Chefes da guarda prisional temem que inquérito desvalorize fuga de reclusos

A Associação Sindical de Chefias do Corpo da Guarda Prisional (ASCCGP) teme que o inquérito aberto sobre a fuga dos cinco reclusos da prisão de Vale de Judeus desvalorize a situação ou atire as culpas para os guardas.

“O inquérito vai tentar acomodar e normalizar a fuga. O sistema vai fechar-se sobre si próprio, desvalorizar a situação ou atirar para cima de um guarda prisional ou de um chefe. Têm de assumir”, afirmou hoje o presidente da ASCCGP, Hermínio Barradas, sublinhando que o problema de falta de guardas é do conhecimento da Direção-Geral da Reinserção e Serviços Prisionais (DGRSP) e dos sucessivos governos.

Hermínio Barradas reiterou que “as informações foram todas reportadas” no passado e que há mais tentativas de fuga pelo país, mas que “a DGRSP normaliza tudo” e acaba por criticar os sindicatos que fizeram os alertas para os riscos de fugas.

Alertou ainda que a cadeia de Vale de Judeus está sem diretor há cerca de quatro meses, que o substituto está de baixa e que não havia chefes em Vale de Judeus naquele dia, resumindo que a “cadeia de comando ficou comprometida”.

“Agora fugiram cinco pessoas perigosíssimas de forma insólita porque o sistema permite e quem denuncia ainda é perseguido. Ainda nos chamam alarmistas. As pessoas que estão na cadeia fazem o que têm de fazer; o que tiver de acontecer, acontece e é culpa do sistema”, disse o dirigente sindical, assegurando que a guarda prisional está “de consciência tranquila”.

O presidente da ASCCGP recusou comentar uma eventual demissão do diretor da DGRSP, Rui Abrunhosa Gonçalves, remetendo essa avaliação para a tutela, mas sem se coibir em criticar as declarações daquele responsável na conferência de imprensa de domingo, dando como exemplo a suposta eletrificação da cerca em redor da cadeia.

“Como é que se pode falar em cercas eletrificadas no século XXI num país europeu? Isso é só entretenimento. É uma rede com arame laminado e farpado. Não pode haver cercas eletrificadas num país europeu… Erraram ao retirar as torres de vigilância e ao não investir na guarda prisional”, observou.

Questionado sobre a ausência de guardas prisionais no pátio da prisão de onde surgiu a fuga, Hermínio Barradas salientou que essa situação “é prática corrente” e que todos os agentes da justiça têm conhecimento disso há bastante tempo, resumindo que a falta de guardas no pátio de Vale de Judeus “é a regra”, sendo a exceção as poucas prisões que conseguem colocar guardas quando têm menos solicitações de pessoal ao exterior.

Condenou ainda o “desinvestimento e a estratégia implementada” nos últimos 12 anos, considerando que as sucessivas direções dos serviços prisionais têm vendido “uma ilusão securitária” aos governos.

De acordo com a DGRSP, já foi aberto um processo de inquérito interno, a cargo do Serviço de Auditoria e Inspeção, coordenado pelo Ministério Público.

Cinco reclusos fugiram no sábado do Estabelecimento Prisional de Vale de Judeus, em Alcoentre, no concelho de Azambuja, distrito de Lisboa.

A fuga foi registada pelos sistemas de videovigilância pelas 09:56, mas só foi detetada 40 minutos depois, quando os reclusos regressavam às suas celas.

Os evadidos são dois cidadãos portugueses, Fernando Ribeiro Ferreira e Fábio Fernandes Santos Loureiro, um cidadão da Geórgia, Shergili Farjiani, um da Argentina, Rodolf José Lohrmann, e um do Reino Unido, Mark Cameron Roscaleer, com idades entre os 33 e os 61 anos.

Foram condenados a penas entre os sete e os 25 anos de prisão, por vários crimes, entre os quais tráfico de droga, associação criminosa, roubo, sequestro e branqueamento de capitais.

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