10 estratégias governamentais para acelerar a transformação digital

Por Jason Whittet, consultor de transformação governamental da Amazon Web Services (AWS)

Os governos têm um papel importante no incentivo à adotação de novas tecnologias, tanto por parte do setor público, como das empresas ou cidadãos. Têm o poder de padronizar processos e metodologias, criar uma cultura que seja propícia à inovação e que promova a transparência e a confiança nos serviços digitais.

O trabalho que desenvolvi nos últimos anos na AWS enquanto consultor de transformação digital em entidades públicas permitiu-me observar algumas boas-práticas, que agora partilho– organizadas em 10 medidas a que os governos podem recorrer para incentivar a aceleração da transformação digital.

A atribuição subsídios governamentais e outros apoios financeiros, como subsídios, incentivos fiscais ou empréstimos com juros baixos podem ser uma solução. Este tipo de medidas trazem alguma segurança ao ecossistema, pois podem ajudar a compensar o custo inicial da transformação e, assim, incentivam o investimento em tecnologia. Por exemplo, a Agência de Transformação Digital da Austrália está a investir em infraestruturas digitais que impulsionem a economia digital. Fá-lo através de incentivos fiscais e financeiros, direcionados para o desenvolvimento de competências e para a utilização do passaporte de competências digitais da DTA, o MyPass.

A disponibilização de programas de formação, recursos educacionais, hackathons, laboratórios, incubadoras e bancos de ensaios, também são uma estratégia eficaz. Estas ferramentas têm um impacto positivo na literacia digital e no desenvolvimento de competências técnicas – junto dos funcionários públicos, das empresas e dos cidadãos em geral. O programa Beyond the Cloud, desenvolvido pelo governo do Canadá, tem exatamente estes objetivos. É uma medida que forma cidadãos para que sejam arquitetos, engenheiros e administradores de sistemas na cloud. Com a entrada destes profissionais no mercado de trabalho, o governo do Canadá garante a possibilidade de transformação empresarial e dos serviços públicos.

A atualização dos regulamentos e políticas, com o objetivo de remover barreiras à inovação digital e ao empreendedorismo é outra medida essencial. Aqui, inclui-se a simplificação de processos de licenciamento, promoção de padrões de interoperabilidade e a criação de sandboxes regulatórias que permitam a experimentação de novas tecnologias num ambiente controlado. Políticas de prioridade à cloud (cloud-first), como as implementadas pelo governo das Filipinas (para impulsionar a adoção da cloud e promover flexibilidade, segurança e eficiência de custos), são um bom exemplo.

Uma das formas de investir na infraestrutura pública digital (DPI) é através de parcerias público-privadas (PPPs). A colaboração do governo com empresas do setor privado – associações industriais ou instituições académicas -, permite o desenvolvimento de iniciativas e projetos conjuntos de promoção da transformação digital. O website de compras estatais da Ucrânia, Prozorro (que significa transparência em ucraniano), é um exemplo de um investimento bem-sucedido de PPP em DPI. Estima-se que esta plataforma, que teve o apoio da Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional (USAID), tenha poupado $6 mil milhões para ao estado Ucraniano, desde 2017.

A disponibilização de dados e de API por parte dos governos permite às empresas, investigadores e developers, a criação de novos produtos e serviços de apoio ao cidadão e ao estado. Este tipo de políticas promove a transparência e, em simultâneo, a inovação e o desenvolvimento económico. Um caso concreto é a iniciativa do governo espanhol – Apordata – que, ao disponibilizar publicamente dados, permite o desenvolvimento de inúmeras iniciativas de promoção da eficiência no serviço público, o que facilita a interação entre o estado e o setor privado, assim como a tomada de decisão baseada em evidências.

A digitalização de serviços públicos que melhorem a sua acessibilidade, conveniência e a eficiência – desenvolvimento de portais online ou aplicações móveis, de plataformas digitais para aceder a serviços e informações governamentais, para pessoas e empresas – tem demonstrado ser essencial. o Serviço Digital do Governo britânico (GDS), que promove a modernização do setor público através de ferramentas que facilitam a mudança e melhoram os serviços, disponibilizando-as para reutilização por outras entidades, é um dos exemplos. O seu sistema de design uniformiza websites e conteúdos digitais com estilos e componentes padronizados, incluindo um guia de utilização. Nos EUA existe uma iniciativa semelhante, o programa 18F.

Outra medida interessante é o reconhecimento de organizações e indivíduos que demonstrem excelência em temas de transformação digital e inovação, através da atribuição de prémios. Estes funcionam como um incentivo contínuo para o desenvolvimento e implementação de melhores práticas e servem de inspiração, para que outros embarquem nesta jornada de transformação digital. Estas distinções governamentais constroem uma cultura e comunidade, e motivam a experimentação. Em 2023, a União Europeia teve mais de 330 candidatos aos seus Prémios Europeus de Competências Digitais.

Os governos devem, também, desenvolver e implementar estratégias nacionais para a transformação digital, que permitam coordenar objetivos e alocar recursos entre setores e stakeholders. As estratégias digitais vinculadas às prioridades governamentais tendem a ser bem-sucedidas. Por exemplo, o Novo Acordo Digital Coreano tem 12 metas em quatro setores (um âmbito bastante amplo), mas afunila em metas individuais focadas em objetivos governamentais específicos, e levou a Coreia do Sul a ser reconhecida como líder digital.

O estabelecimento de objetivos claros e a criação de mecanismos de avaliação contínua, melhoria e responsabilização, são fundamentais no incentivo à transição digital. Para este fim, a Autoridade de Governo Digital da Arábia Saudita estabeleceu indicadores e disponibilizou-os num website público que permite a sua monitorização pública. Esta é uma forma aberta e transparente de trabalhar, e que disponibiliza publicamente o que estão a fazer para cumprir com o seu objetivo de mover 80% de todos os seus processos para a cloud.

Por fim, sugiro que os governos estabeleçam equipas de FinOps (prática de gerir gastos com tecnologia em cloud) – que permitam aos diversos serviços produzir orientações e recorrer a ferramentas de planeamento, monitorização e controle de custos dos diversos serviços na cloud. As FinOps apoiam a transição de um modelo de infraestrutura física (tradicional – com um investimento em hardware e na sua manutenção), para uma infraestrutura na cloud (com um modelo de pagamento variável, de acordo com a utilização e necessidade). Um ótimo exemplo é o UK Central Digital and Data Office, que uniformiza e controla os custos de todo o governo britânico com a infraestruturas de cloud. Esta prática permite reduzir o esforço e a incerteza financeira de um serviço que é, na sua génese, variável.

Em suma, a implementação de incentivos estratégicos revela-se fundamental na criação de uma cultura que promova a inovação e acelere a transição digital. Estes poderosos mecanismos de transformação fomentam a transparência, a eficiência e a confiança nos serviços públicos. E, em última análise, permitem, nesta era digital em que vivemos, a oferta de um melhor serviço aos cidadãos.

 

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