Causa quebra fronteiras. 99 países defendem fim de patente para a vacina contra a Covid-19

A Organização Mundial do Comércio (OMC) retoma, esta sexta-feira, as negociações sobre as patentes de vacinas e tratamentos contra a Covid-19. Mas há um impasse entre os países ricos e emergentes que está a impedir que esta matéria chegue a bom porto, avançam agências internacionais.

No total, 99 dos cerca de 160 países membros da OMC anunciaram o apoio ao projeto de suspender a aplicação de patentes para produtos relacionados com a Covid-19. A meta é garantir que a propriedade intelectual não seja um obstáculo para o acesso de biliões de pessoas pelo mundo fora à vacina, até que haja uma imunidade de grupo contra o novo coronavírus.

Entidades internacionais, como a Organização Mundial da Saúde (OMS), saíram em apoio a esta ideia, somando-se os movimentos sociais e eclesiásticos de todo o mundo que também se manifestaram favoravelmente.

Esta semana, durante a Cimeira dos Brics, os líderes da África do Sul e da Índia voltaram a defender uma proposta que se tornou uma causa. Apenas os países ricos se recusam a aceitar a ideia de suspender patentes, receando que a medida possa afetar as suas farmacêuticas.

Hoje, as três grandes promessas de vacinas contra a Covid-19 veem justamente de companhias com sede na Europa ou EUA. Nas negociações para a venda de produtos, nenhuma delas abriu mão de suas patentes.

Sem patentes, a ideia é que os países possam ampliar a produção de genéricos ou reduzir o pagamento de royalties às gigantes farmacêuticas. Além disso, as condições favoráveis que estão a ser negociadas apenas são válidas pelo período de pandemia.

Os Médicos Sem Fronteira vieram apelar para que a proposta de suspensão das patentes seja apoiada por todos. Sidney Wong, diretor executivo da campanha de acesso a remédios do organismo, insistiu que a disputa na OMC é um sinal do comportamento de países e empresas. “Os governos precisam de se perguntar de que lado da história querem estar quando os livros sobre esta pandemia forem escritos”, disse Wong, em comunicado.

Para a entidade, o que chama a atenção é que nem mesmo na pior pandemia dos últimos cem anos as empresas abriram mão de patentes. Os mais recentes estudos publicados revelam que, para o desenvolvimento das vacinas, as multinacionais contaram com injeções e subsídios de mais de 12 mil milhões de dólares dos governos. Agora, insistem que o produto é de propriedade privada. “Todas as ferramentas e tecnologias de saúde Covid-19 devem ser verdadeiros bens públicos globais, livres das barreiras que as patentes e outras propriedades intelectuais impõem”, defende Wong.

“Desde o início da pandemia, as corporações farmacêuticas têm mantido a sua prática padrão de controlo rígido sobre os direitos de propriedade intelectual, enquanto prosseguem acordos comerciais secretos e monopolistas que excluem muitos países em desenvolvimento de beneficiarem”, alertou a entidade.

Um exemplo, segundo o responsável, é a Gilead, que entrou numa licença bilateral restritiva para um dos únicos medicamentos que demonstrou benefícios potenciais para tratar a Covid-19, o remdesivir. O resultado foi a exclusão de quase metade da população mundial de beneficiar da concorrência dos genéricos com preços mais baixos.