Desde abusos sexuais a homicídios: juíza é condenada por deixar prescrever 89 processos

Uma procuradora de uma comarca da zona de Lisboa deixou prescrever 89 inquéritos, alguns dos quais sobre abuso sexual de menores ou tentativas de homicídio: em causa, de acordo com o ‘Jornal de Notícias’, estaria uma “estratégia” para os esconder por entre os 600 processos por concluir de uma inspeção a que foi sujeita, segundo o Supremo Tribunal de Justiça (STJ).

A procuradora foi condenada, no final de outubro último, a dois anos e dois meses de prisão, suspensa por três anos, por falsificação de documento praticado por funcionário, denegação de justiça e prevaricação: já havia sido condenada pelo Tribunal da Relação de Lisboa a uma pena de cinco anos de prisão, também suspensa, tendo recorrido para o STJ. Também os juízes conselheiros deu como provado que acumulou um elevado número de processos pendentes e que, em abril de 2014, “traçou estratégia de atuação” para ocultar os inquéritos e assim atingir uma classificação mais elevada de desempenho.

Assim, de acordo com o jornal diário, a procuradora escolheu 87 processos e em 39 minutos “decidiu proceder à sua assinatura eletrónica”, sem efetuar qualquer diligência – dessa forma, os processos passariam “a constar como despachados”. No mesmo dia, “deu ordem a funcionários para abrir conclusões” em mais 80 inquéritos, alguns dos quais esperavam há anos para serem despachados. Ainda “manuscreveu nas conclusões eletrónicas despachos com datas posteriores à conclusão”, apontou o acórdão. O ‘esquema’ resultou, tendo sido em 2015 classificada com “Bom com distinção”.

Os crimes só foram descobertos em 2018: uma nova inspeção sobre os quatro anos anteriores da magistrada conduziram à condenação em tribunal: os inquéritos abrangiam crimes de difamação, ameaça ou furto, mas também maus-tratos a menores, abuso sexual de crianças e tentativa de homicídio. Na altura, foi detetada, ainda, a existência de 336 processos no gabinete da procuradora com conclusão aberta, mas que nunca foram terminados.

De acordo com o STJ, “devido à sua inércia na tramitação processual, falta de zelo e de diligência”, a magistrada “deixou prescrever o procedimento criminal, total ou parcialmente, em, pelo menos, 89 inquéritos”. “E sabia nada ter feito para o evitar, mantendo os processos sem movimento durante largos períodos de tempo, mesmo durante anos”, concluiu.