Como a PlayVS está a transformar gamers em talentos tecnológicos

Ao levar os desportos electrónicos para as escolas secundárias, Delane Parnell, fundador da PlayVS, está a criar bases para o recrutamento de talentos tecnológicos.

Por J.J. McCorvey, colaborador da Fast Company

Com um par de Jordan 11 pretos que parecem acabadinhos de sair da caixa e um chapéu de basebol, Delane Parnell responde a perguntas do público na sua TechCrunch Disrupt, a reunião anual em São Francisco que se tornou uma espécie de influenciadora de startups. Partilha o palco com Jason Citron, fundador e CEO da Discord, aplicação de mensagens para jogadores de videojogos com mais de 150 milhões de utilizadores e que – após uma ronda de investimento de 45 milhões de euros em Abril – está avaliada em 1,45 mil milhões de euros. A PlayVS (lê-se “play versus”) de Parnell, plataforma de desporto electrónico para escolas secundárias, angariou apenas 13,7 milhões – e ainda não foi lançada. Mas o jovem de 26 anos, nativo de Detroit, irradia confiança.

«Os investidores estão a perceber que os jogos são o próximo paradigma social», explica Parnell. «E querem fazer parte disso.» Não é preciso ir muito longe para se encontrarem provas da influência dos jogadores de videojogos. O YouTube e o Twich estão cheios de vídeos “como fazer” e sessões de stream ao vivo de FIFA19. Um ecossistema sólido de torneios de desportos electrónicos está também em ascensão, com editores de jogos, empresas de entretenimento, faculdades e universidades a criarem ligas e eventos para jogadores. Os maiores torneios, para títulos como Dota 2 e Call of Duty, enchem estádios e movimentam milhões de euros. Segundo a empresa de estudos NewZoo, as receitas dos meios relacionados com desportos electrónicos, patrocínios, merchandising, bilhetes e honorários deve quase duplicar quando comparado com 2014, atingindo os mil milhões de euros este ano. A Goldman Sachs calcula que a visualização de desportos electrónicos chegue aos 300 milhões de pessoas em 2022, colocando-a ao nível da NFL.

Embora as organizações estejam a virar-se para os desportos electrónicos, permanece uma lacuna: os torneios nas escolas secundárias são com videojogos. Parnell está a colmatar a lacuna com a PlayVS, que deixa as escolas criarem ligas e torneios virtuais ou ao vivo. Embora esteja a entrar num sector cheio de tubarões como a Amazon e a Discord, Parnell tem uma vantagem. Em Janeiro, a PlayVS assinou uma parceria de cinco anos com a National Federation of State High School Associations (a associação nacional de escolas secundárias estatais), a organização que supervisiona desportos e actividades em quase 19 500 escolas secundárias públicas e privadas em todo o país. A primeira temporada do torneio da PlayVS, para o League of Legends, começou em Outubro. «Não me interessa se jogam no telemóvel, numa consola ou através de um serviço na cloud», afirma Parnell. «Qualquer jogo no secundário, mesmo que seja o do galo, passará por nós.»

Se Parnell tiver sucesso, poderá controlar um canal que pode chegar às crescentes ligas profissionais. A NBA precisou de duas décadas para recrutar jogadores do secundário, mas as ligas de desporto electrónico estão a aproveitar o talento jovem. Tendo em conta que todos os investimentos e as startups que invadem o desporto electrónico, Parnell pode criar outro canal, também valioso e que faz com que alunos do secundário transformem o seu interesse por jogos em empregos lucrativos na área tecnológica. Tudo o que tem a fazer é convencer as escolas de que os desportos electrónicos devem ser levados tão a sério como o futebol.

 

Num mundo de tecnologias de consumo dominado por gigantes, o desporto electrónico (por agora) é uma terra de oportunidades: um local onde alguém com rapidez e um conjunto de competências pode, ainda, colocar uma bandeira. Ao crescer, Parnell abraçou os videojogos como uma distracção. Foi criado por um amigo da família no complicado Jeffries Projects de Detroit até a mãe conseguir mudar-se com ele para uma zona melhor. Pouco depois, chegou a casa e deparou-se com uma rusga do FBI que fez com que o seu padrasto fosse para a prisão vários anos. «Creio que a minha infância estimulou o meu alvoroço», comenta. «Os empreendedores gostam de fazer piadas sobre comer ramen. Eu hoje não como ramen – nem quero comer mais.»

Como empregado de uma loja de telemóveis no secundário, aumentou o negócio ao oferecer capas e toques a colegas de turma. Quando atingiu os 16 anos, já era proprietário de uma parte da loja e de outras. A jogada seguinte de Parnell foi criar uma cadeia de aluguer de automóveis com um amigo que tinha uma loja de bate-chapas. Tentou ir para a faculdade, odiou, e virou-se para as tecnologias. Lançou uma série de eventos para startups e, mais tarde, aceitou um emprego na fornecedora de internet Rocket Fiber.

O interesse de Parnell por desportos electrónicos aumentou quando os organizadores dos torneios começaram a pedir ajuda à Rocket Fiber para terem ligações mais rápidas. Em 2015, criou a sua equipa profissional de Call of Duty. Vendeu a equipa um ano mais tarde e começou à procura do próximo empreendimento. Foi aí que, numa festa durante o seu primeiro South by Southwest, Parnell conheceu o investidor Peter Pham. «Ao fim de poucos minutos, tornou-se claro que Parnell compreendia o que se passava nos desportos electrónicos», afirma Pham, cuja incubadora Science, de Santa Monica, Califórnia, apoiou projectos como Shave Club e DogVacay. Pham incitou Parnell a focar-se no mercado das escolas secundárias e convidou-o a mudar-se para Santa Monica e trabalhar com a Science. Hoje, a PlayVS está a preparar-se para a primeira época. Foi a única vez em 100 anos de existência da NFHS que passou a operação de um desporto para outra organização. Além de receber honorários de cerca de 56 euros por aluno, por época, a PlayVS tem o direito de operar todas as competições de desporto electrónico online e no mundo real e juntar-se a editoras de jogos para levar os seus títulos a escolas secundárias. Para tranquilizar os professores, Delane Parnell está a escolher cuidadosamente os seus primeiros títulos. O League of Legends, por exemplo, é um jogo multijogadores que encoraja o trabalho de equipa e a estratégia.

Alguns críticos duvidam da ideia de desportos electrónicos apoiados por escolas. «Não devíamos trazer o jogo para as secundárias, porque sabemos não ser benéfico para os jovens», afirma Hilarie Cash, co-fundadora e chief clinical officer da clinica Restart Life, fora de Seattle, que trata o vício dos videojogos e de outras tecnologias digitais. Mas Mark Koski, CEO da NFHS Network, a plataforma de vídeo da organização, vê o desporto electrónico como forma de abranger adolescentes desfavorecidos: «Queremos que os alunos que não estão nas actividades desportivas se envolvam na comunidade escolar.»

Parnell tem uma visão mais abrangente. «É o desporto mais acessível, barato e inclusivo a nível secundário.» «Se crescermos, o sector dos desportos electrónicos cresce.» O seu objectivo é desenvolver o mesmo tipo de infra-estruturas de recrutamento e bolsas que existe noutros desportos. Ele vê a PlayVS como oportunidade de desenvolver atletas e de ajudar pais e professores a «compreenderem que existe uma via para uma carreira».

Em jogo não estão apenas a fama e o dinheiro. Com algumas das maiores marcas a financiar, patrocinadoras e olheiras, o desporto electrónico pode fazer com que os mais jovens se interessem carreiras nos jogos e tecnologia. Lester Chen, jogador profissional, é agora global head de Parcerias nos Jogos do YouTube. O site de empregos na área do desporto Hitmarker abriu quase 2500 vagas em 2018. Os jogos podem ajudar «os alunos a pensarem de forma mais crítica, de uma perspectiva de engenharia ou design», revela Len Annetta, professor na Universidade de East Carolina.

Parnell sabe bem como uma carreira futura se pode apresentar de formas pouco convencionais. Por agora, parece que as escolas que mais precisam dessas portas abertas terão de esperar. A plataforma PlayVS exige equipamentos que podem ser proibitivamente caros. Parnell reconhece que algumas escolas foram colocadas de lado por não conseguirem a tecnologia.

O plano, explica Parnell, é fazer com que os editores de videojogos e outras marcas se juntem para ajudarem a renovar os laboratórios de computador e cobrir os custos de participação.

Este artigo foi publicado na edição de Fevereiro de 2019 da Executive Digest.

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