A nova economia “Silver”

Opinião de Nelson Pires, General Manager da Jaba Recordati

A longevidade e o aumento da esperança de vida é um facto. Em 1950 os homens viviam 55,8 anos e as mulheres 61. E em 2023, vivemos cerca de 78,4 anos para os homens e 83,7 para as mulheres. São os chamados “silver” (pessoas acima de 50 ou 60 anos) que deixaram de ser idosos e velho, pois vivem ativamente até mais tarde. Vive-se mais tempo no Norte e Centro de Portugal e menos nas Regiões Autónomas da Madeira e dos Açores. O que é algo curioso e que vale a pena explorar. Mas o que é certo é que aumentámos cerca de 1/3 a esperança média de vida. São muitos os motivos conhecidos: melhor conhecimento médico e estilos de vida equilibrados; melhores meios de diagnóstico; melhores medicamentos que tornaram as doenças mortais em doenças crónicas.

Outro dado que vale a pena explorar é que sabemos agora, através da biologia do envelhecimento estudado e publicado pela renomada universidade de Stanford, que os humanos envelhecem muito em 2 fases da sua vida. Há um declínio súbito molecular e celular, por volta dos 44 e dos 60 anos (em homens e mulheres, pelo que a causa óbvia feminina – menopausa – não justifica este declínio).

Temos em Portugal cerca de 3000 pessoas com 100 ou mais anos. O Japão, a Itália e a Finlândia são os recordistas de % de população mais alta acima de 65 anos. Logo seguido de Portugal em quarto lugar com 21.8%. No entanto, a maioria da população “silver” vive ativamente até mais tarde mas também, como seria de esperar, com várias doenças crónicas. Por isso, menos de 15% da população mobiliza mais de 50% dos recursos alocados aos serviços públicos de saúde. Novas necessidades emergiram e um novo conjunto de oportunidades começaram a desenvolver-se. Algumas são desafios enormes: como financiar o sistema de saúde que permita assegurar não apenas longevidade mas também a qualidade de vida dos “silver”? Como garantir a sustentabilidade da segurança social? Como criar comunidades de integração dos “silvers”, reduzindo o seu isolamento? Como assegurar que vivemos mais mas melhor? Como assegurar que os “silver” trabalhem até mais tarde caso pretendam? Qual vai ser o  “consumer landscape” de serviços inovadores e únicos para esta comunidade? como utilizar a IA, a digitalização e robótica para incrementar a integração e qualidade de vida dos “silvers”? Muitas dividas emergem desta “nova sociedade”.

Como exemplo de oportunidade, sabemos que muitos dos silvers já fizeram a transição digital. A crise da Covid acelerou a adopção de novas tecnologias, o que está a abrir as portas a uma maior aceitação de novos serviços, como assistência médica remota e redução do isolamento. Permite-lhes assim permanecerem autónomos por mais tempo.

A oportunidade económica existe e pode ser complementar ao propósito de acrescentar valor à comunidade e à sociedade por parte das empresas. Substituir a exclusão dos idosos pela integração dos “silvers”.  “Silvers” esses que são o segmento mais rico e de crescimento mais rápido da população. A “contribuição econômica” dos americanos com mais de 50 anos foi de US$ 8,3 triliões em 2018, o que os tornaria, tomados isoladamente, a terceira maior economia do mundo. 

O mesmo na Europa, em que a economia “silver” continua a crescer e espera-se que contribua com mais de € 5,7 triliões até 2025. E até 2050, o número de silvers mais que dobrará, chegando a quase 2,1 biliões de cidadãos.

Portanto a oportunidade da Europa está na Reindustrialização, mas também na manutenção e/ou atração dos silvers para o seu espaço territorial. Como? Integrando, inovando, garantindo a sustentabilidade e utilidade deste importante segmento. Não nos queremos tornar a “Flórida” do século XXI mas sim otimizar uma tendência natural do planeta e especialmente da Europa. Para isso vale a pena conhecer este segmento. Os silvers valorizam atributos individuais como: o empreendedorismo, a aventura controlada, a cidadania, a cultura, o património, o exercício do poder, a qualidade de vida, a utilidade e a mobilidade. Querem experiências integradoras e imersivas. Infelizmente quando avaliamos os rankings nestes critérios, Portugal fica sempre fora do top 20, encontrando-se apenas melhor na categoria de património e de aventura.

As empresas têm portanto de inovar e ajustar os seus produtos de acordo com estas necessidades caso queiram comunicar com impacto neste segmento. 

No setor de consumo, nomes como Estée Lauder e a Unilever já introduziram várias linhas de produtos relevantes para o “envelhecimento gracioso”. A Suíça Nestlé também já redesenhou, em vários mercados, potes de café instantâneo e caixas de chocolate, tornando-os mais fáceis de segurar e abrir, mantendo os produtos acessíveis a faixas etárias mais velhas. A Toyota tem como objetivo capitalizar a “Silver Economy” no Japão desenvolvendo robôs humanoides para realizar as tarefas domésticas, muitas vezes limitativas para a “independência” dos “silvers”, para estes poderem continuar a viver na sua própria casa.

Outra área óbvia de oportunidade são os serviços de saúde. Têm de ser bem desenvolvidos, têm de se adaptar tornando-se àgeis, inclusive podendo ser remotos no diagnóstico e acompanhamento não urgente. A IA vai potenciar estas possibilidades. Têm de garantir um acesso fácil, uma integração eficiente e uma transparência total. A industria farmacêutica pode também inovar, integrando os seus produtos e serviçosX. Desde o tracking digital com aplicações remotas de diagnóstico digital, serviços de enfermagem ao domicílio, soluções  de fitness e life style de redução do risco ou o advento das medicinas personalizadas.

Outra área de oportunidade é na habitação. Temos de deixar de ter apenas “lares de idosos”. Temos de copiar o modelo Espanhol de criar residências colaborativas em que os “silvers” são responsáveis pela gestão e realização das tarefas diárias da própria residência. O advento das casas inteligentes irá facilitar este processo.

Sem querer esgotar os exemplos das oportunidades, temos de referir que têm que existir políticas públicas que suportem esta estratégia. O “visa gold silver” tem de ser uma realidade, não apenas com alguns benefícios fiscais, mas que facilite e acelere o acesso à residência e aos serviços do país. E os serviços não são apenas os tangíveis mas também os intangíveis, tão valorizados pelos “silvers”, como: a segurança, o apoio domiciliário, o meio ambiente e qualidade de vida (com lugares sem poluição sonora, poluição luminosa e sem poluição do ar), a acessibilidade aos meios de transporte e à saúde, a ocupação na economia social (que permite que os silvers se sintam úteis mesmo não tendo uma profissão ativa).  O estado tem portanto de regular. Garantindo a estabilidade estratégica do “silverismo” e não mudar as políticas de acordo com os ciclos políticos. 

“Quarenta anos é velhice para a juventude, e cinquenta anos é juventude para a velhice”. – Vitor Hugo