Ucrânia encontra forma de contrariar ataques massivos de drones da Rússia: solução é reencaminhá-los para a Bielorrússia

A Ucrânia encontrou uma nova forma de contraria a crescente utilização de drones Shahed, de fabrico iraniano, por Moscovo em ataques em massa: as autoridades militares ucranianas conseguem redirecioná-los de volta para a Rússia ou para o espaço aéreo da Bielorrússia, país amigo do Kremlin.

Na noite do passado domingo, as forças russas lançaram 110 drones Shahed, ou de engodo, com território ucraniano: 52 fora abatidos pelas forças de defesa aérea ucranianas, ao passo que 50 foram considerados “perdidos” – ou seja, não foram abatidos deliberadamente pela defesa aérea e não atingiram os objetivos pretendidos. Então, como ‘desapareceram’?

“Basicamente, o que a Ucrânia está a fazer é ‘spoofing’. O que significa que estão a fornecer falsos alvos GPS a estes drones Shahed – ou, em termos russos, Geran-2 – para os fazer desviar da rota”, explicou John Hardie, diretor-adjunto do Programa para a Rússia da Fundação para a Defesa das Democracias.

“Os drones têm um sistema que supostamente evita a interferência. Mas o que estão a fazer é entrar sorrateiramente e não deixar que o drone saiba que os alvos estão a ser alterados. Está a enganá-los para que vão na direção errada”, salientou Hardie, em declarações à ‘Euronews’.

Este ‘truque’ só é possível graças ao aperfeiçoamento das táticas de interferência da guerra eletrónica – de acordo com o ISW (Instituto para o Estudo da Guerra), o número de drones Shahed ou de engodo ‘perdidos’ devido à interferência da guerra eletrónica ucraniana aumentou significativamente entre outubro e novembro.

Durante o ataque russo de 2 de outubro, a Ucrânia abateu diretamente 78 drones e 23 foram dados como “perdidos”, o que representa 22% do total de 105 lançados pela Rússia durante o ataque noturno.

Dois meses depois, esta segunda-feira, 45% dos drones russos ‘desapareceram’ devido à interferência eletrónica ucraniana. Parte do desaparecimento deve-se a um sistema de defesa eletrónica que o exército ucraniano designa por ‘Pokrova’, que significa “véu de proteção”, mencionado pela primeira vez pelo antigo general Valerii Zaluzhny.

“Na tradição ortodoxa, ‘Pokrova’ refere-se a um acontecimento do século X, em que se diz que a Virgem Maria lançou o seu véu protetor sobre a cidade de Constantinopla. Por isso, podemos ver o simbolismo”, salientou Hardie. “Penso que o sistema foi provavelmente melhorado desde então, uma vez que a percentagem de drones russos que a Ucrânia afirma estar a falsificar aumentou ao longo do tempo.”

Mas este não é o único sistema que a Ucrânia está a utilizar, explicou Hardie. “Kiev também tem sistemas de sensores distribuídos que alimentam tablets que pertencem a estas equipas móveis anti-Shahed, muitas vezes camiões com metralhadoras montadas que são capazes de destruir estes drones Shahed de forma barata”, salientou.

Para além de os fazer aterrar ou “perder”, a Ucrânia também pode redirecionar os drones russos para a Rússia ou, em alguns casos, para a Bielorrússia, país amigo do Kremlin. De acordo com o grupo de monitorização independente bielorrusso ‘Hajun Project’, “os voos sistemáticos de veículos armados não-tripulados (UAV) para a Bielorrússia” começaram a 11 de julho último e, desde então, o número de drones russos redirecionados para o espaço aéreo da Bielorrússia tem aumentado todos os meses. “O aumento do número de voos de drones para a Bielorrússia é gradual”, afirmou.

“Por exemplo, estes são os dados mensais: julho – nove drones, agosto – 12 drones, setembro – 27 drones, outubro – 49 drones, novembro – 151 drones. 148 deles eram drones Shahed”.

Segundo o ‘Hajun Project’, no passado dia 25, 38 drones russos Shahed entraram no espaço aéreo bielorrusso nesse dia e no dia anterior – um número recorde.

A Bielorrússia enviou jatos para responder à violação do espaço aéreo, o que sugere que Minsk não estava preparada para receber drones russos errantes e que Moscovo não tinha previsto os impactos da interferência ucraniana nem os tinha comunicado à Bielorrússia com antecedência, segundo o ISW.

O grupo de monitorização salientou que a aviação de serviço da Força Aérea bielorrussa voa ocasionalmente, mas nem sempre, para o sudeste do país quando os drones estão a voar maciçamente para a Bielorrússia.

“A 3 de outubro, um dos drones despenhou-se em Kalinkavichy. Foi filmado por uma câmara de vigilância e o vídeo foi partilhado nas redes sociais. No dia seguinte, as forças da ordem de Alexander Lukashenko detiveram o proprietário da casa cuja câmara tinha captado a queda do drone”, salientou o ‘Hajun Project’.

Mas porque é que os drones russos estão a ser falsificados e redirecionados para a Bielorrússia e não para a Rússia, de onde foram lançados? “Quando se falsificam estes drones, faz-se isso gradualmente. Não se quer dizer que o alvo é diametralmente oposto àquele para onde está a ir. Desviamo-los gradualmente da rota”, explicou Hardie. “Penso que essa pode ser a razão pela qual estão a dirigir-se para a Bielorrússia em vez de voltarem para a Rússia.”

Falsificação de smartphones de civis

Nas últimas semanas, os utilizadores ucranianos das redes sociais publicaram capturas de ecrã da sua localização em aplicações de mapas que aparecem em território russo ou bielorrusso. Em resposta, o Estado-Maior das Forças Armadas da Ucrânia emitiu um aviso de que a guerra eletrónica utilizada para repelir os ataques aéreos russos pode perturbar os relógios dos smartphones e a geolocalização.

“É aconselhável desativar o modo de atualização automática da hora no telemóvel e ter em conta que a precisão dos sistemas de navegação por satélite pode ser perturbada durante o anúncio de alertas aéreos”, apontou, em comunicado.

Só em novembro, a Rússia lançou um total de 347 mísseis e mais de 2.500 drones de ataque do tipo Shahed contra a Ucrânia, denunciou o presidente Volodymyr Zelensky.

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