João Leão assumiu a pasta das Finanças há um ano. Mandato marcado por uma pandemia, uma crise e dois orçamentos

As medidas de reação à crise económica e social provocada pela pandemia de covid-19 e a aprovação de dois orçamentos, sem a ‘geringonça’, marcam o primeiro ano de João Leão como ministro das Finanças.

Em junho de 2020, o então secretário de Estado do Orçamento era um governante discreto, nome pouco conhecido da opinião pública, quando foi escolhido para ministro das Finanças.

Substituía Mário Centeno, com quem integrou a equipa de economistas que preparou o cenário macroeconómico e acompanhou o programa eleitoral do PS desde 2014 (com António Costa como secretário-geral socialista) e de quem tinha sido braço direito no desenho e execução da política orçamental que levou Portugal ao primeiro excedente orçamental da democracia (0,1% do Produto Interno Bruto em 2019).

Se a imagem para o exterior era apagada, no Governo era bem conhecido, desde logo pelas ‘lutas’ de outros ministérios com Leão para autorizar despesas. Era mesmo apontado como o ‘artífice das cativações’ e o primeiro-ministro apresentou-o como garante da continuidade da credibilidade das finanças públicas de Portugal.

Em Goa, na Índia, a escolha foi primeira página do mais antigo jornal, “O Heraldo”, que recordou os seus pai e avô, professor de liceu em Pangim, enaltecendo as suas origens goesas.

Casado, com dois filhos e uma carreira académica – doutorado em Economia pelo Massachusetts Institute of Technology (MIT) e professor no ISCTE – João Leão chegava a um dos mais importantes cargos públicos aos 46 anos.

As entranhas do Governo não lhe eram, contudo, estranhas. Antes de integrar o Governo de Costa, tinha sido diretor do Gabinete de Estudos do Ministério da Economia, entre 2010 e 2014, e assessor do secretário de Estado Adjunto da Indústria e do Desenvolvimento, Fernando Medina (Governo PS, de José Sócrates), entre 2009 e 2010.

Quando em 15 de junho de 2020 assumiu o cargo de ministro de Estado e das Finanças tinha à sua espera uma grave crise económica e social, contas públicas em desequilíbrio e ‘temas quentes’ como Novo Banco.

Logo à chegada coube-lhe a discussão e aprovação do Orçamento Suplementar, para acomodar os efeitos da crise (aumento de despesas em áreas como saúde e apoios às famílias e empresas, e quebra de receita do Estado), aprovado no início de julho com votos a favor apenas do PS, votos contra de PCP, CDS-PP, PEV, Chega e Iniciativa Liberal e abstenções de PSD, BE e PAN.

Nesse orçamento, na especialidade, foram aprovadas medidas por vários grupo parlamentares que aumentaram a despesa e diminuíram a receita, o que o Governo considerou já então uma violação da chamada ‘lei travão’ (que impede iniciativas parlamentares que, durante a execução orçamental, desequilibrem o saldo entre receitas e despesa do Estado).

Este ano, a ‘lei travão’ voltou a ser tema após a aprovação de diplomas (com oposição do PS) que reforçam os apoios sociais, tendo o Governo desta vez pedido a fiscalização sucessiva do Tribunal Constitucional.

O ano de 2020 terminou com a economia portuguesa a contrair-se 7,6% e um défice de 5,7% do Produto Interno Bruto (abaixo das previsões).

A ‘prova de fogo’ do primeiro ano foi, contudo, o Orçamento do Estado para 2021 (apresentado, discutido e votado no parlamento em outubro e novembro de 2020). Depois da legislatura da ‘geringonça’, entre 2015 e 2019, foi a primeira vez que os antigos parceiros parlamentares do Governo minoritário do PS votaram de forma diferente na votação final do orçamento anual.

O orçamento acabou aprovado com votos favoráveis do PS e abstenção de PCP e PEV e PAN e das duas deputadas não inscritas e contra de PSD, BE, CDS, Iniciativa Liberal e Chega.

O primeiro Orçamento da total responsabilidade de Leão recebeu cerca de 1.500 propostas de alteração e várias ‘maiorias negativas’ na especialidade (propostas aprovadas com votos contra do PS). Mas o ‘caso’ do Orçamento foi um tema que já tinha escaldado as mãos do anterior ministro das Finanças: o Novo Banco.

Por proposta do BE (com apoio de PSD, PCP e PAN) foi anulada a transferência de 476 milhões de euros do Fundo da Resolução para o Novo Banco.

João Leão reagiu dizendo que o Estado tem de cumprir os compromissos e que não o fazer “seria brincar com o fogo”, com a credibilidade do país e a estabilidade do sistema financeiro.

Em 04 de junho último, o Fundo de Resolução pagou 317 milhões de euros ao Novo Banco referentes a 2020, tendo para isso recorrido a um empréstimo bancário (e não do Tesouro), bem abaixo do valor pedido pelo banco (598 milhões de euros).

Sobre o Novo Banco, as declarações de João Leão têm sido sobretudo de crítica, considerando excessivas as injeções de capital pedidas, que os prémios atribuídos aos administradores são inadequados e inaceitáveis e que espera que “não haja mais chamadas de capital”.

Os 12 meses de Leão na liderança das Finanças ficam ainda marcados pela reestruturação e capitalização da TAP, um tema com grandes impactos orçamentais que lhe cabe gerir, e por ser, no primeiro semestre deste ano, presidente em exercício do Conselho de Ministros das Finanças da UE (Portugal tem a presidência do Conselho da UE), liderando as discussões dos Estados-membros sobre os planos nacionais de recuperação.

Sobre o futuro, tem considerado que são adequadas tanto as medidas de combate à crise como as de relançamento da economia, apesar das críticas da oposição, e que o caminho não passa por austeridade nem por aumentos de impostos.

Em maio, em entrevista à Lusa, disse que Portugal poderá crescer até 5% este ano (acima dos 4% esperados no Programa de Estabilidade) e que o fim das moratórias bancárias não deve ser levado com “dramatismo” (ainda que admitindo apoios aos setores mais afetados) pois há a expectativa de “uma forte recuperação da economia”.

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