França: Fracassa moção de censura ao novo governo de François Bayrou (graças à abstenção da maioria dos deputados)

A tentativa de censurar o governo de François Bayrou na Assembleia Nacional de França fracassou esta semana, revelando a profunda divisão política no país e consolidando Marine Le Pen como a figura-chave para a estabilidade. Após um debate parlamentar aceso, que se prolongou por mais de duas horas e meia, apenas 131 deputados, oriundos da extrema-esquerda, do Partido Comunista e de grupos ecologistas, votaram a favor da moção de censura.

A moção necessitava de 289 votos, num parlamento composto por 577 deputados, para derrubar o executivo liderado por Bayrou, em funções desde 13 de dezembro. Contudo, a esmagadora maioria – 446 deputados – optou pela abstenção, deixando o governo a salvo e expondo o que foi descrito por analistas como “um campo de ruínas políticas”.

Nos termos da Constituição francesa, apenas os votos favoráveis à censura são contabilizados, com os restantes deputados a absterem-se de votar. O líder da França Insubmissa (LFI), Manuel Bompard, justificou o voto contra o governo afirmando que Bayrou lidera um executivo que “se inventa negociações onde os adversários são sempre perdedores”. Em resposta, François Bayrou acusou os promotores da moção de quererem fomentar “uma guerra interna permanente contra a integridade do país”.

Divisões entre os partidos de esquerda
O Partido Socialista (PS), representado por Olivier Faure, optou por não apoiar a censura nesta ocasião, mas deixou em aberto a possibilidade de mudar de posição futuramente, especialmente durante a discussão dos próximos orçamentos do Estado. “Desta vez, não vamos censurar. No futuro, tudo dependerá do comportamento do governo”, afirmou Faure.

A decisão socialista desencadeou críticas severas de Jean-Luc Mélenchon, líder da LFI, que acusou os socialistas de fragmentar a esquerda: “Os socialistas dividiram e fracturaram as esquerdas.”

Já Elsa Faucillon, do Partido Comunista Francês (PCF), justificou o apoio à censura devido à falta de diálogo por parte do governo: “Os comunistas apresentaram propostas, mas o governo não quer saber.” Por sua vez, Cyrielle Chatelain, porta-voz dos ecologistas, criticou a política económica, social e ambiental do executivo, considerando-a “nos antípodas das nossas posições”.

Apoio à estabilidade versus críticas à gestão
No campo da direita tradicional, representada por Michèle Tabarot, o posicionamento foi claro: rejeição da moção em nome da estabilidade do país. “França está em crise e precisa de estabilidade”, sublinhou Tabarot, numa posição partilhada pelos partidos centristas que apoiam o governo de Bayrou e o presidente Emmanuel Macron.

Por outro lado, Sébastien Chenu, da Agrupação Nacional (AN), liderada por Marine Le Pen, destacou com ironia que a estabilidade de França está agora nas mãos da extrema-direita. “O que há para censurar esta tarde? Nada mais do que um rosário de vaguidades e imprecisões”, afirmou Chenu, sugerindo que o momento adequado para julgar o governo será após a apresentação das suas propostas concretas, nomeadamente no que toca à reforma das pensões.

A questão da reforma das pensões, um tema sensível para a sociedade francesa, promete ser central nos próximos meses. A oposição, incluindo extrema-esquerda, comunistas, ecologistas e extrema-direita, convergem na defesa da restauração da idade da reforma aos 60 anos, em oposição às intenções do governo de Bayrou.

Com a rejeição da primeira moção de censura, o governo inicia uma fase delicada, enfrentando uma “corrida de obstáculos”, como descrito por analistas. Quando os próximos orçamentos forem apresentados, a ameaça de uma nova tentativa de censura será iminente, desta vez com Marine Le Pen como figura central na definição da estabilidade política em França.