Uma ‘NATO asiática’ para responder às tensões em Taiwan (e não só)? Os obstáculos apontados por especialistas
Apesar de discussões ocasionais, a possibilidade de uma NATO asiática é amplamente descartada por governos no Indo-Pacífico e por aliados ocidentais. A preferência regional recai sobre parcerias bilaterais ou multilaterais menos abrangentes, com um foco em estratégias adaptadas às dinâmicas locais. A crescente tensão com a China, entretanto, tem intensificado a cooperação entre aliados asiáticos e ocidentais, levantando questões sobre o futuro da segurança na região.
Gilberto Teodoro, secretário da Defesa das Filipinas, um dos principais aliados dos EUA na Ásia, rejeitou recentemente a ideia de uma aliança militar unificada no estilo da NATO. Durante um fórum de segurança, Teodoro destacou as divergências complexas de interesses entre os países asiáticos, afirmando que essas diferenças tornam inviável uma organização como a NATO na região.
A desunião é evidente. Muitos dos principais rivais de países asiáticos estão dentro da própria Ásia. Por exemplo, tensões históricas entre a Coreia do Sul e o Japão dificultam uma colaboração efetiva. Questões como a ocupação japonesa durante a Segunda Guerra Mundial e disputas territoriais sobre os Rochas Liancourt permanecem pontos de atrito. Além disso, disputas no Mar do Sul da China entre países como Indonésia, Vietname e Malásia, em relação à ocupação chinesa de ilhas disputadas, mostram como o conflito intra-regional persiste.
Ying-Yu Lin, especialista militar da Universidade Tamkang, em Taiwan, sublinha ao jornal Politico que esta fragmentação impede qualquer possibilidade de união sob um guarda-chuva defensivo comum. “Os países asiáticos preferem partilhar inteligência com os EUA do que entre si”, afirmou Lin.
A posição ocidental e o papel da China
A NATO e os seus aliados europeus também mostram relutância em expandir o seu âmbito para a Ásia. Diplomatas da UE, sob anonimato, afirmaram que não há planos para oferecer garantias de defesa mútua, semelhantes ao Artigo 5.º, a parceiros asiáticos. Esta abordagem evita comprometer recursos já escassos e reconhece a sensibilidade de países asiáticos em relação a alianças militares amplas.
Por outro lado, Pequim tem usado a ideia de uma NATO asiática como parte da sua narrativa contra o Ocidente, pintando a aliança como expansionista e belicista. Um diplomata europeu sediado em Bruxelas descreveu esta estratégia como uma “invenção chinesa” destinada a explorar sentimentos antiocidentais ainda presentes na região, muitos dos quais têm raízes no passado colonial.
Apesar das divisões regionais, a cooperação entre os aliados ocidentais e os parceiros asiáticos tem aumentado. Desde a invasão russa da Ucrânia, a NATO reforçou as interações com os chamados AP4 (Japão, Coreia do Sul, Austrália e Nova Zelândia). Em 2022, os países participaram pela primeira vez numa cimeira da NATO e, no mês passado, estiveram presentes numa reunião ministerial de defesa em Bruxelas.
O objetivo principal dessa colaboração é dissuadir Pequim de invadir Taiwan, evitar intimidações a outros aliados ocidentais na região e contrariar a parceria “sem limites” entre a China e a Rússia. Pequim é vista como um “facilitador decisivo” no conflito da Ucrânia, com aliados ocidentais acusando a China de manter a economia russa à tona e fornecer tecnologia militar.
Pequenos grupos e iniciativas bilaterais
Dada a resistência a grandes alianças, os EUA têm apostado na criação de pequenos blocos estratégicos, como o Quad (EUA, Japão, Austrália e Índia) e o Squad, que inclui as Filipinas mas exclui a Índia, esta última avessa a alianças militares formais. Ao mesmo tempo, Washington tem incentivado medidas de confiança entre Tóquio e Seul, apoiado investimentos japoneses na área da defesa e identificado novas bases para uso conjunto nas Filipinas.
Os países europeus também começaram a colaborar mais de perto com parceiros asiáticos. Um exemplo recente foi a assinatura de uma Parceria de Segurança e Defesa entre a UE e o Japão, que prevê cooperação naval e troca de informações sobre a indústria da defesa.
Além disso, a Coreia do Sul tem desempenhado um papel vital na guerra da Ucrânia, fornecendo munições à NATO, e partilhado informações cruciais, como o envio de milhares de soldados norte-coreanos para a Rússia, revelado pelo secretário-geral da NATO, Mark Rutte.
Mesmo com a retórica anti-China em ascensão, os laços comerciais com Pequim continuam a ser cruciais para muitos países asiáticos e europeus. Ying-Yu Lin destacou que “Japão e Coreia do Sul temem que a China possa atacar no futuro, mas não querem arriscar as suas parcerias económicas.”
O embaixador dos EUA no Japão, Rahm Emanuel, sugeriu recentemente um modelo de “NATO económica” para isolar Pequim, sublinhando a necessidade de integrar a diplomacia económica numa estratégia mais ampla de contenção.
Embora a criação de uma NATO asiática permaneça improvável, os esforços para fortalecer parcerias regionais e multilaterais continuam. Aumentar a cooperação militar e económica, enquanto mantém um equilíbrio delicado com Pequim, parece ser o caminho preferido pelos aliados ocidentais e asiáticos. Assim, mesmo sem uma aliança formal, a segurança no Indo-Pacífico está cada vez mais interligada à estabilidade euro-atlântica.