“Depois de reflexão decidi continuar”: Sánchez anuncia que não se demite da liderança do Governo espanhol

“Se permitirmos que as mentiras mais grosseiras substituam o debate, não vale a pena. Mas decidi continuar e já informei o chefe de Estado da minha decisão. Assumo o meu compromisso de trabalhar sem descanso pela regeneração da nossa democracia.”

Pedro Sánchez anunciou esta segunda-feira, no Palácio de Moncloa, a decisão de se manter como primeiro-ministro de Espanha, deixando várias críticas aos acontecimentos políticos recentes. “A única forma de avançar é parar e refletir com clareza para onde queremos avançar. Ou dizemos basta ou esta degradação da vida pública vai terminar condenando-nos como país. Deixo por motivos pessoais, que correspondem a valores fundamentais da sociedade espanhola. Estamos a falar de respeito, de dignidade, de princípios que nos definem como sociedade”, referiu o chefe de Governo de Espanha, esta segunda-feira.

“Só há uma forma de reverter esta situação: que a maioria social se mobilize numa aposta na dignidade e travando a política de vergonha que somos vítimas há muito tempo. Trata-se de decidir que tipo de sociedade queremos ser e o nosso país precisa de fazer esta reflexão coletiva, para dar lugar ao jogo limpo. Estamos há muito tempo a permitir que a vida política seja contaminada de práticas tóxicas”, indicou Pedro Sánchez.

“Devemos deixar de ser um país obscuro para uma sociedade que impressione o mundo, uma referência a nível internacional a nível de liberdades, democracia e progresso. Peço à sociedade espanhola que voltemos a ser um exemplo, uma inspiração. Os males que nos afetam não são exclusivos de Espanha, fazem parte de um movimento reacionário a nível mundial que quer impor a sua agenda regressiva através da difamação, falsidade, ódio, apelo a medo e ameaças que não corresponde nem à realidade ou racionalidade”, apontou o chefe de Governo espanhol.

Mas o que levou a esta decisão?

Pedro Sánchez cancelou a agenda pública até esta segunda-feira depois de um tribunal de Madrid ter confirmado a abertura de um “inquérito preliminar” envolvendo a mulher, Begoña Gómez, por alegado tráfico de influências e corrupção, na sequência de uma queixa da associação “Mãos Limpas”, associada à extrema-direita.

O primeiro-ministro e líder do partido socialista espanhol (PSOE) disse que a mulher e ele próprio estão há meses a ser vítimas da “máquina de lodo” da direita e da extrema-direita e que precisa “de parar e refletir”, para responder à pergunta de se deve e se vale a pena continuar no cargo que ocupa desde 2018 dado “o lodaçal” em que o Partido Popular (PP) e o Vox “pretendem transformar a política”.

Sánchez disse que estão em causa “falsidades”, que Begoña Gómez “defenderá a sua honra e colaborará com a justiça” e acusou PP e Vox “de uma operação de assédio e destruição” pessoal porque não aceitam os resultados das últimas eleições e perceberam que “o ataque político não seria suficiente”.

O líder do Governo espanhol recebeu de imediato manifestações de apoio de dirigentes do PSOE, de outros partidos de esquerda e dos independentistas da Esquerda Republicana da Catalunha, que partilharam as acusações à direita e à extrema-direita e afirmaram que em política “não vale tudo”.

PP e Vox acusaram-no de estar a vitimizar-se para esconder suspeitas de corrupção e de estar a fazer campanha, a poucas semanas de eleições regionais na Catalunha, em 12 de maio, e de europeias, em 09 de junho.

As suspeitas em torno de Begoña Gómez

A mulher do primeiro-ministro vai ser investigada por alegadas ligações a empresas privadas, como a companhia aérea Air Europa, que receberam apoios públicos durante a crise da pandemia ou assinaram contratos com o Estado quando Sánchez era já primeiro-ministro.

A queixa da associação “Mãos Limpas” baseia-se em publicações recentes em meios de comunicação digitais cujos conteúdos o PP e o Vox têm referido em declarações públicas e em debates políticos, incluindo no parlamento.

Outras polémicas e acusações

Além da suspeita que envolve a mulher, Sánchez tem sido atacado pela direita e extrema-direita por causa de uma investigação judicial a um assessor de um ex-ministro socialista, acusado de fraude e de cobrar comissões ilegais na venda de máscaras durante a pandemia a entidades públicas, incluindo governos regionais então nas mãos do PSOE.

Nenhum antigo membro do governo ou dirigentes do PSOE estão a ser investigados pela justiça, segundo o que se conhece deste caso, que levou à criação de comissões de inquérito no parlamento, apoiadas pelos socialistas, sobre a compra de material sanitário pelas administrações públicas durante a crise da covid-19.