“Invisto tempo e esforço para estabelecer a equipa certa à minha volta”, assegura Ricardo Cupido

Ricardo Cupido fez recentemente a transição do cargo (Managing Director Asia) para uma nova posição de VP International Commercial Strategy Director, baseado em Amesterdão. Na Brown-Forman Asia, subsidiária da empresa internacional que detém, entre outras, Jack Daniel’s, Gin Mare, Woodford Reserve, Diplomatico Rum ou The Glendronach, liderou um grupo de mais de 18 países na região asiática, o que representou a maior oportunidade de crescimento para a empresa a nível global.
Antes dessa função, Ricardo actuou como vice-presidente e gerente geral para os mercados polaco e turco, onde a empresa ganhou vários reconhecimentos a nível de empregador, ética e conformidade
Antes de ingressar na Brown-Forman, trabalhou para a Seagram’s, a Pernod-Ricard Group e a Russian Standard Vodka, tendo trabalhado e vivido em vários países, ocupando cargos regionais e globais.
Ricardo Cupido sempre foi um defensor da cultura portuguesa onde quer que o trabalho o leve, tendo sido membro da Câmara de Comércio Luso-Polonesa e da Associação de Portugueses em Singapura. É também membro do Conselho da Diáspora Portuguesa desde Dezembro de 2022.

O que diz ricardo…
A indústria de espirituosos tem demonstrado bastante resiliência ao longo das décadas.

Como surgiu o desafio de trabalhar para a Brown-Forman em Singapura?
Já trabalho no estrangeiro há mais de 20 anos, com esta empresa há cerca de 14. A Ásia foi sempre uma região que me fascinou pela sua diversidade cultural e pelas oportunidades intermináveis de fazer negócios e crescimento. Quando comecei a trabalhar para a Brown-Forman percebi que com o portefólio de whiskey forte que temos, a Ásia era uma região largamente inexplorada pela empresa. E de imediato levantei a mão para qualquer oportunidade que aparecesse. Depois de nove anos na Polónia, onde fiz a transição do Marketing para General Management e onde geria os mercados da Polónia e Turquia, apareceu a oportunidade de ir para Tóquio gerir os mercados do Japão, Coreia do Sul e Taiwan. A ideia era transformar radicalmente a rota de mercado nestes países com o intuito de captar quota de mercado.

Aceitou de imediato? Porquê?
Evidentemente aceitei sem pensar muito. Aliás toda a família ficou muito excitada com a oportunidade. Sempre incutimos aos miúdos o desejo de conhecer o mundo e têm tido a oportunidade de crescer num ambiente totalmente internacional. Apesar de ser na altura um cluster de mercados com menos importância do que os que tinha na minha responsabilidade, aceitei ir para o Japão pois propiciava a oportunidade de transformação total, desde a definição da direcção estratégica até à implementação, que é uma das coisas que adoro fazer e penso que faz parte da minha “marca”. Um ano depois de estar em Tóquio e de ter lançado de raiz a Brown-Forman Taiwan, a empresa ofereceu-me a oportunidade de ir para Singapura responsável por todos os mercados asiáticos e estabelecer os novos headquarters para a região. Apesar de estarmos em plena crise COVID-19, foi uma proposta que simplesmente não pude recusar.

Quais as suas principais funções?
Como Managing Director para a Ásia tive total responsabilidade sobre o negócio na região. São mais de 15 mercados, dos quais nos cinco maiores temos empresas de distribuição própria e nos outros temos distribuidores seleccionados, uma equipa de mais de 300 colaboradores espalhados por oito escritórios, e um volume de negócios de mais de 200 milhões de dólares. A minha equipa principal conta com as funções de marketing, comercial, finanças e recursos humanos, mas a equipa alargada inclui a área de supply chain, legal, relações externas, D&I e IT. O meu papel nestes últimos anos foi o de criar uma visão para a região e cada mercado em particular, que estabelece as prioridades em termos de rota de mercado, portefólio e organização que vai estabelecer as bases que permitam que as nossas marcas cresçam na Ásia.

O que mais o fascina na indústria em que trabalha?
Penso que a indústria de espirituosos me atraiu cedo quando comecei a trabalhar para a Seagram Portugal em 1999, principalmente por ser uma indústria que tem demonstrado bastante resiliência ao longo das décadas. Além do mais é uma indústria que tem vindo a evoluir bastante, entrando cada vez mais em áreas premium e está hoje mais perto dos modelos de gestão das grandes FMCG. O que mais me atrai, no entanto é a capacidade de criar marcas que se diferenciam, propiciam experiências e vivências únicas aos consumidores e tem um valor extrínseco extremamente elevado.

Como é o seu dia-a-dia de trabalho?
Com as responsabilidades que tenho, a grande maioria do tempo é passado a falar com pessoas e a gerir situações relacionadas com pessoal. Estando longe da sede nos EUA, também invisto bastante tempo a gerir stakeholders, para assegurar que as equipas estão a trabalhar na direcção certa e para que não haja surpresas. Para além disso tento sempre que possível fazer visitas de mercado, gosto de estar “on the ground”, ver com os meus olhos os consumidores, as lojas e a concorrência. É algo fundamental para se ter um sentimento do que se está a passar nos mercados e ajudar as equipas locais a agarrar todas as oportunidades ou a sobrepor obstáculos que apareçam. Na nossa indústria que está altamente regulada, há a necessidade de passar algum tempo em reuniões da indústria, estabelecer relações com autoridades governamentais, câmaras de comércio e outros organismos que possam ajudar a remover barreiras de negócios.

Quais as principais diferenças ao nível da metodologia de trabalho que encontrou ao mudar-se para a Ásia?
Creio que as diferenças são substanciais quando comparadas com a Europa ou o Ocidente. Cada país tem as suas peculiaridades, mas acredito que a Ásia está mais focada no bem da comunidade e os funcionários têm uma abordagem menos individualista. A colaboração surge de forma mais natural, no entanto, como gestor ocidental, tem de se fazer um esforço muito mais consciente para ouvir e dar espaço para os outros falarem. Devido à natureza mais hierarquizada das sociedades, os colaboradores são mais reservados em dar a sua opinião. Além disso, sinto que os asiáticos aproveitam qualquer oportunidade ou desafio com igual paixão para vencer. São mercados extremamente competitivos e se estabelecerem objectivos ambiciosos e claros as equipas farão de tudo para que isso aconteça. Quando regresso sinto que a Europa em geral, e Portugal em particular, perderam esse “impulso” e paixão pela transformação e crescimento. A mentalidade de crescimento está bem viva na Ásia.

O que é que a Ásia lhe tem ensinado sobre Gestão de Pessoas?
Hoje, fala-se muito sobre diversidade e inclusão, e isso muitas vezes gira em torno de determinados grupos. O meu percurso ao longo dos anos, mas particularmente na Ásia, fez-me pensar que o mundo é complexo, muito diversificado e exige um esforço real para garantir que todos se sintam incluídos e dêem o seu melhor para o trabalho. A Ásia é uma cultura de alto contexto e é muito difícil compreender a fundo os problemas com que as pessoas estão a lidar ou o que realmente pensam sobre um determinado assunto. Coisas como a hierarquia, o espírito de comunidade ou a homogeneidade da sociedade podem dificultar muito a forma como uma empresa ocidental faz negócios na Ásia. Aqueles que têm sucesso compreendem em profundidade as nuances de todas as diferentes culturas da região da Ásia e adaptam a sua cultura empresarial em conformidade.

Qual a sua filosofia de Gestão?
Sou um grande fã dos conceitos de “empowerment” e “high performing teams”. Invisto tempo e esforço significativos para estabelecer a equipa certa à minha volta e, em seguida, construir elevados níveis de confiança, responsabilidade conjunta e forte clareza nas formas de trabalhar. Uma vez feito isto, podemos concentrar-nos em estabelecer uma visão para o nosso mandato e assegurar que todos fazem a sua parte. As minhas equipas geralmente vêem-me mais como alguém que pode aconselhar e orientar, ajudar a estabelecer objectivos ou visões a longo prazo, mas não me verão a gerir as questões do dia-a-dia.

Estando a viver longe de Portugal, como é que “mata saudades” do nosso País?
Não é fácil. O que mais me falta são os pratos e doces mais tradicionais. Mas vamos encontrando comunidades portuguesas ou amantes de Portugal espalhados pelo mundo, e lá se matam saudades com algum improviso. Tento vir a Portugal pelo menos uma vez por ano para estar com os meus pais a quem devo a educação que tive e que incutiram em mim este desejo de correr mundo.