Como o Irão perdeu 50 mil milhões de dólares na roleta da geopolítica com o colapso da influência na Síria
O regime de Bashar al-Assad na Síria caiu, e Damasco foi capturada de forma relâmpago por insurgentes islamistas, marcando um dos maiores reveses geopolíticos para o Irão. O colapso definitivo do governo sírio deixou o presidente exilado em Moscovo e transformou o tabuleiro político regional, congelado durante quase uma década. Este desenvolvimento sublinha a magnitude das perdas financeiras e estratégicas de Teerão, estimadas entre 30 e 50 mil milhões de dólares, segundo cálculos de analistas e think tanks internacionais. Estas somas representam uma fração significativa do orçamento nacional iraniano, que em 2024 ronda os 65 mil milhões de dólares.
Desde o início da guerra civil síria, o Irão investiu intensamente em apoio militar e financeiro ao regime de Bashar al-Assad. “A Síria é uma peça importante do quebra-cabeças para o Irão”, explicou Michael Horowitz, chefe de inteligência da consultora LeBeck International. A geografia síria permitia a Teerão projetar poder no Médio Oriente e consolidar um corredor terrestre que ligava o Irão ao Líbano, passando pelo Iraque e Síria, um eixo estratégico idealizado pelo general Qasem Soleimani, assassinado em 2020 num ataque autorizado por Donald Trump.
O Irão via na Síria um pilar para expandir a sua influência regional, desafiando rivais como a Arábia Saudita e Israel. Além disso, o regime iraniano aspirava a consolidar-se como um centro de poder religioso e cultural xiita, utilizando proxies como o Hezbollah para estender sua influência.
Investimento sem retorno
Teerão assumiu compromissos substanciais na Síria, enviando tropas e material militar, assim como apoiando grupos locais como as Brigadas Fatemiyoun, compostas por afegãos recrutados para lutar pelo regime sírio. No entanto, este envolvimento teve um custo humano e financeiro elevado: mais de 2.000 combatentes iranianos morreram no conflito, enquanto o regime investiu em projetos que agora estão irremediavelmente comprometidos.
“Planeavam tomar o controlo de partes chave da economia síria, recuperar os seus investimentos no país e criar empresas imunes a sanções. Mas o corredor terrestre foi quebrado, e o Irão enfrenta várias derrotas numa única jogada”, destacou Horowitz.
A queda de Assad representa um golpe para o Hezbollah, o maior proxy do Irão na região. A organização libanesa, que já atravessa uma grave crise após operações israelitas devastadoras, enfrenta agora desafios adicionais. Em setembro de 2024, Israel eliminou Hassan Nasrallah, líder do Hezbollah, e vários outros altos responsáveis do grupo. Além disso, bombardeamentos e incursões terrestres comprometeram significativamente as suas capacidades.
“Se Assad cair, também cai o Hezbollah”, afirmou Nasrallah no passado, destacando a dependência do grupo em relação à Síria como ponto de acesso logístico e militar. Sem o apoio direto de Damasco, o Hezbollah enfrenta dificuldades crescentes para manter a sua relevância na geopolítica regional.
O colapso do regime sírio tem sido comparado à retirada caótica dos Estados Unidos de Cabul em 2022. Tal como o Ocidente perdeu a capacidade de manter a sua influência no Afeganistão, agora são o Irão e a Rússia que se veem obrigados a abandonar um aliado crucial. “Anos de esforços militares e económicos desmoronaram como um castelo de cartas”, concluiu Horowitz.
Este fracasso sublinha os limites da estratégia iraniana de usar proxies para projetar poder. O Irão, mergulhado numa crise económica interna, enfrenta agora um cenário complicado, com a possibilidade de regimes hostis a emergirem tanto na Síria como no Líbano, desafiando diretamente a sua influência. O sonho dos ayatolás de se estabelecerem como uma potência estável e central no Médio Oriente parece cada vez mais distante.