Tribunal liberta Luís Filipe Vieira de dívida de 160 milhões de euros ao Novo Banco

O Tribunal da Comarca de Lisboa isentou Luís Filipe Vieira de uma dívida de 160 milhões de euros ao Novo Banco (NB), decisão fundamentada no pagamento das obrigações (VMOC) através da conversão em ações, realizadas por duas empresas do ex-presidente do Benfica, a Promovalor II e a Inland. A decisão, a que o Correio da Manhã teve acesso, conclui que as empresas de Vieira cumpriram as suas obrigações contratuais ao converterem as VMOC em ações e entregarem-nas ao NB em dezembro de 2021. Assim, o tribunal considera que o reembolso foi feito em espécie, convertendo o NB em acionista das referidas empresas.

Segundo o tribunal, “a alteração do estatuto do Autor [NB], que passa a ser acionista das Rés [Promovalor II e Inland]”, corresponde ao pagamento da dívida através das condições contratuais estabelecidas, que permitiam essa conversão caso o crédito não fosse liquidado até ao fim do prazo de dez anos, estabelecido para agosto de 2021.

O Novo Banco, que herdou a dívida do antigo Banco Espírito Santo (BES), argumentou no tribunal que as empresas de Vieira usaram a conversão como uma manobra para evitar o pagamento da dívida, qualificando o ato como um “abuso do direito”. O banco alegou que a conversão criou um “desequilíbrio grave entre as partes”, visto que o NB emprestou 160 milhões de euros e agora se encontra com uma posição acionista de valor reduzido, devido ao estado de insolvência das empresas.

Além dos 160 milhões de euros iniciais, o Novo Banco reivindicava um montante de 131 milhões de euros, correspondente a juros e prémios de conversão que, segundo o banco, deveriam ter sido pagos na data de conversão. Porém, a juíza discordou, afirmando que “a existir desequilíbrio, que entendemos que não existe, menos ainda grave, será aquele que advém da normal posição de credor do Autor [NB] e de devedora das Rés [Promovalor II e Inland]”.

A dívida em questão remonta a 2011, quando o BES concedeu 90 milhões de euros à Promovalor e 70 milhões à Inland. Após a falência do BES em 2014, a dívida foi transferida para o Novo Banco, que tentou recuperar o montante através de reestruturações financeiras, culminando na criação do Fundo de Investimento Alternativo Especializado (FIAE), detido quase inteiramente pelo NB. Este fundo foi criado para captar receitas que saldassem a dívida do grupo Promovalor, mas mostrou-se financeiramente inviável.

Através do FIAE, o NB esperava gerar capital suficiente para cobrir a dívida, mas o resultado ficou aquém das expectativas. O NB mantém atualmente 66,2% do capital da Promovalor II e 63,3% da Inland, uma posição acionista que não reflete o valor original emprestado, segundo o banco.

O contrato das VMOC, que previa o reembolso através de conversão em ações ao fim de dez anos caso a dívida não fosse paga, foi executado em 2021. Contudo, testemunhas do NB, incluindo o ex-presidente António Ramalho, afirmaram em tribunal que o banco não pretendia tornar-se acionista das empresas de Vieira devido ao impacto financeiro negativo que tal posição acarretaria. Ramalho explicou que “o valor negativo da Promovalor nas nossas contas levaria a uma redução de capital superior a 100 milhões [de euros]”, o que traria sérias implicações sob as regras do Fundo de Resolução.

Embora o NB tenha pedido ao tribunal que declarasse inválida a conversão das obrigações em ações, a juíza rejeitou esse pedido, concluindo que o banco já tinha assumido a posição acionista desde a conversão e que o contrato não foi violado.

O Novo Banco ainda pode recorrer da decisão, tendo um prazo de 40 dias para apresentar o recurso. Este caso ganha especial relevo no setor financeiro português, particularmente em relação aos empréstimos VMOC, que têm gerado controvérsia, como evidenciado pelo recente perdão de dívida ao Sporting. No caso do clube lisboeta, o NB e o Banco Comercial Português (BCP) concordaram com uma reestruturação de dívida, resultando num perdão de aproximadamente 96 milhões de euros no valor dos VMOC.