Um tesouro escondido?

Por Luís Gil, Membro Conselheiro e Especialista em Energia da Ordem dos Engenheiros

Uma notícia muito recente deu-nos conta de uma descoberta de cientistas americanos, da Universidade do Texas, referente a algo que à partida não se pensaria ser possível. Trata-se da existência de milhões de toneladas de cinzas da combustão de carvão, em centrais termoelétricas que usam ou usavam este combustível fóssil para a produção de eletricidade. Neste caso, nos Estados Unidos, mas naturalmente o mesmo se passará noutras geografias. Cinzas essas que podem conter as designadas terras raras, consideradas matérias-primas críticas nomeadamente para as novas tecnologias energéticas e cuja produção é dominada por alguns países, como a China, que lidera amplamente o mercado.

É referido que os cientistas analisaram as cinzas de carvão de centrais termoelétricas estadunidenses tendo verificado que estas podem conter até 11 milhões de toneladas de terras raras, quase oito vezes a quantidade que este país tem em reservas nacionais e com um valor económico superior a 8 mil milhões de USD. Estará, assim, disponível uma nova fonte, sem necessidade de mineração de terras raras “domésticas”, com todas as vantagens daí inerentes. Verificaram que estas cinzas têm concentrações relativamente baixas de terras raras, se comparadas com as existentes nos minerais extraídos, mas têm a vantagem de estar prontamente disponíveis e não terem custos de extração.

Tendo isto em mente, ocorre-nos logo a ideia: e o que se passará em Portugal? Sabemos que as centrais a carvão existentes encerraram já a sua atividade, mas fisicamente as suas instalações, nomeadamente as das grandes centrais do Pego e de Sines ainda existem. Para além disso existiram outras centrais mais antigas como as de Setúbal e do Carregado que também utilizaram carvão.

Se é certo que grande parte das cinzas volantes produzidas eram utilizadas na indústria cimenteira e do betão, existem também as cinzas do fundo. Além disso sabe-se que, no caso de Sines, as cinzas que não eram passíveis de valorização foram sendo depositadas em aterros controlados localizados dentro dos limites da própria central. E, nesse caso, ainda lá estarão? Algumas referências indicam que apenas nessa central eram produzidas entre 250 e 310 mil toneladas por ano de cinzas volantes! E que o aterro tem uma área de cerca de 11 ha e uma capacidade de 1 253 000 toneladas de resíduos não perigosos como as escórias de carvão e as cinzas volantes! E ainda é de referir que algumas terras raras valem centenas de USD por kg.

Será que temos ali um recurso valioso que vale a pena ser explorado? Para isso será necessário quantificar a quantidade existente de cinzas deste tipo e, naturalmente, a sua composição química, de forma a aferir a existência destas ditas terras raras, ou mesmo, eventualmente, de outros componentes com valor técnico e comercial acentuado. Para posteriormente se poder efetuar um estudo tecnológico e económico da sua valorização/exploração.

Existem muitas entidades nacionais que poderão efetuar os levantamentos e os estudos necessários. Entidades estatais e privadas ou associações ligadas aos resíduos e ambiente, laboratórios de estado, universidades, poderão ser chamados a contribuir para este desígnio. Fica aqui lançado o desafio…

Será que estamos “sentados” em cima de um baú com um tesouro lá dentro e não sabemos?