“A empatia é um pilar da boa gestão”: Luís Graça Rodrigues

Luís Graça Rodrigues, advogado e Mestre em Direito (Direito Empresarial, especialização em Direito do Trabalho), dirige o Departamento Jurídico da  Indra para a Europa e países africanos de língua portuguesa. Em 2011, criou o departamento jurídico da Indra em Portugal e estabeleceu uma equipa jurídica que tem apoiado a expansão internacional da empresa nos países africanos de língua portuguesa, prestando assessoria jurídica em várias operações e sucursais da empresa nesses países e supervisionando o trabalho de consultores externos locais. Em 2015, o Luís foi também Professor Convidado na Universidade Católica de Moçambique. É coautor do livro “O regime jurídico dos contratos públicos e das contrapartidas comerciais em Angola” (Vida Económica, 2017) e autor de diversos artigos. Em 2022 foi nomeado Director do Departamento Jurídico da Indra/ Minsait para Itália, e em 2023 foi nomeado Director Regional do Departamento Jurídico para a Europa (excepto Espanha), PALOP e Filipinas, gerindo uma equipa internacional de advogados internos, entre Lisboa, Roma e Manila.

O que diz Luís…
Gerir bem a minha equipa é a maior responsabilidade que me é exigida e, por isso, começaria por dizer que a gestão é algo que encaro com muita seriedade

Como surgiu o desafio de trabalhar para a Minsait em Roma?
Em 2020, o Grupo resolveu adaptar a Assessoria Jurídica de Itália às necessidades que esta geografia vinha apresentando. O país tinha-se tornado na geografia com maior rentabilidade dentro da esfera Minsait, e a estrutura societária local vinha-se tornando cada vez maior, fruto de sucessivas aquisições. Tornou-se, então, necessário que alguém com conhecimento profundo da empresa e do negócio assumisse a direcção da área jurídica de Itália, num período de transição, enquanto se procederia ao recrutamento de um director jurídico italiano. A Sede lançou-me o desafio para assegurar esta transição por três motivos: já tinha implementado o Departamento Jurídico em Portugal, sou fluente em italiano falado e escrito (por coincidência, tinha começado a estudar italiano alguns anos antes) e, naquela altura, já contava com 10 anos no Grupo, coordenando os temas jurídicos de Portugal e dos PALOP. No final, o que deveria ser uma transição de um par de meses acabou por se tornar num desafio para me transferir definitivamente para Roma, quando a Empresa fez um balanço dos meus primeiros meses em Itália.

Aceitou de imediato? Porquê?
Não posso dizer que tenha aceitado de imediato. Tinha abordado a “aventura italiana” como um projecto de alguns meses e, de repente, deparei-me com uma proposta de trabalho que implicava transferir-me definitivamente. Até àquele momento, confesso que não tinha equacionado emigrar (na minha cabeça, emigrar era uma coisa que se fazia antes dos quarenta anos). No entanto, há alturas da nossa vida em que os desafios que nos são apresentados parecem alinhar-se de forma absoluta com as nossas paixões pessoais: há alguns anos que estudava italiano no Instituto Italiano de Cultura, em Lisboa, sou um apaixonado confesso da cultura italiana em todas as suas dimensões (língua, cozinha, cinema, pintura, escultura, …), e tinha já uma rede profissional considerável em Itália, fruto de algumas conferências em que participei como orador sobre temas jurídicos, na Milan Legal Community Week, durante sucessivos anos.
Para além desta esfera mais pessoal, a verdade é que tinha consciência de que o desafio de assumir a liderança jurídica da filial mais rentável da Minsait me daria toda uma série de novas perspectivas e exigências, das quais não duvidei por um momento que resultaria num enorme crescimento. Por fim, ponderei também um argumento de peso: uma empresa que acredita na mobilidade internacional de alguém que está associado a um saber técnico específico de um país (neste caso, o Direito Português), é uma empresa que confia nas suas pessoas e na capacidade que têm para se reinventar, estudar e adaptar. E a uma empresa assim, a resposta tem que ser afirmativa.

Quais são as suas principais funções?
As minhas funções têm vindo a aumentar desde que vim para Itália. Inicialmente, deveria ter acontecido uma troca de responsabilidades geográficas (Portugal por Itália), mas ao fim de algum tempo, acabei por ser promovido a Director Regional para a Europa e PALOP e, presentemente, além deste cargo, tenho também a responsabilidade sobre as Filipinas, onde temos outra filial da Minsait em franco crescimento. No âmbito destas responsabilidades, as minhas funções são, em linhas gerais, zelar pela segurança jurídica das operações do Grupo nos países a meu cargo e coordenar uma equipa de advogados dispersos por entre os diferentes países que compõem a área geográfica da minha responsabilidade.

O que mais o fascina na indústria em que trabalha?
Claramente, o facto de sermos o sector que guia todos os operadores de mercado na implementação e transição da Indústria 4.0 para a Indústria 5.0. Estamos a viver um contexto dinâmico e inexplorado que levanta inúmeros desafios jurídicos: reduzida ou inexistente regulação sobre algumas áreas e/ou tecnologias, ou o ritmo de evolução de tecnologias que deixam os operadores económicos sem um quadro jurídico claro e estável, entre outros. Todo este contexto desafia a criatividade e a necessidade de segurança jurídica de todos os que exercem a sua atividade neste setor e, sobretudo, a necessidade de atualização constante, não só nos temas jurídicos, mas, sobretudo, nas tecnologias que vão sendo lançadas e nos novos modelos de negócio que vão surgindo. O trabalho como o conhecemos deixará de ser uma realidade a curto prazo e sinto um privilégio enorme por poder aconselhar e guiar os que estão na crista da onda desta transição.

É em Roma que passa grande parte do tempo de trabalho? Como é o seu dia-a-dia?
É em Roma que passo grande parte do tempo de trabalho, apesar das frequentes deslocações pelos diferentes escritórios, tanto em Itália (Milão, Prato, Nápoles, Potenza, Cagliari, Bari, …) como no estrangeiro (Lisboa, Riga, Bucareste, Manila, …). Um dia típico em Roma começa com uma ida ao ginásio às 7h00 – o exercício físico cedo pela manhã dispara-me os níveis de energia para o ritmo exigente do quotidiano e assegura-me bem-estar psicológico. Não posso dizer que tenha um dia típico: se se tratar de uma segunda-feira, seguramente terei a manhã cheia de reuniões de catch-up com as equipas dos diferentes países e, pouco antes da hora de almoço, com o meu Director Global. Tudo o resto é uma incógnita: posso ter mais tempo dedicado a trabalhos de alta concentração, como seja a revisão de um contrato mais complexo ou a elaboração de um parecer jurídico, ou um dia mais dedicado a reuniões com clientes externos, clientes internos ou colegas de direcção, para discussão de temas mais estratégicos.
As redes profissionais em Itália são muito dinâmicas e é muito frequente ter um ou outro cocktail organizado por embaixadas, empresas, associações de juristas de empresa ou sociedades de advogados. Esta cultura de vida social bastante activa potencia também diversos jantares ou o clássico aperitivo com colegas e amigos num de entre os inúmeros e magníficos terraços de Roma.

Quais as principais diferenças ao nível da metodologia de trabalho que encontrou ao mudar-se para a Itália?
Não posso dizer que tenha identificado diferenças estruturais na metodologia de trabalho, mas também não seria expectável que assim fosse,  considerando que estou a trabalhar para diversas filiais do mesmo grupo multinacional: há uma tendência para a uniformização de metodologias. No entanto, devo salientar que, em Itália, me parece haver mais espaço para a criatividade (estamos a falar de um país onde o design e a originalidade são essenciais) e parece-me que há mais dinamismo na maneira como se encara o trabalho e os resultados que devem ser apresentados. Cheguei a Itália um pouco à espera do clichê de uma Itália desorganizada e cedo percebi precisamente o contrário. É esta competitividade, dinamismo da indústria e criatividade que asseguram a Itália o seu lugar no G7, não podemos esquecer. Ainda em termos de cultura de trabalho, claramente que, em Roma, a cultura do aperitivo após o trabalho num ou noutro dia parece-me um traço essencial e que nos permite aprofundar relações e redes de colaboração.

O que a Itália lhe tem ensinado sobre gestão de pessoas?
Claramente, tem ensinado muito sobre a necessidade de abertura nas técnicas de gestão. É a partir de Itália que giro uma equipa que cobre diversos países dispersos por 3 continentes: seria impensável gerir cada uma das pessoas nos diferentes países e com diferentes senioridades de forma igual e uniforme. Itália reiterou também algo que já trazia comigo de Portugal: a necessidade de encontrar tempo e espaço fora das reuniões formais de trabalho para conhecer verdadeiramente as pessoas, estabelecer relações de empatia, entender melhor os seus objectivos e desafios, e alinhar estratégias. Pode ser em frente a um belo café italiano, bem forte, ou num breve aperitivo após o trabalho.

Qual é a sua filosofia de gestão?
Gerir bem a minha equipa é a maior responsabilidade que me é exigida e, por isso, começaria por dizer que a gestão é algo que encaro com muita seriedade. Se tiver que definir a minha filosofia numa palavra, claramente seria “escutar”. Um líder que não tem tempo para escutar, de forma activa e dedicada, as pessoas da sua equipa, é alguém que não está a fazer o trabalho como deve ser. Estou seguro de que a empatia é um pilar da boa gestão e, por isso, tento encontrar vários momentos para estar com a minha equipa (seja a equipa italiana como a global): fazemos uma reunião de ponto de situação de projectos em curso todas as semanas, uma vez por mês tenho uma reunião one-to-one com cada pessoa da minha equipa, sejam reportes directos ou indirectos, onde o objectivo não é falar de temas de trabalho, mas partilhar feedback contínuo e assegurar que as expectativas de ambas as partes estão alinhadas, e uma vez a cada dois meses tento reunir toda a equipa para que um dos membros partilhe com os restantes um tema de gestão.
Para além disso, nunca vou para uma reunião sobre um tema mais relevante e em que tenha de levar algum membro da equipa, sem termos feito um roteiro prévio e alinhado a visão da estratégia (os japoneses chamam a este procedimento “Nemawashi”): há espaço para discussões enriquecedoras dentro da equipa, mas uma vez que tenhamos que emitir um parecer ou orientar uma estratégia, o Departamento fala a uma só voz, em total sintonia.

Estando a viver longe de Portugal, como é que “mata saudades” do nosso País?
Confesso que tenho essa parte bastante facilitada: como parte da equipa de advogados que coordeno está em Lisboa, tento vir uma semana por mês a Portugal e estar essa semana com eles nos nossos escritórios. Esta possibilidade permite-me matar saudades das coisas mais “físicas”, seja um belo prato de cozinha nacional ou um abraço apertado da família e amigos. A tecnologia também é uma aliada: FaceTime ou WhatsApp, entre outras opções, são excelentes plataformas de contacto com os que nos são mais próximos. E, por fim, mas não menos importante, creio que o facto de residir em Roma potencia imenso o número de visitas que recebo de amigos e familiares, que trazem sempre consigo algo deste nosso país tão especial.