Equipamentos eólicos em fim de vida: O que fazer?

Opinião de Luís Gil, Membro Conselheiro e Especialista em Energia da Ordem dos Engenheiros

Executive Digest
Dezembro 5, 2025
9:29

Por Luís Gil, Membro Conselheiro e Especialista em Energia da Ordem dos Engenheiros

Embora já tenha abordado neste espaço o problema do fim de vida de componentes de equipamentos eólicos (https://executivedigest.sapo.pt/o-fim-de-vida-das-pas-dos-aerogeradores/ 29 de julho), vou agora abordar esta questão de uma forma mais abrangente e numa perspetiva atualizada.

Segundo a maior associação europeia relacionada com a energia eólica, a WindEurope, atualmente pode-se considerar que cerca de 90% em massa de uma turbina é reciclável se forem usadas práticas de gestão dos resíduos adequadas. Mas esta associação quer avançar ainda mais e auto-impõe uma proibição de colocação das pás dos aerogeradores desmanteladas em aterros já em 2026.

Para isso têm que entrar em ação recicladores que deem uma segunda via às pás, restauradores de coloquem as turbinas no mercado de segunda mão e designers e inovadores que transformem as pás usadas em equipamento e objetos criativos e úteis. Ou seja, nem só de reciclagem “vive” a solução. Por outro lado, manter os componentes em operação durante tanto tempo quanto possível, com adequada manutenção, evita resíduos e estende a vida útil.

As turbinas eólicas mais recentes demoram 3-14 meses a gerar a energia requerida para a sua produção, transporte, instalação e desmantelamento. E com um tempo médio de vida na Europa de 32 anos, como recentemente referido pelo Joint Research Centre da Comissão Europeia, estes equipamentos geram depois muita energia limpa e contribuem para a descarbonização.

Num recente evento da WindEurope que se realizou em Lisboa, um evento anual da Wind Europe para assuntos relacionados com o fim de vida das turbinas eólicas e estratégicas para lidar com este problema, foram apresentadas várias soluções relacionadas com a reutilização, recuperação, reaproveitamento e reciclagem de componentes dos sistemas eólicos. Algumas das soluções, que nos dão uma panorâmica do desenvolvimento e dinâmica neste domínio, foram apresentadas, por exemplo:

– pás usadas, depois de seccionadas, como barreiras acústicas em estradas de tráfego intenso;

– recondicionamento do corpo das nacelles para as transformar em pequenas habitações;

– utilização das pás desmanteladas para produzir bases flutuantes para sistemas de fotovoltaico flutuante;

– utilização das pás para o fabrico de mobiliário de exterior/urbano, coberturas, abrigos, vedações e fachadas, conferindo-lhes uma prática e criativa segunda vida;

– bases de pontes pedestres e para ciclistas feitas com a partir de pás de aerogeradores desmanteladas;

– fibras e resinas obtidas da “desconstrução” das pás estão já a ser usadas no fabrico de novas pás;

– cascos de navios estão a ser produzidos utilizando pás de aerogeradores em fim de vida;

– estão a ser produzidas sapatilhas com componentes de turbinas em fim de vida;

– no domínio do desporto, foram desenvolvidos skis e pranchas de surf a partir pás desmanteladas.

 

Quando estas utilizações não são possíveis uma possível via de utilização é no fabrico de cimento e betão. Depois de separados os componentes das pás (vários métodos possíveis) as fibras de vidro das pás substituem matéria-prima no clínquer e a resina proporciona energia para o processo, reduzindo as emissões de CO2. Os fragmentos das pás, após trituração, são misturados com cimento para produzir um compósito reduzindo também emissões. Estes compósitos podem ser utilizados nas bases das torres eólicas promovendo a circularidade neste campo. Algumas destas soluções estão já a passar à fase industrial, nomeadamente em Espanha (BLADES2BUILD, EnergyLoop).

As soluções ligadas à manutenção e prolongamento do seu tempo de vida passam, por exemplo, por uma maior modularidade dos componentes, que permitam a sua substituição mais fácil e mais barata e com menos incorporação de materiais.

Até 2030, a Europa deverá desmontar cerca de 14000 turbinas eólicas, gerando entre 40000 e 60000 toneladas de resíduos de pás, de acordo com a WindEurope. Só a Alemanha será responsável por aproximadamente 23300 toneladas, seguida pela Espanha com 16000 e pela Itália com 2300. Em Portugal, a primeira geração de aerogeradores montadas na década de 90 estão agora a chegar ao fim da sua vida útil e segundo dados referidos pelo INEGI prevê-se que em Portugal venham a ser desativadas em média 266 turbinas eólicas por ano a partir deste ano.

Senhores investidores e empreendedores, temos aqui, porventura, um novo campo de negócio a considerar. Com um benchmarking apropriado ao que se passa lá fora, estará eventualmente aberto o caminho para algo deste género no nosso país…

Finalmente, saliente-se como curiosidade algo que foi anunciado: os gatos matam 2500 vezes mais aves do que as pás eólicas!

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