“Multibanco só acima de 5 euros”… é legal?

Deslocou-se ao supermercado naquela fatídica sexta-feira à pressa para comprar uma garrafa de vinho para o jantar com os amigos, para o qual já estava largamente atrasado. Não teve tempo de levantar dinheiro, dirige-se à caixa, apresenta o seu cartão e eis que lhe dizem a famosa frase “Não aceitamos pagamentos com Multibanco abaixo de 5€”. Mas porquê? E é um procedimento legal? É o que vai descobrir neste artigo.

Pagamentos com multibanco: os argumentos são simples…

Já se deve ter perguntado várias vezes porque é que a maior parte dos estabelecimentos comerciais não aceita pagamentos com multibanco abaixo de um limite mínimo de 5 euros. É fácil de explicar.

Para além dos custos que todos os comerciantes têm com os Terminais de Pagamento Automáticos (as máquinas através das quais utiliza o seu cartão para pagar nos diversos estabelecimentos), os quais veremos mais em detalhe ao longo do artigo, a verdade é que o custo percentual de utilização do cartão abaixo de um certo montante é muito elevado para o comerciante.

Por cada transação que é efetuada, existe sempre uma taxa fixa e um limite mínimo, em euros, que é aplicado sobre o valor da compra e que o comerciante paga ao banco. Por exemplo, se esses custos forem fixados em 0,90% e um mínimo de 0,06 euros, como é habitual, e se um consumidor comprar algo por 3,33 euros, o custo dessa transação, como tem um mínimo de 0,06 euros, já ultrapassa os 0,90%, chegando a 1,8%. E quem perde com isto é o comerciante.

Na realidade, os 0,90% sobre a transação só se aplicam se a compra for superior a 6,66 euros, caso contrário, se a compra for abaixo deste valor, o custo para o comerciante vai ser proporcionalmente superior. Isto acontece precisamente por causa do limite mínimo.

Vejamos então quanto despendem os comerciantes por disponibilizarem pagamentos com Multibanco aos clientes.

Quais são os encargos de um TPA para o comerciante?

Um comerciante que aceite este modo de pagamento no seu estabelecimento incorre em dois tipos de gastos: por um lado, pela requisição e manutenção do equipamento do TPA e, por outro lado, pela realização das transações por parte dos clientes.

De cada vez que um consumidor paga as suas compras/serviços com o cartão, o comerciante possui um custo associado a essa transação: é a chamada Taxa de Serviço do Comerciante (TSC), que varia conforme o cliente decida pagar a crédito ou a débito e consoante a marca de cada função, traduzindo-se numa percentagem aplicada sobre o valor da venda.

Mas nem tudo são desvantagens…

Tomando como exemplo o caso do senhor Armindo, dono de um restaurante situado num bairro problemático onde até costuma haver muitos assaltos, este proprietário dispõe de um TPA que permite receber os pagamentos dos clientes em segurança sem preocupações com trocos na caixa.

Além disso, se houver um freguês que deseje pagar o jantar a crédito, o senhor Armindo também não corre o risco de ter créditos de cobrança duvidosa e ser enganado com fraudes. Ademais, poupa tempo nas infindáveis deslocações ao banco para efetuar depósitos, dado que o dinheiro entra diretamente na sua conta.

Os estabelecimentos com TPA também costumam ser mais atrativos para os clientes nos dias de hoje, uma vez que acabam por ter maior flexibilidade. É benéfico para o cliente e igualmente para o proprietário – o único senão é não ser isento de custos.

Em Portugal, existe apenas uma rede física de TPA, que é a Multibanco, existindo redes comerciais que operam a partir desta: é o caso da American Express, Redunicre e Multibanco comercial. Existem ainda duas entidades que asseguram o funcionamento eficiente do mercado de cartões bancários para além dos próprios bancos: a UNICRE, que detém uma rede comercial de TPA (chamada Redunicre), que emite cartões, e a SIBS, responsável pelas caixas automáticas (ATM) e pelos TPA Multibanco.

Quanto despende o comerciante?

Para os seus clientes poderem efetuar pagamentos com Multibanco, o senhor Armindo tem uma série de custos associados não apenas a cada transação, como ao equipamento em si.

Para se ter uma noção efetiva destes valores no mercado, na tabela abaixo encontram-se os custos principais associados ao aluguer de TPA móveis simples de onze das principais instituições bancárias a operar em Portugal, bem como os valores da Unicre para adesão às redes VISA e MasterCard, considerando um negócio que fatura até 50 mil euros/ano e cujos pagamentos dos clientes são efetuados com cartões particulares.

Instalação Tarifa Mensal Desinstalação Outros Custos
Millennium bcp
TPA Simples – Móvel
Isento 32€ 200€ nos primeiros 24 meses; 120€ após 24 meses Excedente de faturação mensal: 15€
Substituição: 25€
Novo Banco
Serviço de Pagamento Automático – Móvel
Isento 29,95€ 150€ há menos de 12 meses; 75€ há mais de 12 meses Excedente de faturação mensal: 0,90% por transação
Substituição: 25€
CGD
TPA Físico Netcaixa – Móvel
Isento 20€ Não referido Não referido
EuroBic
TPA Móvel GPRS
Isento 30€ Devolução de equipamento deteriorado: 200€ Não referido
Crédito Agrícola
TPA Móvel
25€ 25€ Rescisão de contrato: 400€ Não referido
Banco Popular
TPA Móvel GPRS
35€ 28€ 200€ Comissão por baixa utilização: 7,50€
Montepio
TPA Móvel
Isento 22,50€ 150€ nos primeiros 12 meses; 75€ a partir do 13º mês Não referido
BPI
TPA Móvel (GSM/GPRS)
Isento 20€ 45€ antes do fim do período de permanência mínimo Não referido
Deutsche Bank
TPA GPRS
Não referido 30€ 85€ Não referido
Santander
Tarifa Plana TPA Móvel GPRS
Não referido 40,75€ 210€ Excedente de faturação mensal: 0,90% por transação
Bankinter
TPA Móvel Propriedade do Banco
Não referido 29,95€ 148€ Não referido
UNICRE
Transações presenciais com cartões emitidos em Portugal
Taxa de adesão: 29,90€ N/A N/A N/A
  • Nota: Aos valores apresentados acresce IVA até 23%.

Através dos valores apresentados é possível aferir que, embora alguns dos TPA estejam isentos de custos de instalação, existe sempre uma mensalidade associada. Mesmo as tarifas mensais mais acessíveis, como é o caso das da CGD e do BPI, implicam 240 euros anuais. Já para não falar dos custos associados a excedentes de faturação mensal e à rescisão.

Existem ainda os custos com transações

De cada vez que um cliente paga com um cartão de débito ou de crédito num estabelecimento, o comerciante tem de pagar uma taxa ao banco ao qual adquiriu o TPA ou à UNICRE.

Alguns bancos conseguem ter acordos com a VISA e a MasterCard e, por isso, disponibilizam uma taxa para pagamentos através destas duas redes. Os comerciantes cujo banco não possua este acordo têm de realizar um contrato tanto com o seu banco, para adquirirem o TPA e o acesso à rede Multibanco, como com a UNICRE, para poderem ter acesso a pagamentos com cartão Visa e MasterCard.

Os valores dessas comissões – traduzidos na Taxa de Serviço do Comerciante (TSC) – tal como se pode verificar na tabela abaixo, variam consoante o pagamento com o cartão se realize através da rede Multibanco, da VISA ou da MasterCard.

TSC Multibanco TSC VISA TSC MasterCard
Millennium bcp
TPA Simples – Móvel
0,9% com mínimo de 0,06€ e máximo de 1,50€ N/A N/A
Novo Banco
Serviço de Pagamento Automático – Móvel
Débito: 0,90% a 1,50% com mínimo de 0,06€ N/A N/A
CGD
TPA Físico Netcaixa – Móvel
0,75% Débito: 0,75%
Crédito: 1,30%
Débito: 1,55%
Crédito: 1,30%
EuroBic
TPA Móvel GPRS
1,50% com mínimo de 0,05€ Débito: 2,35% com mínimo de 0,15€
Crédito: 2,95% com mínimo de 0,15€
Débito: 2,35% com mínimo de 0,15€
Crédito: 2,95% com mínimo de 0,15€
Crédito Agrícola
TPA Móvel
1,25% Débito: 1,40%
Crédito: 2,50%
Débito: 1,40%
Crédito: 2,50%
Banco Popular
TPA Móvel GPRS
1,10% com mínimo de 0,08€ N/A N/A
Montepio
TPA Móvel
0,90% com mínimo de 0,05€ e máximo de 1,50€ N/A N/A
BPI
TPA Móvel (GSM/GPRS)
0,90% com mínimo de 0,05€ N/A N/A
Deutsche Bank
TPA GPRS
0,90% com mínimo de 0,06€ e máximo de 1,10€ N/A N/A
Santander
Tarifa Plana TPA Móvel GPRS
1,15% com mínimo de 0,08€ N/A N/A
Bankinter
TPA Móvel Propriedade do Banco
0,90% com mínimo de 0,06€ N/A N/A
UNICRE
Transações presenciais com cartões emitidos em Portugal
N/A Crédito: 1,45%
Débito: 0,90%
Crédito: 1,45%
Débito: 0,90%
  • Nota: Aos valores apresentados acresce Imposto do Selo a 4%.
NOTA: aos valores apresentados acresce imposto do selo a 4%.

Se o senhor Armindo receber uma família de 5 pessoas no restaurante, cujo almoço fica a 60 euros, e essa família pagar com cartão, a débito e com Multibanco, estamos a falar de uma taxa de 0,90% (que dá 0,54 euros) que o dono do restaurante financia ao banco. Ao final de um ano, com um volume de faturação de 50 mil euros, já são 450 euros que o senhor Manuel paga por esta taxa ao banco, só pelos pagamentos com Multibanco, que até são os que possuem valores mais baixos.

Se o pagamento for a crédito com VISA ou MasterCard, assumindo uma taxa de 1,40%, para uma refeição de 60 euros são 0,84 euros para o banco, enquanto que, se for a crédito, o valor eleva-se ainda mais para 2,50%, o que já dá 1,50 euros por este pagamento. Imaginemos que metade da faturação anual do restaurante teria sido gerada com pagamentos com VISA crédito: trata-se de 625 euros ao fim de um ano.

Se o senhor Armindo fizesse um apelo aos clientes para fazerem pagamentos com Multibanco em vez de VISA ou MasterCard, já estaria a poupar consideravelmente no valor das taxas que tem de dar ao banco. Por todas estas razões é que muitos estabelecimentos não aceitam pagamentos com Multibanco inferiores a 5 euros e muitos também não permitem com cartão de crédito.

Mas afinal, este é ou não é um procedimento legal? Segundo a Autoridade de Segurança Alimentar e Económica (ASAE), “desde que se encontre publicitado no estabelecimento, de forma clara, objetiva e adequada que não aceitam pagamentos por Multibanco ou que só aceitam esta forma de pagamento quando estão em causa determinados valores, não existe qualquer ofensa aos direitos dos consumidores.”

Executive Digest com Comparajá.pt

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