O que está em jogo no colapso do tráfego no Mar Vermelho: maiores companhias marítimas já se desviam da rota
Os ataques a navios no Mar Vermelho nas últimas semanas, a partir do Iémen controlado pelos rebeldes Houthis, deixaram de ser acidentes isolados e começaram a movimentar a ‘alta-roda’ do comércio internacional marítimo. Desde a passada sexta-feira, algumas das companhias marítimas mais importante do mundo – MSC, Maersk ou Hapag-Lloyd, às quais se juntaram a Evergreen e CMA CGM esta segunda-feira – anunciaram que pretendem desviar os seus navios para outras rotas.
A não ser que a comunidade internacional, liderada pelos Estados Unidos, decida intervir, estas perturbações levantam receios de um novo colapso comercial que não afetará apenas as matérias-primas energéticas.
O Mar Vermelho é uma rota comercial fundamental, na medida em que é uma passagem entre o Ocidente e a Ásia, sendo a forma mais rápida de ligar ambas as partes do mundo por mar (mais de 10% do comércio marítimo mundial passa pelas suas águas). Ao norte, comunicando com o Mar Mediterrâneo, o movimentado Canal de Suez. Ao sul, dando lugar ao Mar da Arábia, o estreito de Bab el-Mandeb, com cerca de 30 quilómetros de largura, tem sido palco privilegiado para os ataques dos Houthis.
A maior preocupação até agora tem sido demonstrada com o transporte de matérias-primas energéticas. O Mar Vermelho é um enclave fundamental para o transporte de petróleo e gás natural liquefeito (GNL) dos países árabes para o Ocidente. De acordo com o Departamento de Energia dos Estados Unidos (EIA), passaram pelo Estreito de Bab el-Mandeb cerca de 8,8 milhões de barris de petróleo por dia e cerca de 4,1 mil milhões de pés cúbicos por dia de gás natural liquefeito (GNL) durante o primeiro semestre de 2023. Em termos mais gráficos: 12% do petróleo transportado por mar em todo o mundo e 8% do gás.
A memória da guerra dos petroleiros na década de 80, com o Iraque e o Irão a atacar no Estreito de Ormuz, num contexto de guerra entre os dois países, voltou à mente de alguns analistas e operadores. Embora esse episódio, abortado na altura com a intervenção da marinha americana não tenha destabilizado o mercado petrolífero a longo prazo, conduziu a danos materiais significativos e a uma crise de segurança comercial, como pode ocorrer agora.
Esta segunda-feira, a BP decidiu suspender o trânsito das suas rotas programadas pelo Mar Vermelho, o que fez os futuros do petróleo subir instantaneamente, apresentando posteriormente aumentos de mais de 3,5%.
Mas não é só energia: aproximadamente 30% do comércio global de contentores passa pelo Canal do Suez. Os rebeldes Houthis garantiram que só atacariam navios com ligações a Israel mas as suas ofensivas já afetarem navios de diferentes nacionalidades que nem se dirigiam para Israel.
Coloca-se a questão: é seguro cruzar o Mar Vermelho? Rigzone Torbjorn Soltvedt, principal analista da ‘Verisk Maplecroft’ para o Médio Oriente e norte da África, foi claro. “Não”, garantiu. “A ameaça de interrupção do transporte marítimo no Mar Vermelho permanecerá elevada enquanto continuar a guerra entre Israel e o Hamas. O Irão procura evitar um confronto militar direto com Israel, mas ao mesmo tempo procura atacar indiretamente os interesses dos Estados Unidos e de Israel. Na prática, o Irão está a externalizar a sua resposta à sua rede de grupos armados na região. Os navios com ligações comerciais a Israel e aos Estados Unidos correm maior risco de serem atacados, mas o aumento das atividades Houthi no Mar Vermelho também representa uma ameaça ao transporte marítimo em geral”, detalhou.
Os ataques têm feito aumentar a pressão em torno dos Estados Unidos para intervir: no entanto, a Administração Biden está a ter o cuidado de promover uma escalada da guerra na região quando o desenvolvimento simultâneo da guerra na Ucrânia e em Gaza já complica o cenário geopolítico global.
O conflito em curso no Médio Oriente já fez com que alguns transportadores evitassem o Canal de Suez nas últimas semanas devido à insegurança e o aumento dos ataques dos rebeldes iemenitas, levou as companhias de navegação a evitar que as hostilidades afetem o tráfego de navios porta-contentores no Mar Vermelho. Esta medida significa acrescentar 40% à distância percorrida, mas a segurança tem prioridade. “Apesar das complicações que isso causaria aos nossos transportadores em termos de entrega e tempos de trânsito, o mais importante é o diálogo que mantemos com a tripulação nos nossos navios”, referiu fonte da indústria à ‘S&P Global Commodity Insights’. A solução: desviar navios ao redor do Cabo da Boa Esperança.
No entanto, uma viagem de ida e volta Ásia-Europa através do Canal de Suez leva cerca de 10 semanas, em comparação com cerca de 13 semanas ao redor do Cabo da Boa Esperança.
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