A proteção laboral do trabalhador com deficiência

Opinião de Maria Amélia Quental, Associada de Laboral da PRA – Raposo, Sá Miranda & Associados

André Manuel Mendes
Dezembro 3, 2025
10:22

Por Maria Amélia Quental, Associada de Laboral da PRA – Raposo, Sá Miranda & Associados

No dia 3 de dezembro assinala-se o dia internacional da Pessoa com Deficiência. A celebração desta data objetiva sensibilizar, reforçar e promover os direitos das pessoas com deficiência, a dignidade e acessibilidade das mesmas, designadamente, no que concerne a condições socioeconómicas justas e equitativas.

No nosso ordenamento jurídico, a nível laboral, o Código do Trabalho, entre outras disposições protetivas de trabalhadores com filhos com deficiência, consagra, na subsecção VII do Capítulo I, o regime laboral aplicável a «Trabalhador com deficiência ou doença crónica». Nos artigos desta subsecção, o legislador laboral determina que o trabalhador com deficiência é titular dos mesmos direitos e está adstrito aos mesmos deveres dos demais trabalhadores no acesso ao emprego, à formação, promoção ou carreira profissionais e condições de trabalho, sem prejuízo das especificidades inerentes à sua situação.

Vejamos as concretas medidas:

  • O legislador dispõe que a entidade empregadora deve adotar medidas adequadas para que a pessoa com deficiência tenha acesso a um emprego, o possa exercer e nele progredir, ou para que tenha formação profissional, excetuando a circunstância de tais medidas implicarem encargos desproporcionados;
  • Determina, ainda, que o trabalhador com deficiência é dispensado de prestar trabalho nos regimes de adaptabilidade, de banco de horas ou de horário concentrado, bem como entre as 20 horas de um dia e as 7 horas do dia seguinte, se tal prejudicar a sua saúde ou segurança no trabalho, mediante exame de saúde prévio ao início da aplicação do horário em causa.
  • Por fim, estabelece que o trabalhador com deficiência não é obrigado a prestar trabalho suplementar.

Quanto à legislação avulsa, ressaltamos a relevância da Lei n.º 4/2019, de 10 de janeiro, a qual veio estabelecer o sistema de quotas de emprego para pessoas com deficiência, com grau de incapacidade igual ou superior a 60%, visando a sua contratação por entidades empregadoras do setor privado e organismos do setor público (neste último caso, quanto aos que não se encontrem abrangidos pelo âmbito de aplicação do Decreto Lei n.º 29/2001, de 3 de fevereiro).

A referida Lei determina, assim, a obrigação de, dependendo da dimensão da empresa e do seu número de trabalhadores, admitir trabalhadores com deficiência, nos seguintes termos:

– Médias empresas (as que empregam de 50 a 249 trabalhadores) com um número igual ou superior a 75 trabalhadores, em número não inferior a 1% do pessoal ao seu serviço. Estas empresas tiveram até 31 de janeiro de 2024 para proceder à contratação;

– Grandes empresas (as que empregam 250 ou mais trabalhadores), em número não inferior a 2% do pessoal ao seu serviço. Estas empresas tiveram até 31 de janeiro de 2023 para proceder à contratação.

O incumprimento desta obrigação constitui contraordenação grave, sancionável por via de inspeção da Autoridade/Inspeção do Trabalho

O próprio processo de recrutamento e seleção dos candidatos com deficiência deve ser adequado e, se existirem provas de avaliação e o candidato o pedir, estas devem ser adaptadas. O incumprimento desta obrigação constitui contraordenação leve.

Desta feita, o escopo desta Lei é o de favorecer a inclusão dos trabalhadores com deficiência no mercado de trabalho, criando uma obrigação para as organizações no sentido de dispor de vagas concretas a serem preenchidas pelos trabalhadores que se incluam neste âmbito de aplicação. A Lei prevê exceções para os casos em que a organização não possa cumprir com este normativo, mas estas deverão, naturalmente, ser encaradas dessa forma – como exceção.

O legislador deu os primeiros passos para a integração das pessoas com deficiência no mundo laboral. Contudo, e pese embora a Constituição da República Portuguesa estatua que o Estado se obriga a realizar uma política nacional de integração dos cidadãos com deficiência, bem como a assumir o encargo da efetiva realização dos seus direitos, a sua integração plena na sociedade e, em específico, no mundo laboral, ainda se encontra longe de ser uma realidade.

Para que se mitigue o paradigma de exclusão, é imperativo o compromisso do Estado no cumprimento das suas obrigações constitucionais, promovendo a integração das pessoas com deficiência no mercado laboral, designadamente através de políticas públicas eficazes que evidenciem às empresas o potencial económico e humano das pessoas com deficiência (através de programas de certificação de competências que validem valências específicas; plataformas públicas de matching profissional; estudos e relatórios de impacto económico; programas de formação especializada e contínua, por exemplo), demonstrando que a diversidade também se manifesta em competência e mais valias produtivas, não em meros encargos adicionais.

 

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