As renováveis e o petróleo: Um tango a dois!

Por Luís Gil, Membro Conselheiro e Especialista em Energia da Ordem dos Engenheiros

Uma notícia de meados de novembro referia que o petróleo se encontrava em superabundância, com a oferta a exceder a procura, havendo países até com estratégias para inundar o mercado, mas sem produzir mais. Acresce a crescente produção de petróleo em certos países, alguns menos referenciados como produtores, como a Argentina. Ora esta situação tem conduzido à acumulação de stocks.

Acontece que alguns países dos maiores e mais tradicionais produtores de petróleo, como os do Médio Oriente, estão a reduzir a utilização do petróleo para gerar eletricidade, libertando assim mais petróleo – prevê-se 1,1 milhões de barris/dia – para o mercado de exportação. Estes países pretendem substituir o petróleo por outras fontes de energia, nomeadamente renováveis. Ou seja, as renováveis serão assim “amigas” do negócio do petróleo, promovendo a alteração da dinâmica do mercado petrolífero.

Paralelamente, parece existir também uma menor procura, sendo até anunciada uma queda de 15% num ano, devido à desaceleração da economia mundial e ao inferior desempenho económico de algumas grandes economias mundiais. A OPEP reduziu em dezembro e pelo quinto mês consecutivo as previsões de crescimento da procura mundial de petróleo em 2024 e 2025 tendo revisto em baixa as estimativas do volume de barris que o mundo precisará da organização, reduzindo nomeadamente a previsão de aumento anual do consumo do “ouro negro” em 210 e 90 mil barris por dia, respetivamente, neste ano e no próximo. E os cálculos desta organização baseiam-se numa visão otimista da evolução da economia mundial!

As tensões geopolíticas mais recentes, após um primeiro período de “embate”, parecem ter tido um impacto moderado no mercado. Além disso a OPEP parece querer reverter, num futuro próximo, alguns cortes que efetuou na produção. E apesar das preocupações crescentes com a segurança do abastecimento de petróleo, o mercado global parece estar adequadamente abastecido. Há quem fale até em frotas “fantasmas” de petroleiros cheios deste crude que estão a funcionar como armazenamento de reserva. No entanto, para aumentar a incerteza de tudo isto há também que ter consciência de que os países que representam metade da procura global de energia têm ou tiveram eleições neste ano…

Voltando à “dança” entre as renováveis e o petróleo, é também de citar uma notícia muito recente que informa que, na Noruega, grande produtor de petróleo, já circulam mais carros elétricos do que com motor de combustão a gasolina e prevê-se que estes ultrapassem os veículos a gasóleo em 2026. Diz-se até que a Noruega é o bastião do carro elétrico na Europa. E estes carros elétricos são carregados com eletricidade maioritariamente de origem renovável. Na Noruega, a maior parte da produção de eletricidade provém de fontes de energia renováveis, sendo a energia hidroelétrica a fonte da maior parte da geração de eletricidade no país.

A própria Agência Internacional de Energia (AIE) prevê que a procura mundial de petróleo atingirá o seu pico antes de 2030, e prevê também que os excedentes de petróleo e gás possam impulsionar o investimento em energia “verde”. Por vezes poderia pensar-se que o excesso de oferta que conduz ao abaixamento do custo do petróleo, poderia voltar a “puxar” o mercado para a sua procura, mas a perspetiva da AIE é diferente. Esta Agência prevê que preços mais baixos permitirão aos países dedicar mais recursos às energias “limpas”.

Na verdade, refere também a AIE que no ano passado foi atingido globalmente um nível recorde de energia renovável e que durante este ano sejam investidos 1,8 biliões de euros neste domínio, o que é o dobro do montante investido nos combustíveis fósseis. A previsão da queda futura da procura parece basear-se no aumento da mobilidade elétrica, embora haja outros “nichos” com efeito no mesmo sentido.

Como se vê, as renováveis e o petróleo acabam por estar relacionados numa dança conjunta, sincronizada que, com a entrada do player Argentina será, com certeza um tango!