Morte de Odair Moniz: 22 detidos por violência e tumultos acabam libertados. PSP fala em “humilhação”

Após uma semana marcada por tumultos e violência, provocados pela morte de Odair Moniz na Cova da Moura, os incidentes parece ter acalmado, especialmente nos últimos dias. Ainda assim, contabilidade dos eventos mostra um saldo de uma vítima mortal, sete feridos — incluindo dois agentes da PSP e um motorista gravemente queimado em Santo António dos Cavaleiros — além de dezenas de viaturas, centenas de contentores e ecopontos destruídos em fogos postos.

Segundo dados oficiais fornecidos pela Direção Nacional da PSP, houve 155 ocorrências relacionadas, de forma direta ou indireta, com o caso de Odair Moniz. Estes incidentes, com predominância de fogo posto, resistência e danos materiais, resultaram em 22 detenções e a identificação de outros 23 suspeitos. Contudo, nenhuma das detenções resultou em prisão preventiva, uma medida que está a gerar insatisfação e críticas por parte das forças policiais.

Reação entre a PSP: “uma piada” e “uma humilhação”

A libertação dos suspeitos, em particular daqueles indiciados por fogo posto, foi acompanhada por uma ordem de restrição de uso de isqueiros. Esta medida foi recebida com consternação por muitos polícias, que a consideram “uma piada” ou até “uma humilhação” para a força policial. A falta de aplicação de medidas mais restritivas reforçou a frustração entre os agentes, que veem as ações judiciais como insuficientes para conter a gravidade dos atos cometidos e prevenir novas escaladas de violência.

Um agente da PSP que pediu anonimato afirmou que “estas medidas acabam por descredibilizar o esforço policial e limitam a ação preventiva que deveria estar em curso”. O sentimento de impotência perante a aparente ineficácia das sanções aplicadas tem alimentado um debate interno sobre a adequação das penas e a interpretação das leis em situações de desordem pública com elevados danos materiais.

A decisão de não aplicar prisão preventiva aos 22 detidos segue o disposto no Código Penal. Nos casos de vandalismo e dano, que são os crimes pelos quais a maioria dos detidos foi indiciada, a pena máxima prevista é de três anos de prisão. Este enquadramento legal não permite a aplicação da prisão preventiva, uma vez que tal medida é reservada para crimes de maior gravidade com penas superiores. A pena de até três anos prevista para estes casos tem, por isso, sido insuficiente para impor medidas de detenção mais severas, mesmo em situações de agitação social.

No entanto, segundo apurou o Correio da Manhã, os autores dos atos de maior gravidade, como os incêndios em autocarros, ainda não foram identificados nem detidos. Estes casos específicos, previstos no artigo 272.º do Código Penal como crimes de incêndio, implicam uma pena mais elevada, entre três e dez anos de prisão, e abrem a possibilidade para a aplicação de prisão preventiva.

A disparidade nas punições permitidas por diferentes qualificações de crime levanta questionamentos sobre a capacidade do atual Código Penal em responder a situações de vandalismo em larga escala, como a que se verificou na última semana. Um especialista em direito penal comentou que “as limitações impostas pelas atuais disposições do Código Penal obrigam a justiça a classificar muitos destes atos como danos, sem refletir a gravidade do impacto social e económico envolvido”.

A libertação dos detidos sem medidas mais restritivas deixou a PSP em posição delicada, enfrentando as reações negativas tanto da população quanto das próprias forças de segurança. As críticas internas reforçam a necessidade de uma revisão das disposições legais, que permita responder de forma mais adequada a incidentes de grande perturbação da ordem pública.