Haiti assinala os 15 anos do terramoto que matou mais de 300 mil pessoas e transformou gerações

Este domingo, assinalam-se 15 anos desde o devastador terramoto que abalou o Haiti em 2010, destruindo infraestruturas, interrompendo vidas e deixando marcas profundas em gerações inteiras. Às 16h53 locais (21h53 em Lisboa), a terra tremeu em Port-au-Prince, a capital haitiana, durante quase um minuto. O sismo, com magnitude 7, causou mais de 316 mil mortes e deixou mais de 1,5 milhões de pessoas desalojadas, num cenário de destruição que incluiu escolas, hospitais e edifícios governamentais.

Uma geração inteira de crianças cresceu em meio ao caos, com as suas vidas moldadas por deslocações constantes, crises prolongadas e interrupções educacionais. A organização Save the Children sublinha que as crianças haitianas, particularmente as que nasceram após o terramoto, continuam a sofrer os efeitos deste desastre.

“Para muitas crianças no Haiti, a vida tem sido uma sucessão de crises. Desde furacões e terramotos até à violência desenfreada que vemos atualmente, muitas famílias foram deslocadas até dez vezes nos últimos 15 anos. Hoje, grupos armados transformaram Port-au-Prince numa prisão a céu aberto para as crianças. Nenhuma área da cidade é segura”, afirmou Chantal Sylvie Imbeault, diretora da Save the Children no Haiti.

Cassandra, de 17 anos, é uma das crianças que vive as consequências diretas da tragédia. Deveria estar a preparar-se para se formar este ano, mas a sua educação foi novamente interrompida, desta vez devido à escalada de violência em Port-au-Prince. “De acordo com a minha mãe, o terramoto afetou-nos profundamente. Tivemos de dormir ao relento em condições muito difíceis. Deveria concluir a escola aos 18 anos, mas perdi dois anos de aulas – um por causa do terramoto e outro por causa da violência. É doloroso”, lamenta.

Atualmente, Cassandra vive com a mãe num abrigo superlotado, numa sala de aula que partilham com 35 outras pessoas. “Ouvimos os tiros cada vez mais próximos. Não me sinto segura em nenhum momento. O espaço é tão limitado que não conseguimos lidar com o que está a acontecer”, conta.

Desde 2010, o Haiti tem enfrentado uma série de crises que dificultam a recuperação. Em 2021, mais de 700 mil pessoas foram deslocadas devido à violência de grupos armados, que também obrigaram ao encerramento de cerca de mil escolas em todo o país. Os conflitos restringem a entrega de ajuda humanitária, aumentam os preços dos bens essenciais e agravam a fome, levando muitas crianças a juntarem-se a grupos armados em busca de proteção e alimento.

Chantal Imbeault destaca que muitos líderes dos atuais grupos armados eram crianças em 2010, cujas vidas foram profundamente afetadas pelo terramoto. “O futuro dessas crianças foi destruído no pós-terramoto, e agora estão a criar um novo ciclo de sofrimento. A educação é a única esperança para muitas crianças haitianas. A comunidade internacional deve agir de forma urgente para garantir que estas crianças tenham uma oportunidade de aprender e construir um futuro melhor.”

A Save the Children, presente no Haiti desde 1978, tem estado na linha da frente na resposta a emergências humanitárias no país. A organização trabalhou durante a crise do terramoto de 2010, a epidemia de cólera subsequente, o furacão Matthew em 2016 e outro terramoto em 2021. Atualmente, fornece assistência financeira para ajudar famílias deslocadas a encontrar soluções habitacionais dignas e permitir que escolas possam retomar as atividades educativas.

Além disso, a organização atua em parceria com comunidades locais nas regiões de West, Grand’Anse e South, incluindo Les Cayes, para promover acesso à educação de qualidade e apoio psicossocial aos estudantes mais vulneráveis.

A Save the Children apela à comunidade internacional para aumentar significativamente o financiamento humanitário destinado ao Haiti e para garantir acesso irrestrito a trabalhadores humanitários e ajuda essencial, particularmente em Port-au-Prince. “O mundo precisa de agir agora para impedir que a história se repita e para proteger as crianças haitianas do ciclo de violência e desespero”, concluiu Chantal Imbeault.

Enquanto o Haiti assinala os 15 anos da tragédia, o país continua a lutar contra os seus efeitos duradouros, numa jornada que simboliza a resiliência do seu povo e a necessidade urgente de solidariedade internacional.