Meloni, a ‘encantadora’ de Trump: A relação espacial dos dois líderes e o que cada um tem a ganhar (e a perder)

A relação entre a primeira-ministra italiana, Giorgia Meloni, e o presidente norte-americano Donald Trump tem gerado atenção global, apresentando-se como uma parceria estratégica que poderá redefinir as dinâmicas transatlânticas. Meloni, que marcou presença na cerimónia de posse de Trump como única líder europeia convidada, destacou-se como um dos aliados mais próximos do novo inquilino da Casa Branca. Esta posição reforça a sua relevância no cenário político internacional, mas também coloca Itália perante desafios consideráveis no equilíbrio entre interesses nacionais e compromissos europeus.

Donald Trump tem elogiado Meloni como “uma mulher fantástica que está a conquistar a Europa”. Por sua vez, a líder italiana descreve Trump como “um defensor forte e astuto do Ocidente”, destacando a sua capacidade para equilibrar diplomacia e dissuasão em conflitos geopolíticos, como a guerra na Ucrânia. “Trump tem a habilidade de forçar Vladimir Putin à mesa de negociações”, afirmou Meloni após uma visita a Mar-a-Lago, residência privada de Trump na Florida.

Edmondo Cirielli, vice-ministro italiano dos Negócios Estrangeiros e membro do partido Irmãos de Itália, enfatizou a importância desta ligação. “Trump escolheu Meloni pela sua credibilidade, fiabilidade e pela estabilidade do nosso governo como interlocutor preferencial na União Europeia. Isto será útil para Itália e para a própria UE”, disse em declarações à Reuters.

A aproximação entre Meloni e Trump oferece vantagens para Itália, incluindo a possibilidade de mitigar eventuais tensões comerciais. Itália registou um excedente comercial de 42,1 mil milhões de euros com os Estados Unidos em 2023, tornando-se especialmente vulnerável a tarifas que Trump pode impor na tentativa de reduzir o défice comercial norte-americano.

No entanto, esta aliança traz também riscos significativos. Segundo Francesco Galietti, fundador da consultora Policy Sonar, Meloni enfrenta uma “posição desconfortável”. Embora os laços com Trump possam ser benéficos, alinhar-se demasiado com o líder norte-americano pode isolar Itália no contexto europeu e enfraquecer a posição de Meloni junto de Bruxelas.

A opinião é partilhada por Nathalie Tocci, diretora do Instituto de Assuntos Internacionais (IAI), que afirma que Meloni mantém uma postura instintivamente eurocética. “Pensar que ela irá priorizar os interesses da Europa em detrimento dos de Itália é ingénuo”, disse.

A questão da defesa e os desafios da NATO
Outro ponto sensível nas relações entre Itália e os Estados Unidos é o orçamento de defesa. Enquanto a NATO exige que os países membros invistam 2% do PIB em despesas militares, Trump tem defendido um aumento para 5%. Itália, no entanto, permanece nos 1,5%, devido à sua elevada dívida pública.

Embora Meloni tenha procurado reforçar a posição italiana, analistas como Arturo Varvelli, do Conselho Europeu de Relações Externas, acreditam que “ser amiga de Trump não será suficiente para evitar críticas de Washington”.

Outro aspeto notável na estratégia de Meloni é a sua relação com Elon Musk, fundador da Starlink. O governo italiano está em negociações para um contrato de cinco anos com a empresa de Musk, avaliado em 1,5 mil milhões de euros, destinado a assegurar comunicações via satélite para uso militar e diplomático.

Embora Meloni tenha descrito Musk como “um génio precioso”, esta parceria levanta questões sobre a compatibilidade com os interesses europeus, dado que a UE planeia lançar o seu próprio sistema de satélites, o IRIS2, em 2030. “Investir tanto na Starlink dificulta a transição para o sistema europeu no futuro”, alertou Tocci.

A relação entre Meloni e Trump pode moldar o futuro das relações transatlânticas, mas também desafia a unidade europeia. Enquanto Meloni procura posicionar Itália como um ator-chave, terá de equilibrar interesses nacionais com as expectativas de parceiros europeus e as exigências norte-americanas.

À medida que esta aliança evolui, resta saber se a parceria entre os dois líderes se consolidará como uma força estabilizadora ou como um fator de maior divisão no cenário político internacional.