Canadá na UE? O que ganhava o país (e o bloco) com uma união improvável, perante as investidas de Trump

A possibilidade de o Canadá integrar a União Europeia (UE) pode parecer improvável, mas a ideia, embora hipotética, é fundamentada por razões geopolíticas e económicas, especialmente numa altura em que Donald Trump tem ‘ameaçado’ anexar o país e torná-lo num Estado norte-americano. A proposta de “CanadEU” ganha força à luz das incertezas globais, como o regresso de Donald Trump à presidência dos Estados Unidos e a crescente necessidade de alianças estratégicas mais robustas entre parceiros com valores partilhados. Mas o que ganharia o país, e o bloco europeu, com esta aliança?

Historicamente, a relação entre Canadá e Europa tem sido marcada por cooperação e afinidades culturais. Até mesmo os raros atritos, como a peculiar “guerra do whisky” entre Canadá e Dinamarca, exemplificam o espírito diplomático entre os dois. Esta disputa, que durou quatro décadas por um pequeno pedaço de terra no Ártico, foi resolvida em 2022 com um acordo para dividir a ilha disputada, evitando confrontos armados e limitando-se à troca de bandeiras e bebidas.

Contudo, com o panorama global a mudar, tanto a UE quanto o Canadá enfrentam desafios semelhantes. A retórica inflamatória de Trump, incluindo sugestões provocativas de que o Canadá seria o 51.º estado norte-americano, sublinha a necessidade de Ottawa procurar alternativas. Paralelamente, a UE lida com movimentos de afastamento e reaproximação, como a possível reintegração da Gronelândia e debates sobre a adesão de países periféricos.

As vantagens de uma união improvável

A ideia de o Canadá aderir à UE não é nova e assenta em complementaridades significativas. O Canadá, vasto e rico em recursos naturais, mas com uma população relativamente pequena (cerca de 40 milhões), contrasta com a UE, densamente povoada e carente de recursos minerais. Além disso, valores partilhados, como o compromisso com o comércio justo, o bem-estar social e a luta contra as alterações climáticas, tornam o Canadá um parceiro culturalmente próximo.

Um porta-voz europeu brincaria com a ideia: “Maple syrup, meet Belgian waffle” (“Xarope de ácer, conheça a waffle belga”). Mas as implicações são mais profundas. A entrada do Canadá triplicaria a área territorial da UE, adicionando riqueza natural e novos mercados, enquanto representaria um aumento populacional modesto em relação aos atuais 440 milhões de habitantes do bloco.

O Canadá também se destaca por políticas de imigração inclusivas que poderiam servir de modelo para a Europa. Por outro lado, a UE poderia oferecer ao Canadá lições importantes em áreas como redução de emissões de carbono, integração de mercados internos e promoção de concorrência em setores como telecomunicações e aviação.

Desafios e limitações

Apesar dos benefícios mútuos, obstáculos significativos dificultam a concretização de uma adesão formal. A UE limita-se a aceitar “estados europeus” como membros, uma cláusula que exigiria redefinições legais para incluir o Canadá. Além disso, a integração numa união aduaneira poderia prejudicar os laços comerciais vitais de Ottawa com os Estados Unidos, seu maior parceiro económico.

O Canadá também enfrenta desafios internos, como a necessidade de modernizar infraestruturas para exportação de gás natural liquefeito (LNG) para a Europa e resolver discrepâncias comerciais entre as suas províncias e territórios.

Um caminho para relações mais estreitas

Se a adesão formal parecer inatingível, o fortalecimento da parceria existente continua a ser uma alternativa viável. O Acordo Económico e Comercial Global (CETA), em vigor desde 2017, é o mais ambicioso da UE, mas permanece em aplicação provisória devido à falta de ratificação plena por parte de dez países europeus. Concluir este processo seria um passo concreto para aprofundar os laços.

Além disso, a colaboração em áreas como mobilidade militar e exploração espacial pode ser ampliada. A partilha de recursos energéticos e conhecimento tecnológico também poderia beneficiar ambas as partes.

Embora a ideia de “CanadEU” possa parecer um exercício de ficção geopolítica, ela reflete as necessidades crescentes de alianças estratégicas em tempos de instabilidade global. Um relacionamento mais próximo entre o Canadá e a UE, mesmo que não culminando em adesão plena, pode oferecer benefícios concretos em termos de comércio, segurança e valores partilhados.

Enquanto não acontece, tanto o xarope de ácer canadiano quanto as waffles belgas permanecerão símbolos da colaboração que poderia florescer entre estas duas regiões.