Emergência com antibióticos: ‘Superbactérias’ serão responsáveis por até 40 milhões de mortes nos próximos 25 anos, alerta especialista
A ameaça crescente da resistência antimicrobiana (RAM) está a colocar em risco a saúde global, podendo resultar na morte de até 40 milhões de pessoas nas próximas duas décadas e meia. Esta é a advertência de Dame Sally Davies, antiga diretora médica de Inglaterra, que tem sido uma voz proeminente na luta contra o aumento de “superbactérias”.
Em declarações ao Observer, Davies destacou que procedimentos médicos comuns, como cirurgias e partos, podem tornar-se perigosamente arriscados devido à propagação de bactérias resistentes aos antimicrobianos. “Cerca de um milhão de pessoas morrem todos os anos por causa da RAM, e esse número aumentará nos próximos 25 anos”, afirmou. “É realmente assustador.”
Estudos indicam que, até 2050, o número de mortes devido à RAM poderá duplicar, com especial incidência nos idosos, que se encontram mais vulneráveis devido a condições crónicas de saúde.
Apesar de alguns dados promissores – como a diminuição da RAM entre crianças com menos de cinco anos – o cenário é alarmante para os mais velhos. Desde 1990, a mortalidade por RAM na faixa etária acima dos 70 anos aumentou 80%. “À medida que a população envelhece e mais pessoas vivem com doenças crónicas, a vulnerabilidade à RAM cresce”, explicam os investigadores.
O uso indiscriminado de antibióticos no setor pecuário contribui significativamente para a evolução da RAM. Aproximadamente 70% dos antibióticos globais são administrados a animais de criação, como vacas, galinhas e ovelhas, como alternativa barata para promover o crescimento ou prevenir doenças.
“Estamos a lançar antibióticos aos animais como uma solução fácil, o que permite aos micróbios desenvolverem resistência”, alertou Davies. Esta resistência pode então espalhar-se globalmente, agravada por más infraestruturas, como sistemas de esgoto inadequados em hospitais, permitindo que bactérias resistentes se infiltrem nos cursos de água e se disseminem através dos ventos.
O desafio da inovação em antibióticos
A rápida multiplicação e mutação das bactérias fazem com que a resistência se propague facilmente. “Bactérias multiplicam-se a cada 20 minutos e podem transferir resistência a outras bactérias”, explicou Davies. Esta realidade sublinha a urgência em evitar o uso indevido de antibióticos e em desenvolver novos fármacos.
No entanto, o desenvolvimento de novos antibióticos enfrenta obstáculos significativos. “Não há novas classes de antibióticos em uso rotineiro desde o final dos anos 80”, lamentou Davies. O modelo de mercado atual não incentiva a criação de novos antibióticos, pois estes são usados esporadicamente, ao contrário de medicamentos para a pressão arterial ou cancro, que oferecem maiores lucros às farmacêuticas.
Apesar do reconhecimento do problema pelo G7, Davies insiste que as ações tomadas até agora são insuficientes. “Os problemas não são intransponíveis, mas é necessário abordá-los com uma urgência maior”, enfatizou. A resistência antimicrobiana é uma crise que requer atenção imediata para evitar uma catástrofe de saúde pública.