Incêndios na Califórnia: por que estão a acontecer e qual o papel das alterações climáticas?
Um “cocktail” de fenómenos meteorológicos extremos está a atiçar os incêndios que lavram há vários dias no sul da Califórnia: são mesmo os mais devastadores em mais de quatro décadas, lembrou esta quinta-feira a publicação ‘Euronews’
Não é nesta altura do ano que costumam deflagrar os incêndios, mas alguns ingredientes específicos juntaram-se para desafiar o calendário de uma forma rápida e mortal – por detrás de muitos deles estão as alterações climáticas induzidas pelo homem.
De acordo com os cientistas, o aquecimento global contribuiu para um aumento de 172% de áreas queimadas por incêndios florestais na Califórnia desde a década de 1970, prevendo-se um novo aumento nas próximas décadas. Mas o que estará a causar incêndios florestais de inverno na Califórnia?
Em primeiro lugar, os ventos superdimensionados de Santa Ana, que lançam chamas e brasas a 161 km/h – uma velocidade muito acima da normal -, juntamente com o regresso de uma seca extrema. A isto juntaram-se as condições climatéricas que fizeram crescer toneladas de plantas durante os aguaceiros e, depois, as temperaturas recorde que as secaram para se tornarem num combustível fácil de queimar. Por último, muitos fios elétricos a abanar com as fortes rajadas.
De acordo com os especialistas, esta combinação perigosa é o que está a transformar os incêndios florestais numa conflagração urbana mortal.
Nas últimas décadas, os incêndios “pequenos, poderosos e rápidos” têm assolado o oeste dos Estados Unidos à medida que o mundo aquece, sustentou Jennifer Balch, cientista de incêndios da Universidade do Colorado e autora de um estudo – publicado na revista ‘Science’ – que analisou 60 mil incêndios nos últimos 24 anos, concluindo que os incêndios de crescimento mais rápido mais do que duplicaram desde 2001, com um rasto de destruição substancialmente superior aos incêndios mais lentos e maiores.
“Os incêndios tornaram-se mais rápidos”, afirmou Balch. “O grande culpado do qual suspeitamos é o aquecimento climático, que está a facilitar a queima de combustíveis quando as condições são as ideais.”
Os incêndios de verão são normalmente maiores, mas não ardem tão depressa. Os incêndios de inverno “são muito mais destrutivos porque ocorrem muito mais rapidamente”, reforçou Jon Keeley, cientista de incêndios do Serviço Geológico dos EUA. Segundo a AccuWeather, os danos causados pelos últimos incêndios poderão atingir 55 mil milhões de euros, tendo o meteorologista-chefe da empresa, Jonathan Porter, afirmado que este “poderá tornar-se o pior incêndio florestal da história moderna da Califórnia, com base no número de estruturas queimadas e nas perdas económicas”.
Não existe uma ligação certa entre os ventos de Santa Ana – rajadas de vento vindas de leste que descem as montanhas, ganham velocidade e atingem a costa – e as alterações climáticas causadas pelo homem, sustentou Daniel Swain, cientista climático do Instituto de Recursos Hídricos da Califórnia. No entanto, os ventos de Santa Ana estão a ocorrer cada vez mais tarde no ano, passando mais do outono mais seco para o inverno mais húmido, explicou Keeley. Normalmente, isso reduziria as ameaças de incêndio, mas esta não é uma altura normal.
Depois de dois invernos muito húmidos, em que os rios atmosféricos despejaram enormes quantidades de água na região, provocando o crescimento de muitas plantas, um rápido início de seca secou-as, fornecendo o isco perfeita. Segundo Swain, este fenómeno climático está a acontecer com mais frequência.
Uma análise de 423 incêndios florestais na Califórnia que atingiram pelo menos 39 quilómetros quadrados desde 1984 mostrou que apenas quatro deles arderam durante o inverno: cerca de dois terços dos incêndios de maiores dimensões deflagraram em junho, julho ou agosto.