Metanol como solução para o armazenamento de hidrogénio?
Por Luís Gil, Membro Conselheiro e Especialista em Energia da Ordem dos Engenheiros
Muito se tem falado do hidrogénio e eu aqui já abordei a questão do metanol como possível solução para este vetor energético, nomeadamente no domínio dos transportes. Mas aqui ficam mais algumas “achas para esta fogueira”.
Refira-se também que, tal como o hidrogénio (ver por exemplo o meu artigo na Executive Digest online de 10 de janeiro de 2023 “O hidrogénio arco-íris”) também o metanol tem um código de cores associado com os métodos para a sua produção, mas aqui a referência é ao metanol verde.
O metanol verde pode ser produzido a partir do hidrogénio verde, fazendo-o reagir com dióxido de carbono, nomeadamente capturado. Embora existam outros métodos este é o mais maduro. O metanol é um combustível versátil que pode ser utilizado quer em motores de combustão interna, sem alterações assinaláveis, quer em células de combustível, sendo, portanto, muito adequado para os transportes. Algumas referências indicam mesmo vantagem a nível dos custos. Trata-se de um combustível prático para os transportes pois não necessita do caro armazenamento a alta pressão necessário para o hidrogénio. É um líquido à pressão e temperatura ambientes, podendo ser usados sistemas de transporte, armazenamento e distribuição já existentes para os hidrocarbonetos fósseis, sendo por isso de fácil introdução no mercado.
Em termos de armazenamento o metanol verde pode ser também uma forma de armazenar, sob a forma de um combustível líquido, o excesso de energia renovável.
A nível do transporte marítimo existem já navios a operar com este combustível e experiências de frotas automóveis em utilização. Assim, o motor de combustão não está “morto” pois este pode utilizar combustíveis ambientalmente adequados, como o metanol, prolongando a vida de frotas existentes.
O hidrogénio à pressão e temperatura ambiente tem uma densidade muito baixa pelo que tem que ser comprimido ou liquefeito para ser usado adequadamente. O processo de compressão necessita, por isso, de uma parte importante da energia contida no hidrogénio. Porém, o metanol “verde” produzido pelo processo atrás referido mantém mais de 90% da energia do hidrogénio usado na reação.
Com os preços baixos da eletricidade fotovoltaica, estará agora na hora de arrancar com esta nova possibilidade, pois cerca de 70% do custo da produção do hidrogénio verde por eletrólise da água deriva da eletricidade. Existem já tecnologias que apontam para custos de produção competitivos, fugindo a processos caros como a separação da água do metanol por destilação ou a captura de CO2 biogénico, por exemplo, das caldeiras da biomassa.
Assim, a fileira do metanol pode contribuir para a redução dos gases com efeito de estufa, impulsionar a economia circular (veja-se a utilização do dióxido de carbono capturado) e contribuir para o mix energético. Mesmo a nível da qualidade do ar há vantagens pois as emissões em motores de combustão são mais limpas. Uma implementação de uma fileira destas no nosso país pode também promover a inovação tecnológica, o emprego e contribuir para as exportações.
Embora os veículos ligeiros estejam em transição para motores elétricos, nomeadamente em utilização citadina, o transporte heavy-duty terrestre e marítimo e a aviação tem mais dificuldades nessa transição, abrindo-se aqui caminho para este tipo de combustível com propriedades semelhantes aos produtos fósseis refinados. Um outro aspeto importante, nomeadamente para a transição, é que o metanol pode também ser misturado com a gasolina dentro de certos limites.
Além disso, esta sua utilização pode servir para uma transição mais suave a nível da mobilidade e sem o risco da grande dependência dos denominados materiais críticos e aumentando a independência energética.
Já há alguns stakeholders que estão a estudar a possibilidade técnica e económica de produzir metanol no nosso país e, sendo certo que os pioneiros são que mais arrisca, também é certo que “candeia que vai à frente alumia duas vezes”. Empresas ligadas à área da energia, empresas petrolíferas, empresas que precisam de se descarbonizar, empresas de transportes ou mesmo as empresas que estão a arrancar com projetos na área do hidrogénio poderão ser alguns destes pioneiros. Mas para isso o poder político precisa também de estar atento a esta possibilidade e agir em conformidade. Com as eleições à porta, aqui fica uma dica para as várias forças políticas!