Denúncias no CES: Comissão Independente regista “padrões de conduta de abuso de poder e assédio”
Foi hoje apresentado o relatório, feito por uma Comissão Independente (CI), sobre as situações de assédio moral e sexual alegadamente ocorridas no Centro de Estudos Sociais (CES), em Coimbra, e que visam o investigador e docente universitário português Boaventura Sousa Santos, bem como outro investigador, Bruno Sena Martins. A comissão relata que as denúncias feitas “indiciam padrões de conduta de abuso de poder e assédio”, por parte de elementos com poder no CES.
No relatório, citado pela SIC, é referido que a “documentação apresentada e as audições realizadas, tanto de pessoas denunciantes como de pessoas denunciadas, não permitiram esclarecer indubitavelmente a existência ou não da ocorrência de todas as situações comunicadas à CI”.
No entanto, ressalva o organismo que, mediante análise de toda a informação reunida, bem como das versões entre as pessoas denunciantes e denunciadas, os dados recolhidos, “indiciam padrões de conduta de abuso de poder e assédio por parte de algumas pessoas que exerciam posições superiores na hierarquia do CES”.
Na sequência de denúncias públicas de situações de assédio moral e sexual alegadamente ocorridas no Centro de Estudos Sociais (CES), e da constituição de uma Comissão Independente para o esclarecimento destas situações, a direção do CES apresentou esta terça-feira o relatório e as conclusões do trabalho desta Comissão, precisamente no CES.
A entrega do relatório, que estava prevista para finais de dezembro, acabou por ser adiada até ao final de fevereiro.
“O pedido de adiamento por parte da Comissão Independente decorre da elevada quantidade e complexidade da documentação recebida até recentemente”, justificou na altura o CES.
Numa nota publicada na página de internet, o CES esclareceu que a prorrogação, por dois meses, do prazo de entrega do relatório final de trabalhos foi aprovada pela direção, em reunião do dia 15 de dezembro de 2023, a pedido da Comissão Independente.
Três investigadoras que passaram pelo CES da Universidade de Coimbra denunciaram situações de assédio num capítulo do livro intitulado “Má conduta sexual na Academia – Para uma Ética de Cuidado na Universidade”, o que levou a que os investigadores Boaventura Sousa Santos e Bruno Sena Martins acabassem suspensos de todos os cargos que ocupavam no CES.
O CES acabou por criar uma Comissão Independente, que iniciou funções a 01 de agosto e estipulou que as denúncias de alegadas situações de assédio deveriam ser submetidas até 30 de setembro.
Em outubro do ano passado, a Comissão Independente informou a Lusa, via e-mail, que os resultados finais do processo seriam comunicados publicamente até ao final do ano de 2023.
Na nota publicada a poucos dias do final do ano passado, o CES informava que a possibilidade de extensão do prazo para a entrega do relatório “já havia sido prevista pelas duas partes aquando da constituição da Comissão”.
“A direção do CES reitera a sua vontade de promover o esclarecimento das situações publicamente relatadas e vê esta prorrogação como fundamental para garantir um processo rigoroso e uma análise cuidada de toda a documentação”, sustentava.
Após a polémica estalar, surgiram denúncias de outras mulheres que alegam ter sido vítimas de assédio por parte de Boaventura Sousa Santos, como os casos de uma investigadora brasileira ou uma ativista dos direitos pela recuperação de terras indígenas, Moira Ivana Mílan.
O Ministério Público (MP) acabou por não investigar o processo na altura, uma vez que não chegou à justiça qualquer queixa relacionada com os visados do CES.
Vítimas pedem: “Não nos silenciem”
Ainda na semana passada, passado um ano das revelações, o coletivo de mulheres que denunciou casos de assédio de Boaventura Sousa Santos enviou uma carta aberta em que exigia ter acesso à investigação conduzida pelo CES.
“Não recebemos até agora qualquer resposta em relação à avaliação das nossas denúncias, nem qualquer compromisso de virmos a receber o relatório elaborado pela comissão independente”, relata o grupo que pede: “Não no silenciem””.
O grupo pedia acesso antecipado ao relatório e mudança no formato de divulgação das conclusões, querendo que estivesse disponível online. O segundo pedido foi negado pelo CES.
“Enquanto denunciantes, teremos oportunidade de conhecer a validação ou não validação das nossas narrativas sobre a violência que sofremos semanas depois do relatório estar concluído e ao mesmo tempo que a comunicação social e o público em geral. O CES recusou o pedido do coletivo de divulgar online o relatório, sabendo que a maioria das vítimas reside fora de Portugal e não tem condições materiais e emocionais para se deslocar às instalações da instituição”, comentou o coletivo sobre os pedidos e respostas recebidas.