uma fase difícil entre operações e internamentos. Tomei a decisão de não fazer este mandato a meio do anterior. Mas insistiram comigo, de várias frentes…
Nunca quis ser presidente da CIP. Quando em 2009 me começaram a desafiar, disse que não durante meses. Só que a certa altura cheguei a um ponto em que já tinha 85% dos votos possíveis e então achei que não devia defraudar a confiança que me estavam a dar. 

E não se arrepende!
De nada. Aliás, estou muito grato. Estou grato a duas oportunidades que a vida me deu: liderar a comissão de trabalhadores da Lisnave, que me caiu nos braços; e a presidência da CIP e o crescimento que me deu. Estas duas dimensões contribuíram para o ser humano que sou hoje, foram duas experiências muito ricas
e gratificantes.

Já a Engenharia, que começou no Técnico, ficou pelo caminho…
Eu não sou engenheiro, sou mais engenhocas. Sou da área Social, do Direito, da Sociologia… Entrei para o Técnico com um colega que acabou, ele sim, o curso e foi quem eu fui contratar para ser o director fabril da minha fábrica. Ele é Engenheiro, eu nunca fui! 

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