Ensaio. Volvo EX30 Cross Country: o elétrico urbano “camaleão” que não tem receio da lama

Volvo EX30 Cross Country consegue ser confortável na selva urbana, mas com uma alma de aventureiro

Jorge Farromba
Dezembro 2, 2025
10:59

Quando ouvimos este nome, pensamos logo em segurança, carros de família, design escandinavo e robustez.

Mas se afirmasse Volvo e aventura todo-o-terreno para a cidade? Parece que não encaixa, talvez seja uma contradição.

No entanto, é precisamente essa a proposta do novo EX30 Cross Country. E a grande questão é como é que uma marca com uma herança tão tradicional se reinventa para um público mais jovem, mais irreverente e mais tecnológico?

Será que resulta? Bem, a julgar pelas vendas resulta e muito. O EX30 foi um sucesso quase imediato.

E para isso vou socorrer-me de algum conhecimento de marketing das minhas aulas e também do que conheço do setor automóvel.

Para começar vou testar no seu verdadeiro habitat. Cidade, estradas nacionais, autoestrada e em caminhos de terra e depois “calibrados” com os dados da marca e a investigação sobre o automóvel, a rastreabilidade das baterias, materiais reciclados, origem da tecnologia, inovação…

Então, o objetivo é mesmo esse, mergulhar numa análise e perceber como é que o Volvo EX30 Cross Country consegue ser este “camaleão”, confortável na selva urbana, mas com uma alma de aventureiro.

E com isso perceber o que isso nos diz sobre o futuro da Volvo.

Comecemos pelo conceito. Um SUV elétrico, compacto, mas com vocação all-terrain.

Mas será que a Volvo não estará a ser um pouco ambiciosa? Um automóvel de cidade raramente é o que escolhemos para ir para o meio do campo. Mas creio ser uma uma ambição calculada. A estratégia deles é, na verdade, muito inteligente. Eles não estão a tentar vender o EX30 Cross Country como um jeep puro e duro, nem para escalar montanhas.

A proposta é mais subtil e por isso mais alinhada com o que o novo consumidor, pelo menos o deste segmento e desta geração procura; vive na cidade, conduz na cidade, mas valoriza a ideia de liberdade, a possibilidade de evasão, de poder ir por aquele caminho de terra para uma praia mais escondida, sem o stress de estragar o carro.

Portanto, é mais sobre a versatilidade do que propriamente sobre uma performance extrema fora de estrada. Um automóvel polivalente. E o curioso é que se olharmos para a história da marca, isto não é assim tão novo. A Volvo já fez isto há mais de 25 anos com as primeiras versões Cross Country, ainda com motores em combustão. Eram carrinhas robustas, fiáveis, um pouco mais altas.

O que a Volvo faz ao dia de hoje é utilizar a essência de durabilidade e traduzi-la para a era elétrica, com design muito mais apelativo para uma nova geração.
E isso começa logo no exterior, pois criaram uma espécie de kit de aventura visual: JLL pretas e maiores, maior altura ao solo, pneus de uso misto, proteções de plástico. Mas sejamos honestos, quanto disto é só marketing e quanto é que é mesmo funcional?

E estes 19 mm extra de altura fazem diferença. Não o transformam num todo-o-terreno, mas dão-lhe outra postura. Já não é só um carro de cidade. E a grade no tejadilho muda completamente o estilo. Funcionalmente esta pequena altura extra com a suspensão afinada para tal, nota-se no conforto. principalmente em pisos como empedrados das nossas cidades.

Os pneus mistos também dão um pouco mais de tração e segurança num caminho de gravilha; ou seja não é só estética. Há benefícios práticos, mesmo que simples.

Até a grelha frontal é diferente, com um padrão que dizem ser inspirado numa cordilheira sueca. É um detalhe, mas reforça a narrativa do Ready for Adventure, sem dúvida.

Com as alterações vieram consequências técnicas. E a Volvo tomou uma decisão ousada. Esta versão Cross Country só está disponível com a motorização de topo, que é o Twin Motor com 428 cavalos e tração às quatro rodas. Em termos de autonomia anuncia 427 km. Mas na prática será menos. Porquê? Pelas mesmas razões que o tornam um cross country. A física é implacável: os pneus de uso misto geram mais atrito, as proteções de plástico na carroçaria e especialmente a grade metálica do tejadilho, a maior altura ao solo, pioram a aerodinâmica.

Cada elemento tem um impacto pequeno, mas quando somamos temos mais resistência, mais peso e claro, aumenta o consumo de energia. Em estrada normal e autoestrada conseguimos ir aos 300kms, sem regeneração alguma. Com regeneração em estrada e caminho de terra aumenta

Esta filosofia de aventura e robustez exterior continua quando abrimos a porta e entramos num mundo completamente diferente. O interior foca-se no minimalismo escandinavo, onde quase não há botões, controlado a partir do grande ecrã central vertical, desde ajustar os espelhos até abrir o porta-luvas… central (é prático ficar “à mão de semear”)

O software está mais user-friendly, a navegação entre écras e a fluidez. Pessoalmente, não sou um fã da simplificação dos vidros elétricos com comando na zona central e somente dois botões para os quatro vidros, onde para controlar os posteriores tenho de carregar noutro botão primeiro.

Já o volante é interessante, pois é quase um quadrado. A primeira reação é estranha mas depois a reação é perfeitamente natural … e ergonómica. Tal como a sound bar, que ao invés das colunas nas portas surge no tablier junto ao vidro da frente. A visão da Volvo continua a fazer sentido: público mais jovem, urbano, tecnológico, que procura um veículo elegante e seguro e a marca parece que repensou o óbvio com o objetivo, claro, de criar espaço, reduzir a complexidade visual e, mesmo custos de produção.

A Soundbar da Harman Kardon, por exemplo, elimina a cabelagem e os altifalantes em cada porta; simplifica a montagem. E o porta-luvas central é mais prático. É uma abordagem muito focada num público que cresceu com smartphones e que valoriza um design clean onde a tecnologia está muito presente, por exemplo com a parceria com a Google para navegação, as atualizações Over the Air.

E estas são absolutamente cruciais. Para o utilizador significa que o EX30 melhora com o tempo, recebe novas funções enquanto está na garagem, como um telemóvel. Mas para a Volvo, o mais interessante é a informação que eles recebem de volta com dados anónimos sobre como os volvo são usados, que funções são mais utilizadas, como se carregam as baterias…. Esta informação do mundo real é ouro para os engenheiros, pois permite-lhes desenvolver os próximos modelos e as atualizações de forma muito mais precisa, respondendo às necessidades reais dos condutores.

E faltava claro, a segurança, o ADN da marca que também evolui, a começar pela câmara que deteta fadiga e desatenção, mas também o foco na sustentabilidade com a grande % de materiais reciclados e recicláveis e das baterias CATL um dos maiores fabricantes do mundo com políticas de rastreabilidade rigorosas.

Mas o mais interessante é que a plataforma do carro e o sistema de gestão da bateria foram desenvolvidos dentro do grupo a que pertence a Volvo.

Portanto, fazendo um balanço, o Volvo EX30 Cross Country é muito mais do que um automóvel novo. É uma declaração de intenções da marca ao mostrar que se pode abraçar a mobilidade elétrica sem abdicar da liberdade de explorar o campo. E consegue-o, com o conforto do dia a dia e a capacidade para uma escapadela ao campo, a segurança da marca, a qualidade dos materiais e da sua construção.
É um carro que se sente tão à vontade no trânsito de Lisboa como num estradão de terra no Alentejo.

E o mercado parece concordar, ao olharmos para os números. O EX30 tem sido um sucesso de vendas e é a prova de que a Volvo conseguiu rejuvenescer a sua imagem sem perder a sua essência, qualidade, segurança e agora uma sustentabilidade muito mais profunda.

No fundo, este modelo encapsula o que é a Volvo na era moderna.

Para terminar, há um pormenor do que vi quando visitei a fábrica da Volvo em Ghent, na Bélgica, onde este modelo também vai ser produzido. Diz muito sobre a cultura da marca: quando uma equipa tem um problema na linha de montagem e precisa de ajuda, não existe um alarme estridente. Em vez disso, o sistema de som da fábrica começa a tocar uma música. E o mais interessante é que a música é escolhida pela própria equipa.

Transforma um momento de stress num alerta colaborativo e humano. Pode parecer um simples detalhe, mas este foco no bem-estar humano no meio de um processo industrial tão complexo, demonstra os verdadeiros valores de uma marca, mais do que qualquer ficha técnica.

E deixa-me a refletir que outras pistas sobre a cultura e a alma das empresas estão escondidas nos seus processos de fabrico à vista de todos, mas que nós raramente reparamos.

Partilhar

Edição Impressa

Assinar

Newsletter

Subscreva e receba todas as novidades.

A sua informação está protegida. Leia a nossa política de privacidade.