Quando ouvimos este nome, pensamos logo em segurança, carros de família, design escandinavo e robustez.
Mas se afirmasse Volvo e aventura todo-o-terreno para a cidade? Parece que não encaixa, talvez seja uma contradição.
No entanto, é precisamente essa a proposta do novo EX30 Cross Country. E a grande questão é como é que uma marca com uma herança tão tradicional se reinventa para um público mais jovem, mais irreverente e mais tecnológico?
Será que resulta? Bem, a julgar pelas vendas resulta e muito. O EX30 foi um sucesso quase imediato.
E para isso vou socorrer-me de algum conhecimento de marketing das minhas aulas e também do que conheço do setor automóvel.
Para começar vou testar no seu verdadeiro habitat. Cidade, estradas nacionais, autoestrada e em caminhos de terra e depois “calibrados” com os dados da marca e a investigação sobre o automóvel, a rastreabilidade das baterias, materiais reciclados, origem da tecnologia, inovação…
Então, o objetivo é mesmo esse, mergulhar numa análise e perceber como é que o Volvo EX30 Cross Country consegue ser este “camaleão”, confortável na selva urbana, mas com uma alma de aventureiro.
E com isso perceber o que isso nos diz sobre o futuro da Volvo.
Comecemos pelo conceito. Um SUV elétrico, compacto, mas com vocação all-terrain.
Mas será que a Volvo não estará a ser um pouco ambiciosa? Um automóvel de cidade raramente é o que escolhemos para ir para o meio do campo. Mas creio ser uma uma ambição calculada. A estratégia deles é, na verdade, muito inteligente. Eles não estão a tentar vender o EX30 Cross Country como um jeep puro e duro, nem para escalar montanhas.
A proposta é mais subtil e por isso mais alinhada com o que o novo consumidor, pelo menos o deste segmento e desta geração procura; vive na cidade, conduz na cidade, mas valoriza a ideia de liberdade, a possibilidade de evasão, de poder ir por aquele caminho de terra para uma praia mais escondida, sem o stress de estragar o carro.
Portanto, é mais sobre a versatilidade do que propriamente sobre uma performance extrema fora de estrada. Um automóvel polivalente. E o curioso é que se olharmos para a história da marca, isto não é assim tão novo. A Volvo já fez isto há mais de 25 anos com as primeiras versões Cross Country, ainda com motores em combustão. Eram carrinhas robustas, fiáveis, um pouco mais altas.
O que a Volvo faz ao dia de hoje é utilizar a essência de durabilidade e traduzi-la para a era elétrica, com design muito mais apelativo para uma nova geração.
E isso começa logo no exterior, pois criaram uma espécie de kit de aventura visual: JLL pretas e maiores, maior altura ao solo, pneus de uso misto, proteções de plástico. Mas sejamos honestos, quanto disto é só marketing e quanto é que é mesmo funcional?
E estes 19 mm extra de altura fazem diferença. Não o transformam num todo-o-terreno, mas dão-lhe outra postura. Já não é só um carro de cidade. E a grade no tejadilho muda completamente o estilo. Funcionalmente esta pequena altura extra com a suspensão afinada para tal, nota-se no conforto. principalmente em pisos como empedrados das nossas cidades.
Os pneus mistos também dão um pouco mais de tração e segurança num caminho de gravilha; ou seja não é só estética. Há benefícios práticos, mesmo que simples.
Até a grelha frontal é diferente, com um padrão que dizem ser inspirado numa cordilheira sueca. É um detalhe, mas reforça a narrativa do Ready for Adventure, sem dúvida.
Com as alterações vieram consequências técnicas. E a Volvo tomou uma decisão ousada. Esta versão Cross Country só está disponível com a motorização de topo, que é o Twin Motor com 428 cavalos e tração às quatro rodas. Em termos de autonomia anuncia 427 km. Mas na prática será menos. Porquê? Pelas mesmas razões que o tornam um cross country. A física é implacável: os pneus de uso misto geram mais atrito, as proteções de plástico na carroçaria e especialmente a grade metálica do tejadilho, a maior altura ao solo, pioram a aerodinâmica.
Cada elemento tem um impacto pequeno, mas quando somamos temos mais resistência, mais peso e claro, aumenta o consumo de energia. Em estrada normal e autoestrada conseguimos ir aos 300kms, sem regeneração alguma. Com regeneração em estrada e caminho de terra aumenta
Esta filosofia de aventura e robustez exterior continua quando abrimos a porta e entramos num mundo completamente diferente. O interior foca-se no minimalismo escandinavo, onde quase não há botões, controlado a partir do grande ecrã central vertical, desde ajustar os espelhos até abrir o porta-luvas… central (é prático ficar “à mão de semear”)
O software está mais user-friendly, a navegação entre écras e a fluidez. Pessoalmente, não sou um fã da simplificação dos vidros elétricos com comando na zona central e somente dois botões para os quatro vidros, onde para controlar os posteriores tenho de carregar noutro botão primeiro.
Já o volante é interessante, pois é quase um quadrado. A primeira reação é estranha mas depois a reação é perfeitamente natural … e ergonómica. Tal como a sound bar, que ao invés das colunas nas portas surge no tablier junto ao vidro da frente. A visão da Volvo continua a fazer sentido: público mais jovem, urbano, tecnológico, que procura um veículo elegante e seguro e a marca parece que repensou o óbvio com o objetivo, claro, de criar espaço, reduzir a complexidade visual e, mesmo custos de produção.
A Soundbar da Harman Kardon, por exemplo, elimina a cabelagem e os altifalantes em cada porta; simplifica a montagem. E o porta-luvas central é mais prático. É uma abordagem muito focada num público que cresceu com smartphones e que valoriza um design clean onde a tecnologia está muito presente, por exemplo com a parceria com a Google para navegação, as atualizações Over the Air.
E estas são absolutamente cruciais. Para o utilizador significa que o EX30 melhora com o tempo, recebe novas funções enquanto está na garagem, como um telemóvel. Mas para a Volvo, o mais interessante é a informação que eles recebem de volta com dados anónimos sobre como os volvo são usados, que funções são mais utilizadas, como se carregam as baterias…. Esta informação do mundo real é ouro para os engenheiros, pois permite-lhes desenvolver os próximos modelos e as atualizações de forma muito mais precisa, respondendo às necessidades reais dos condutores.
E faltava claro, a segurança, o ADN da marca que também evolui, a começar pela câmara que deteta fadiga e desatenção, mas também o foco na sustentabilidade com a grande % de materiais reciclados e recicláveis e das baterias CATL um dos maiores fabricantes do mundo com políticas de rastreabilidade rigorosas.
Mas o mais interessante é que a plataforma do carro e o sistema de gestão da bateria foram desenvolvidos dentro do grupo a que pertence a Volvo.
Portanto, fazendo um balanço, o Volvo EX30 Cross Country é muito mais do que um automóvel novo. É uma declaração de intenções da marca ao mostrar que se pode abraçar a mobilidade elétrica sem abdicar da liberdade de explorar o campo. E consegue-o, com o conforto do dia a dia e a capacidade para uma escapadela ao campo, a segurança da marca, a qualidade dos materiais e da sua construção.
É um carro que se sente tão à vontade no trânsito de Lisboa como num estradão de terra no Alentejo.
E o mercado parece concordar, ao olharmos para os números. O EX30 tem sido um sucesso de vendas e é a prova de que a Volvo conseguiu rejuvenescer a sua imagem sem perder a sua essência, qualidade, segurança e agora uma sustentabilidade muito mais profunda.
No fundo, este modelo encapsula o que é a Volvo na era moderna.
Para terminar, há um pormenor do que vi quando visitei a fábrica da Volvo em Ghent, na Bélgica, onde este modelo também vai ser produzido. Diz muito sobre a cultura da marca: quando uma equipa tem um problema na linha de montagem e precisa de ajuda, não existe um alarme estridente. Em vez disso, o sistema de som da fábrica começa a tocar uma música. E o mais interessante é que a música é escolhida pela própria equipa.
Transforma um momento de stress num alerta colaborativo e humano. Pode parecer um simples detalhe, mas este foco no bem-estar humano no meio de um processo industrial tão complexo, demonstra os verdadeiros valores de uma marca, mais do que qualquer ficha técnica.
E deixa-me a refletir que outras pistas sobre a cultura e a alma das empresas estão escondidas nos seus processos de fabrico à vista de todos, mas que nós raramente reparamos.



























