Covid-19: Indústria farmacêutica alerta para o perigo da “corrida política” a uma vacina
A “corrida” para desenvolver e distribuir uma vacina contra a covid-19, capaz de controlar a pandemia, é também uma “corrida política”, alerta o director executivo da Ifpma, uma associação comercial que representa empresas farmacêuticas em todo o mundo.
“Há uma tentação para os políticos de insistirem na aprovação de uma vacina mais rapidamente do que o aconselhável em ensaios de eficácia e segurança, e é claro que os fabricantes não querem que isso aconteça”, afirmou Thomas Cueni, CEO da Federação Internacional de Fabricantes e Associações Farmacêuticas (Ifpma na sigla em inglês).
A pressão política e a “pressa” vem, principalmente, do Presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, que, de olhos postos nas eleições presidenciais a 3 de Novembro, espera que a aprovação de uma vacina constitua uma vantagem a seu favor.
Esta quarta-feira, a associação patronal espanhola Farmaindustria lembrou, numa declaração, que nove grandes fabricantes que estão a avançar com a investigação e desenvolvimento de uma vacina assinaram um compromisso. Indicam que só serão enviadas para aprovação ou autorização para utilização de emergência quando demonstrarem a segurança e eficácia através de um estudo clínico de fase 3 – a última fase dos testes a milhares de voluntários, concebido e realizado para satisfazer os requisitos das autoridades reguladoras.
Trump avançou, numa entrevista televisiva na terça-feira à noite, que uma vacina poderá estar pronta nos Estados Unidos dentro de “três ou quatro semanas”.
A forma como Donald Trump está a lidar com a pandemia tem sido fortemente criticada. Com as eleições presidenciais à porta, está a insistir numa resposta forte. Aliás, a Food and Drug Administration (FDA), autoridade do medicamento norte-americana, está a ponderar conceder autorização de emergência para distribuir as primeiras doses, o que alguns consideram alarmante, visto que a entidade deveria agir como um regulador independente baseado em provas científicas, mas ao mesmo tempo depende do governo republicano.
“As pessoas só vão confiar nas novas vacinas se acreditarem que foram aprovadas por reguladores independentes baseados em ciência pura. A diminuição dessa confiança reforçaria ainda mais o movimento anti-vacina, que já está a perturbar os programas de imunização e colocaria todos em risco”, disse Thomas Cueni numa publicação na segunda-feira, citado pelo jornal espanhol Cinco Días.
De acordo com a Ifpma, a FDA deveria contrabalançar a “pressa política” e assegurar confiança contra outras opções de vacinas, como a candidata russa Sputnik V, que foi aprovada sem os ensaios necessários da fase 3.
“A decisão da Rússia de aprovar a utilização em massa da sua vacina Sputnik V após apenas dois meses de ensaios em humanos é profundamente preocupante”, diz Cueni, que lamenta que a FDA esteja disposta a aprovar a primeira alternativa em Outubro, sem dispor de todos os dados.
Mesmo que um ensaio possa ser concluído no próximo mês, os resultados dos milhares de voluntários devem ser cuidadosamente analisados. “Rápido é bom para os políticos, mas na perspectiva do público, demasiado rápido pode ser perigoso”, sublinhou.