“Irritados e com razão”: Europa está furiosa com decisão de Charles Michel em abandonar presidência do Conselho Europeu
A decisão de Charles Michel em abandonar a presidência do Conselho Europeu apanhou a Europa de surpresa: a vontade de concorrer ao Parlamento Europeu vai implicar, se for eleito, uma tomada de posse em meados de julho, muito antes de terminar o seu mandato como presidente, em novembro.
As críticas não demoraram: “É algo absolutamente escandaloso de se ter feito”, salientou Andrew Duff, do Centro de Política Europeia, em declarações à publicação ‘POLITICO’. Em Bruxelas, enquanto a Europa assiste a duas guerras à sua porta, a decisão de Michel foi vista como um sinal de que o político belga, de 48 anos, se preocupa mais com as suas perspetivas futuras do que com a sua função atual. Além disso, a sua saída coloca a possibilidade de Viktor Orbán, primeiro-ministro próximo de Moscovo possa dirigir as reuniões do Conselho Europeu – recorde-se que a Hungria vai assumir a presidência rotativa do Conselho da UE no segundo semestre de 2024.
De acordo com vários diplomatas e funcionários da UE, contactados pelo ‘POLITICO’, pode haver um conflito de interesses: Michel estaria a concorrer a um cargo enquanto desempenhava outro. Assim, colocou-se a questão se não seria melhor demitir-se imediatamente após as eleições europeias – entre 6 e 9 de juho – ou mesmo antes.
A decisão causou ressentimento em Bruxelas. “O resultado é que é pouco provável que o Conselho Europeu se deixe sequestrar. É bastante hipócrita e desrespeitosa com o papel do Conselho Europeu.”
Charles Michel terá alertado os líderes da UE para estes não serem apanhados desprevenidos, por email ou diretamente. Mas, agora, Michel enfrenta uma reação cada vez maior sobre a forma como informou aos líderes que concorreria como candidato. O antigo primeiro-ministro belga anunciou publicamente a sua decisão no passado sábado, em entrevistas aos meios de comunicação belgas.
Mas um dos responsáveis da UE repreendeu essa versão dos acontecimentos, dizendo que Michel apenas conversou adequadamente sobre a decisão com o seu amigo, o presidente francês Emmanuel Macron, ao mesmo tempo que apenas enviou um e-mail para os escritórios de outros líderes europeus, deixando “todos eles chateados, e com razão”.
“Os Estados-membros não foram consultados antecipadamente sobre a decisão de Michel. Obviamente, as capitais não acharam graça por terem sido informadas ao mesmo tempo que os meios de comunicação social começaram a noticiar”, indicou um diplomata.
Há receios sobre se Michel utilizará as possibilidades do seu atual cargo para fazer campanha, a nível pessoal e orçamental, alertaram dois responsáveis da UE. “O seu historial não é particularmente bom nesse campo, por isso podemos sentir que as capitais estão a ficar nervosas”, salientou um segundo responsável, indicando as críticas sobre as consideráveis despesas de viagem de Michel.
Após as eleições europeias, o cenário fica mais complicado: os líderes europeus vão reunir-se a 17 de junho e novamente em 27 e 28 de junho para discutir um substituto para Michel. A decisão do político belga teve, para já um efeito imediato: ele pressionou por uma discussão sobre a chamada “Agenda Estratégica”, as prioridades legislativas para os próximos anos. Agora os líderes estão relutantes em continuar a discussão, porque grande parte desta legislação envolveria o Parlamento Europeu e ele provavelmente será um eurodeputado.
O primeiro-ministro luxemburguês, Luc Frieden, referiu que o primeiro-ministro belga, Alexander de Croo, cujo país ocupa a presidência rotativa do Conselho da UE até o final de junho, poderia assumir o papel de Michel, ou que os líderes poderiam nomear um candidato interino para terminar o mandato, o que daria tempo para discutir todo o pacote de cargos de topo europeus.
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