216 milhões de pessoas obrigadas a migrar até 2050 devido às alterações climáticas. Pacto Climático Europeu propõe soluções à UE e organiza debate

As alterações climáticas estão a moldar um novo cenário global de migrações, com milhões de pessoas a enfrentarem o risco de se tornarem refugiados ambientais devido a eventos climáticos extremos. Esta realidade foi destacada pelos embaixadores do Pacto Climático Europeu em Portugal, que apelam à União Europeia para que adote uma posição de liderança no apoio aos países mais vulneráveis, evitando assim crises humanitárias de grandes proporções e criando oportunidades económicas tanto para os países afetados como para a própria Europa.

Num comunicado enviado à Executive Digest, Duarte Costa, embaixador do Pacto Climático Europeu, sublinhou a importância da ação concertada da União Europeia no apoio às nações em desenvolvimento, defendendo que “a UE deve atuar de forma proativa para manter as populações nos seus territórios de origem, ajudando-as a adaptar-se às alterações climáticas”. Segundo o especialista, esta é “a única forma de garantir o desenvolvimento sustentável desses países e, ao mesmo tempo, evitar uma vaga massiva de migração que poderá ultrapassar a capacidade europeia de gestão e acolhimento”.

Cenário alarmante de migrações forçadas

O comunicado do Pacto Climático alerta que o futuro pode ser marcado por um aumento substancial de deslocações forçadas por razões climáticas. O Banco Mundial estima que, até 2050, 216 milhões de pessoas possam ser obrigadas a migrar, sendo que a Organização Internacional das Migrações (OIM) prevê que o número de refugiados ambientais atinja os 200 milhões. Estes números refletem uma crise iminente que, para Duarte Costa, “poderia ser mitigada se a Europa assumisse a liderança na promoção de uma economia verde nos países em desenvolvimento”.

As consequências das alterações climáticas — desde secas severas a inundações catastróficas, passando pela escassez de água e pelo aumento das temperaturas — afetam, em particular, as regiões mais pobres do mundo. Cecília Delgado, investigadora da Universidade Nova de Lisboa e também embaixadora do Pacto, destacou o impacto da crise climática nas desigualdades sociais e na segurança alimentar, alertando que “a fome e a pobreza extrema são fatores determinantes que podem desencadear migrações em massa”. Delgado referiu ainda que os desequilíbrios nos ecossistemas e a disputa por recursos naturais, como a água e a terra fértil, “exacerbam os conflitos e aumentam a pressão sobre as comunidades mais vulneráveis”.

União Europeia como agente de mudança

Duarte Costa defende que, para além de reduzir as suas próprias emissões, a União Europeia deve atuar de forma estratégica para apoiar a transição climática nos países em desenvolvimento. “A criação de mecanismos de cooperação económica baseados na sustentabilidade é crucial”, afirmou o embaixador, sublinhando que tal iniciativa beneficiaria ambas as partes. “A Europa tem a oportunidade de se internacionalizar e expandir a sua influência geoestratégica, ao mesmo tempo que ajuda a criar riqueza e estabilidade nas regiões mais afetadas pelas alterações climáticas”, acrescentou Costa.

Neste contexto, o desenvolvimento de parcerias económicas com base na transição energética e na economia verde pode ser uma das chaves para o futuro. Segundo Costa, estas novas dinâmicas não só impulsionariam o crescimento económico nos países parceiros, como também promoveriam a criação de empregos qualificados e oportunidades de investimento para empresas europeias. “A Europa tem tudo a ganhar ao apoiar a descarbonização de outros continentes, beneficiando da democratização dos seus sistemas políticos e criando alternativas à influência de potências autocráticas, como a China e a Rússia”, concluiu.

Um debate urgente: migrações traçadas pelo clima

O tema das migrações provocadas pelas alterações climáticas será amplamente discutido no painel “Fronteiras Invisíveis: Migrações Traçadas pelo Clima”, organizado pela ZERO, uma associação ambientalista que coordena o Pacto Climático Europeu em Portugal. O evento, que terá lugar no Festival TODOS em Lisboa a 14 de setembro, contará com a participação de figuras de destaque como Duarte Costa, Cecília Delgado, Rita Prates (da ZERO) e o jornalista Farid Ahmed Patwary, natural do Bangladesh.

Patwary trará ao debate o exemplo da ilha de Bhola, no Bangladesh, que em 1995 viu cerca de meio milhão de pessoas tornarem-se refugiados climáticos devido à subida do nível do mar. Este caso é considerado uma das primeiras vagas de refugiados climáticos da história recente e serve como um alerta para o que pode estar por vir se não forem tomadas medidas urgentes.

Rita Prates, da ZERO, reforçou a necessidade de “reduzir as emissões de gases com efeito de estufa e apoiar os países mais afetados através de mecanismos de mitigação e adaptação, como o Fundo Verde para o Clima e o recentemente aprovado Fundo de Perdas e Danos da COP28”. Segundo Prates, é fundamental que “a Europa e o mundo ajam agora para evitar que muitas regiões se tornem inabitáveis, forçando milhões de pessoas a abandonar as suas casas”.

O papel do Pacto Climático Europeu

O Pacto Climático Europeu, uma das principais iniciativas do Pacto Ecológico Europeu, tem como objetivo mobilizar cidadãos, empresas e instituições em torno de uma transição ecológica e sustentável. Através de projetos e parcerias, pretende-se reduzir a dependência de combustíveis fósseis e promover modos de vida que respeitem o meio ambiente.

Para Cecília Delgado, “o desafio não é apenas ambiental, mas também social e económico”. A investigadora sublinha que “a coerência entre os valores defendidos pela União Europeia e as suas práticas nos países mais afetados pelas alterações climáticas é crucial para garantir que a justiça climática se torne uma realidade”.

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