Mercenários ‘à moda’ Wagner já chegaram à europa: O plano do “Tenente Henry” na Roménia
A Roménia encontra-se numa das suas fases mais instáveis politicamente, marcada pela suspensão inédita da primeira volta das eleições presidenciais devido a alegações de interferência estrangeira. No epicentro desta controvérsia está Horatiu Potra, conhecido como “Tenente Henry”, uma figura que combina a notoriedade de um ex-membro da Legião Estrangeira com acusações de liderança de uma organização de mercenários ao estilo do grupo Wagner.
Horatiu Potra foi detido no último domingo em Bucareste, juntamente com 20 dos seus colaboradores, sob acusações de “posse ilegal de armas e munições” e “incitação pública”. As autoridades encontraram em sua posse uma pistola, facas e grandes somas de dinheiro em numerário. Segundo a imprensa local, o grupo planeava interferir numa manifestação contra o candidato presidencial de extrema-direita, Călin Georgescu. A lista de alvos de Potra incluía políticos e jornalistas críticos do candidato, que já polarizou a sociedade romena com as suas posições anti-OTAN e contra o apoio à Ucrânia.
Após dois dias de detenção preventiva, Potra foi libertado na terça-feira sob medidas de coação, incluindo o uso de uma pulseira eletrónica e a proibição de participar em reuniões públicas. Durante buscas às suas propriedades, as autoridades confiscaram mais de dois milhões de euros em várias moedas, o que intensificou as investigações sobre as suas atividades.
Călin Georgescu, o surpreendente candidato que avançou para a segunda volta das eleições presidenciais realizadas a 24 de novembro, tem negado qualquer ligação com Potra. Apesar disso, uma fotografia recente mostra ambos juntos, o que levou Georgescu a afirmar que não recorda os detalhes do encontro e a sublinhar que Potra não esteve envolvido na sua campanha. “Confio apenas nos homens que servem na Legião Estrangeira. O senhor Potra não é próximo de mim”, declarou o candidato.
As eleições, entretanto anuladas pelo Tribunal Constitucional devido a suspeitas de interferência russa, colocaram a Roménia numa posição delicada. A agência de inteligência externa do país (SIE) revelou ataques híbridos atribuídos a atores patrocinados pelo Kremlin, incluindo ciberataques e tentativas de manipulação de dados eleitorais. Georgescu tornou-se alvo de investigações devido ao uso de TikTok como principal plataforma de campanha, onde uma conta ligada a apoiantes do candidato terá investido 381.000 dólares para promover conteúdos favoráveis.
Ligações de Potra a operações em África e alegados vínculos à Rússia
Embora Potra negue qualquer ligação ao grupo Wagner, há registos de que trabalhou para o governo da República Centro-Africana, em 2016, como treinador de guarda-costas da presidente Faustine Touadéra, num contrato financiado por entidades russas. Além disso, documentos das Nações Unidas apontam que, em 2022, Potra teria liderado uma operação militar privada no Congo, através de uma empresa local chamada Congo Protection. A missão incluía a contratação de cerca de mil cidadãos romenos e moldavos para proteger infraestruturas estratégicas e treinar soldados congoleses.
A sua atuação em África também incluiu colaborações com Frank Timiș, um magnata de origem romena envolvido em exploração mineira, e com passagens por várias controvérsias relacionadas com corrupção.
A suspensão das eleições presidenciais representa um evento inédito para uma democracia europeia e sublinha os desafios enfrentados pela Roménia numa conjuntura de crescente divisão social. “Não vimos algo desta magnitude desde 1989”, afirmou Radu Delicote, analista da Smartlink Communications. Segundo ele, a repetição das eleições em fevereiro de 2025 requer medidas urgentes para garantir a confiança pública no sistema eleitoral.
Oana Popescu-Zamfir, investigadora do European Council on Foreign Relations, alerta para a necessidade de maior resiliência contra ameaças externas. “Sem medidas eficazes, o país pode enfrentar novamente os mesmos desafios”, enfatiza, defendendo uma resposta rigorosa das autoridades.
À medida que as investigações avançam, a figura do tenente Henry continua a suscitar questões sobre o papel de mercenários e interferências estrangeiras no processo político romeno, colocando o país num estado de alerta permanente quanto à integridade das suas instituições democráticas.