“Para aumentar ainda mais a circularidade dos nossos produtos, temos de pensar de forma diferente”, diz o Diretor de Sustentabilidade da Continental

A indústria automóvel e de pneus tem vindo a enfrentar desafios ambientais cada vez maiores, especialmente à medida que as regulamentações se tornam mais exigentes e as expectativas dos consumidores por soluções sustentáveis aumentam.

A Continental, uma das principais empresas do setor, tem trabalhado para garantir que a sustentabilidade seja uma prioridade em toda a sua cadeia de valor, e tem feito progressos significativos na descarbonização das suas fábricas, com destaque para a unidade de produção de Lousado, que se tornou neutra em CO2.

Em entrevista à Executive Digest, Jorge Almeida, Diretor de Sustentabilidade da Continental, falou dos desafios e as oportunidades que o setor enfrenta e de que forma conseguem inovar para cumprir com as exigências do mercado.

 

Quais são as principais iniciativas de sustentabilidade da Continental nos últimos anos?

Na Continental, adotamos uma abordagem muito holística à sustentabilidade. Cada área do nosso negócio está empenhada em alcançar as nossas ambições de sustentabilidade. E estamos a passar das palavras à ação com provas muito específicas e concretas. Desde o lançamento do UltraContact NXT, o nosso pneu de série mais sustentável no mercado, até aos progressos que fizemos na descarbonização das nossas fábricas. Desde a saúde e segurança dos nossos colaboradores até aos processos na cadeia de valor responsável com todos os nossos parceiros, não deixamos nenhuma pedra por virar para gerar um impacto positivo.

 

Quais são os maiores desafios que a Continental enfrenta na implementação de práticas sustentáveis no setor automóvel e de pneus?

Na indústria de pneus, enfrentamos inúmeros desafios. Os pneus são absolutamente cruciais para a segurança rodoviária. Todos os materiais, sejam eles novos, reciclados ou renováveis, desempenham um papel essencial na garantia da segurança e do desempenho durante a fase de utilização de um pneu. Por conseguinte, quer utilizemos materiais novos, reciclados ou renováveis, temos de garantir a segurança e o desempenho.

Para o garantir, investimos fortemente em investigação e desenvolvimento, bem como em testes de materiais novos e mais sustentáveis, antes de termos a certeza de que podem ser utilizados na produção em série. Embora tenhamos metas de sustentabilidade ambiciosas e estejamos a fazer progressos significativos, nunca comprometeremos a segurança. Um exemplo do nosso espírito inovador é a tecnologia ContiRe.Tex. Quem teria pensado que poderíamos utilizar poliéster de alto desempenho feito a partir de garrafas recicladas nos nossos pneus?

Exploramos materiais inovadores, mas também asseguramos um abastecimento responsável. Esta é uma tarefa complexa, uma vez que temos de monitorizar toda a nossa cadeia de fornecimento a montante para garantir que todos os nossos parceiros e fornecedores cumprem os nossos elevados padrões, contribuindo de forma positiva para a natureza e para a sociedade.

 

Como é que a Continental aborda o ciclo de vida dos seus pneus, desde a produção até o fim da sua vida útil? Existem iniciativas para reduzir o impacto ambiental ao longo deste ciclo?

Para aumentar ainda mais a circularidade dos nossos produtos, temos de pensar de forma diferente. Para nós, o ciclo de vida começa com o design dos nossos produtos, que já determinará o seu potencial de circularidade. Precisamos de mudar o pensamento de “fim de vida” para “fim de utilização” no que diz respeito aos pneus. Isto significa que o fim da fase de utilização prevista de um pneu deve tornar-se o início de uma nova oportunidade.

Através do nosso inovador programa ContiLifeCycle, conseguimos reutilizar pneus de camiões e autocarros em fim de vida, prolongando a sua vida útil e conservando recursos valiosos. O conceito ContiLifeCycle é um excelente exemplo dos nossos métodos abrangentes de reciclagem, nos quais os pneus de camião são reciclados e transformados em novos produtos.

Além disso, encontramos novos usos para pneus no fim da sua utilização, para além do seu tempo de vida convencional, seja como materiais inovadores ou como componentes de outros produtos.

Nesta área, estabelecemos parcerias para recuperar os materiais dos pneus no fim da sua utilização através de processos como a pirólise.

Ao reutilizar e reciclar pneus, reduzimos significativamente a quantidade de energia e matérias-primas necessárias para fabricar pneus novos. Estas ações demonstram o nosso empenho em minimizar o impacto ambiental através da aplicação dos princípios da economia circular, maximizando assim a eficiência e a vida útil dos nossos produtos.

 

Como é que a empresa trabalha com fornecedores para garantir práticas sustentáveis ao longo de sua cadeia de valor?

A sustentabilidade baseia-se em parcerias. Trabalhamos em estreita colaboração com os nossos fornecedores para garantir práticas sustentáveis ao longo de toda a nossa cadeia de valor. Oferecemos programas de formação abrangentes para formar os fornecedores sobre práticas sustentáveis e os nossos requisitos para uma cadeia de abastecimento responsável. Utilizamos tecnologias digitais de ponta e mapeamento sistemático de riscos para aumentar a transparência e identificar potenciais riscos. Temos políticas claras sobre abastecimento sustentável e realizamos auditorias regulares de sustentabilidade para assegurar que os fornecedores cumprem o nosso Código de Conduta, que abrange questões éticas, sociais e ambientais. Em relação aos materiais, como a borracha natural, por exemplo, consideramos práticas agrícolas sustentáveis e procuramos garantir o sustento de milhares de pequenos agricultores. Colaboramos com organizações como a Global Platform for Sustainable Natural Rubber (GPSNR) e em parcerias de desenvolvimento com a Deutsche Gesellschaft für Internationale Zusammenarbeit (GIZ: Sociedade Alemã para Cooperação Internacional) para promover práticas sustentáveis. Esses esforços refletem o nosso compromisso em criar uma cadeia de valor responsável e sustentável.

 

Quais resultados concretos a Continental obteve até agora em termos de redução de emissões de CO2 e outros impactos ambientais?

Desde 2020, a eletricidade que adquirimos para as nossas unidades de produção de pneus em todo o mundo é neutra em carbono e proveniente de fontes de energia renováveis. Além disso, estamos a gerar cada vez mais a nossa própria eletricidade graças à expansão massiva de sistemas fotovoltaicos. Ao mesmo tempo, estamos a implementar uma ampla gama de projetos para tornar a nossa operação ainda mais eficiente em termos energéticos. Em 2023, por exemplo, conseguimos poupar um total de 150 gigawatts-hora de energia. Cada uma das nossas fábricas de pneus está a trabalhar em soluções individuais e em iniciativas a nível global para alcançar a produção neutra em carbono, o mais tardar até2040.

Um dos marcos mais importantes que alcançámos este ano é o facto de a nossa fábrica de pneus em Lousado, Portugal – com uma capacidade de produção anual superior a 18 milhões de pneus – estar agora pronta para operar de forma neutra em CO2. Este é um feito extraordinário e motivo de grande orgulho para a nossa equipa portuguesa.

Este marco foi alcançado graças a uma caldeira elétrica inovadora, que gera vapor utilizando eletricidade. Esta caldeira funciona com praticamente nenhuma perda de energia, convertendo de forma eficiente energia solar e outras energias renováveis em vapor. Estamos empenhados em preparar todas as nossas fábricas a nível mundial para maximizar o uso de energia renovável. Aqui também, inovação e a sustentabilidade andam de mãos dadas.

 

Como é que a Continental tem lidado com as regulamentações ambientais cada vez mais rigorosas, especialmente em mercados como a União Europeia ou a América do Norte?

Investimos significativamente em investigação e desenvolvimento para criar produtos ainda mais sustentáveis, como pneus de baixas emissões e alta eficiência energética. Garantimos o cumprimento rigoroso de todas as regulamentações ambientais relevantes, incluindo as ambiciosas metas de redução de gases com efeito de estufa do European Green Deal. Além disso, acompanhamos o reforço das políticas dos Estados Unidos, lideradas pela Agência de Proteção Ambiental (Environmental Protection Agency – EPA).

Apoiamos plenamente os objetivos e as ambições do “tsunami de regulamentações” que estamos a atravessar. No entanto, a previsibilidade e a fiabilidade dessas regulamentações são cruciais para nós. As regulamentações devem considerar o impacto da carga administrativa que estão a impor às empresas. Por isso, é essencial um design inteligente da legislação. Acima de tudo, é necessário garantir condições justas de concorrência. São indispensáveis mecanismos de supervisão para evitar desvantagens competitivas para empresas como a Continental, que não abrem mão do cumprimento das regulamentações.

 

Como é que a Continental vê o futuro da mobilidade sustentável nos próximos 5 a 10 anos?

Os pneus desempenharão um papel cada vez mais relevante na minimização do impacto ambiental da mobilidade. Embora alguns conceitos básicos de um pneu permaneçam, como a resistência ao rolamento para otimizar o consumo de combustível, outros parâmetros sofrerão uma transformação significativa.

Com a eletrificação dos veículos em expansão, as emissões provenientes dos pneus tornar-se-ão mais relevantes. Isto é bastante desafiante, pois surgem novos desafios, como o desgaste do pneu.

A capacidade de inovação e o desempenho de excelência irão determinar os vencedores desta transformação.

A Continental está muito bem posicionada. Estou confiante de que continuaremos a prosperar num ambiente competitivo. O nosso objetivo é continuar a superar a indústria, ao mesmo tempo que geramos um impacto positivo no clima, na natureza e nas pessoas.