Problemas de saúde mental têm efeito de “contágio” entre jovens, revela nova investigação

Um novo estudo científico sugere que os transtornos de saúde mental podem ser “contagiosos” entre adolescentes com a mesma facilidade com que partilham gostos musicais ou formas de vestir.

Este trabalho, publicado na revista Jama, analisou mais de 700.000 estudantes finlandeses de várias turmas do primeiro ano de ensino secundário, onde havia pelo menos um colega com algum transtorno mental. Entre a amostra total, 47.433 jovens apresentavam esquizofrenia, depressão, ansiedade, anorexia, transtornos alimentares ou outras doenças derivadas do consumo de drogas, como a psicose ou transtorno bipolar.

Os resultados mostraram que 167.227 estudantes (25,1% dos alunos saudáveis) receberam um diagnóstico de transtorno mental no ano seguinte a terem partilhado a aula com um colega afetado. Os diagnósticos mais comuns foram de depressão, ansiedade e transtornos alimentares, sem ligação ao uso de substâncias ou predisposição genética. O risco de desenvolver um transtorno aumentava proporcionalmente ao número de alunos afetados na turma.

Os investigadores destacam a importância deste estudo pela sua grande dimensão e pela amostra abrangente. De acordo com o estudo, não foram encontradas diferenças significativas quando foram considerados fatores externos, como a posição socioeconómica dos alunos, transtornos mentais preexistentes nos pais ou diferenças genéticas na predisposição para problemas de saúde mental. Isto indica que o aumento dos diagnósticos está relacionado principalmente com os vínculos e a convivência nas salas de aula.

A tendência natural de relacionar-se com pessoas semelhantes é um factor importante, mas, neste estudo, as turmas foram escolhidas pelos centros educativos e não pelos próprios alunos ou pelas suas preferências pessoais. Este contexto permitiu aos investigadores analisar a influência social de forma mais objetiva.

Os autores do estudo também sugerem que o número de “contagiados” pode ser maior, uma vez que muitos jovens podem apresentar sintomas de transtornos mentais mas não procurarem ajuda médica, levando a um subdiagnóstico.

Apesar dos resultados surpreendentes, os investigadores alertam para certas limitações. A Finlândia é um país pequeno e homogéneo com um sistema de saúde que proporciona acesso universal aos serviços. Replicar este estudo em países maiores ou com sistemas de saúde mais precários pode apresentar dificuldades e levantar dúvidas sobre a generalização dos resultados.

Além disso, muitos jovens podem já sofrer de depressão ou ansiedade antes do estudo, o que pode não ser causado pelo “contágio” de colegas. O estudo foi realizado entre 2001 e 2019, excluindo os efeitos da pandemia de Covid-19 na saúde mental dos jovens.

Alberto Ortiz Lobo, doutor em Medicina e psiquiatra do Hospital de Dia Carlos III em Madrid, afirma: “Desde então, os adolescentes têm demonstrado mais do que nunca o seu mal-estar através de comportamentos que são mais facilmente classificados como ‘transtornos mentais’, um assunto que nos deve levar a refletir sobre que medidas educativas, familiares e ambientais podemos tomar, além das puramente psicológicas ou psiquiátricas”.

Por outro lado, o estudo demonstra um “efeito positivo” na visibilidade dos transtornos mentais. Muitos adolescentes começaram a falar dos problemas que enfrentavam – eles próprios ou os seus colegas – com mais normalidade, tanto nas aulas como nos seus círculos sociais.