Três meses de conflito Israel-Hamas: afinal, quem é que está a vencer?
“Nenhum plano de batalha sobrevive ao primeiro contato com o inimigo”: a frase do famoso estrategista alemão Helmuth von Moltke aplica-se perfeitamente à tragédia que o mundo testemunha em Gaza. Três meses após o início do conflito, os civis têm suportado o peso da violência dos dois lados, com a morte de mais de 22 mil palestinianos em Gaza e de 1.200 israelitas – cerca de 85% dos habitantes de Gaza foram deslocados e um quarto da população enfrenta a fome, denunciaram as Nações Unidas.
O conflito dá poucas mostras de poder parar num futuro próximo e pode resultar num impasse, segundo ilustrou a publicação ‘The Conversation’. Mas, há quem esteja a vencer? Dificilmente…
Israel: sucesso limitado
Até agora, Telavive não conseguiu alcançar qualquer um dos seus principais objetivos: a destruição do Hamas e a liberdade dos restantes 240 israelitas feitos reféns a 7 de outubro. Os combatentes dos Hamas continuam a utilizar a sua rede de túneis para emboscar soldados israelitas e estão a disparar foguetes contra Israel, embora a um ritmo mais baixo.
Ainda há cerca de 130 israelitas reféns e foi libertado apenas um refém pelas IDF (Forças de Defesa de Israel), ao contrário do sucesso obtido pelos mediadores Qatar e Egito.
Israel alcançou um importante sucesso simbólico com o aparente assassinato do vice-líder do Hamas, Saleh al-Arouri, em Beirute, no passado dia 2 – embora Israel não tenha reivindicado formalmente a sua responsabilidade, há poucas dúvidas de que esteve por trás do assassinato. Mas os dois líderes do Hamas que Israel mais deseja eliminar – o político Yahya Sinwar e o militar Mohammed Deif – ainda estão a monte.
Qual será o dia seguinte?
O Governo israelita também está dividido sobre a forma como Gaza deverá ser administrada quando cessarem os combates.
O primeiro-ministro Benjamin Netanyahu avisou que não aceitará que Gaza continue a ser “Hamastan” (controlado pelo Hamas) ou a tornar-se “Fatahstan” (governado pela Autoridade Palestiniana, que é dominada pelo partido secular Fatah). O presidente dos EUA, Joe Biden, prefere um Governo de Gaza liderado por uma Autoridade Palestiniana reformada, mas Netanyahu rejeitou isto e não articulou um plano alternativo.
O ministro da Defesa israelita, Yoav Gallant, apresentou esta semana um plano para o futuro de Gaza, que envolveu governação por autoridades palestinianas não especificadas – o plano foi alvo de múltiplas críticas, entre as quais as do ministro das Finanças, Bezalel Smotrich, e o ministro da Segurança Nacional, Itamar Ben-Gvir, apelaram a uma solução que incentive a população palestiniana a emigrar e que os colonos israelitas regressem a Gaza, o que foi considerado inaceitável pela administração Biden.
A campanha de bombardeamento massivo de Israel conseguiu virar a opinião internacional contra ela, como ficou expresso na votação da Assembleia Geral das Nações Unidas, em que 153 dos 193 Estados-membros apelaram a um cessar-fogo.
Hamas ainda resiste
Apesar de ferido, está ainda ativo: Israel afirmou ter matado ou capturado entre 8 e 9 mil dos cerca de 30 mil homens da força de combate do Hamas. No entanto, a principal conquista do Hamas é que ainda está de pé. Para vencer, o grupo militante não tem de derrotar Israel – precisa apenas de sobreviver ao ataque das IDF.
O Hamas pode reivindicar alguns pontos positivos. O seu ataque de 7 de outubro colocou a questão palestiniana no topo da agenda do Médio Oriente.
Os cidadãos dos estados árabes que assinaram acordos de paz com Israel estão claramente irritados. E um acordo israelo-saudita para normalizar as relações entre os países, que era iminente antes do conflito, está fora de questão por enquanto.
Estados Unidos mostrou fraqueza com Israel
Biden abraçou Netanyahu imediatamente após o ataque do Hamas, mas os esforços dos Estados Unidos desde então para influenciar os planos de guerra de Israel não produziram quaisquer resultados. O secretário de Estado Antony Blinken falhou no seu esforço para persuadir Israel a acabar com a guerra no início do novo ano.
Além disso, as divisões nos Estados Unidos podem prejudicar Biden na preparação para as eleições presidenciais de novembro. O apoio dos EUA à Ucrânia também se tornou uma vítima da guerra. Os republicanos, seguindo o exemplo de Trump, estão a dar prioridade ao apoio a Israel e a impedir o fluxo de migrantes através da fronteira com o México. Estão a perder o interesse na Ucrânia – o que beneficia claramente o presidente russo, Vladimir Putin.
Nações Unidas mostraram-se irrelevantes
A ONU também falhou na sua missão de manter a paz mundial. A única resolução do Conselho de Segurança sobre a guerra não significou nada, como fez questão de salientar a Rússia. A recente resolução ilustrou o crescente isolamento de Israel, mas não fez nada para mudar o curso da guerra.
Irão está atento às oportunidades
Teerão não dá sinais de se querer envolver diretamente na guerra. Mas parece não ter problemas com o facto de os seus representantes – o Hezbollah no Líbano e os Houthis no Iémen – fornecerem apoio simbólico ao Hamas através de ataques limitados de foguetes, drones e artilharia.